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1ºANO-Direito Internacional Público

NOÇÃO DE DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO E A SUA DIFERENÇA RELATIVAMENTE A OUTROS SISTEMAS NORMATIVOS.
1. Delimitação do conceito de Direito Internacional Público.
A Sociedade Internacional não segue um modelo homogéneo de organização: é assim que, enquanto na sua maior parte impera um tipo de relações de coordenação – ditadas pelo peso da soberania justa postas, em modernas sociedades de integração económica, como a União Europeia, prevalecem as relações de subordinação.
Não existe, quanto à origem, qualquer comparação possível entre as vulgares normas que constituem o Direito Internacional de coordenação e aquelas normas de Direito Privado, de Direito Processual, de Direito Penal e de Direito Administrativo referentes à actividade dos funcionários das Organizações Internacionais. Enquanto as primeiras têm uma origem interestadual, estas últimas, que constituem aquilo a que se convencionou chamar Direito Interno das Organizações Internacionais, tem uma origem centralizada num órgão de uma Organização Internacional e a sua estrutura e garantia é sobremaneira semelhante à das normas de Direito Interno de qualquer Estado aplicáveis.
A definição de Direito Internacional Público não é fácil de fazer a partir dos respectivos sujeitos. O recurso a este critério apresenta dificuldades de monta:
A primeira consiste na enumeração de tais sujeitos, que varia consideravelmente entre os autores de Leste e Ocidentais, verificando-se assinaláveis divergências entre estes últimos.
Depois, nem todas as actividades desenvolvidas por tais sujeitos subordinadas ao Direito Internacional Público, mas apenas as que aqueles levam acabo enquanto tais, ou seja, na qualidade de sujeitos de tal ramo da ordem jurídica.
O Direito das Gentes regula as relações entre Estados, entre Organizações Internacionais, ou entre Estados e Organizações Internacionais. Mas não será correcto afirmar que regula as relações entre Estados e Indivíduos nem as relações entre Indivíduos: umas e outras são subordinadas a um qualquer Direito Interno e não ao direito ora em apreço.
2. Tipos de Direito Internacional Público
É usual, na Doutrina e na Jurisprudência, falar-se de Direito Internacional Geral ou Comum e de Direito Internacional Particular.
O primeiro, formado pelo Costume geral, pelos Princípios de Direito Reconhecidos pelas Nações civilizadas e pelas Convenções universais, é de aplicação universal. O segundo é de aplicação restrita a um certo número de sujeitos de Direito Internacional Público e formam-no o Costume regional e local e a grande maioria dos Tratados e Acordos Internacionais.
3. Distinção entre Direito Internacional Público e Direito Internacional Privado
Há alguns pontos de contacto entre ambos. Primeiro, há um grande número de Convenções de Haia e de Genebra sobre direito de conflitos. Depois, há certos princípios ou normas de Direito Internacional Geral em matéria de Direito Internacional Privado, como acontece com a lei reguladora da forma dos actos com a lei aplicável aos crimes e delitos, com a lei aplicável ao regime jurídico dos imóveis e ainda quanto à lei definidora do estatuto das pessoas. Verifica-se, além do exposto, uma semelhança notável entre as regras de conflitos e o direito consular sobre matérias de Direito Privado.
O chamado Direito Internacional Privado ou Direito de Conflitos não passa de Direito Interno. Só é “internacional” pela simples razão de regular actos ou factos do comércio jurídico internacional. De resto, é construído por um conjunto de regras ditadas por cada Estado para que, quando surja uma relação conectada com duas ou mais ordens jurídicas, se possa escolher a lei material de uma delas que indique a solução mais apropriada ao problema suscitado.
NATUREZA E FUNDAMENTO DA OBRIGATORIEDADE DO DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO
4. A tese Anarquista
Anarquistas e Voluntaristas negam a existência do Direito Internacional Público.
Os primeiros fazem-no frontalmente. Dos acordos, actos livremente revogáveis pelo Estado mais forte, não pode nascer Direito. Falar em segurança colectiva é insistir numa utopia.
Embora frequentemente o panorama internacional se possa pintar com cores tão negras, há um aspecto essencial à questão que urge pôr em relevo: quando surge um litígio internacional, logo se tentam utilizar métodos e fórmulas jurídicas na sua resolução, citam-se precedentes judiciais, procura-se saber qual o sentido do Costume ou do Tratado aplicável ao caso, que se trata como jurídico, como relevante para uma certa ordem jurídica e que é exactamente a ordem jurídica internacional. Quer dizer, o exagero dos Anarquistas está em ligarem demasiado às violações espectaculares do Direito Internacional e não ao cumprimento de que muitíssimas vezes é objecto de uma forma espontânea. É certo que há violações constantes do Direito Internacional. Mas então a metodologia Anarquista peca pelo alvo que escolhe para sua crítica: o problema em causa é mais de imperfeição de grau, do que de inexistência.
Corrigidas as proporções da Tese Anarquista, há todavia conceder o que se segue.
Por um lado, os Estados só se submetem à jurisdição dum Tribunal Arbitral Internacional ou do Tribunal Internacional de Justiça se quiserem.
Em segundo lugar, e embora o nascimento de normas jurídicas internacionais não constitua um problema real, dado o seu contínuo surgimento sobre tudo por meio de Tratados Bi e Multilaterais e para não falar em competência “legislativa” das organizações de carácter supranacional, é óbvio que a inexistência de órgãos internacionalmente instituídos para a execução forçada de sanções leva cada Estado a munir-se individualmente de medidas de auto protecção que, para fazermos nossas as palavras de Truyul Y Serra, pecam por “dois grandes defeitos: por um lado, há frequentes desproporções entre o direito tutelado e a força que há-de aplicar-se para a sua satisfação; por outro lado, o êxito depende, em última análise, da distribuição de forças entre os respectivos Estados ou outros sujeitos internacionais, pelo que, de facto, a coacção será dificilmente operante contra grandes potências”.
5. As doutrinas Voluntaristas
Também a Doutrina Voluntarista, em qualquer das suas variantes, acaba por negar o Direito Internacional Público. Mas fá-lo duma forma sub-reptícia. Afirmando o Estado como entidade soberana e omnipotente, conclui muito logicamente que a obrigação internacional só pode derivar da sua própria vontade. Ou seja, a vinculação depende da vontade obrigada. Melhor dizendo, não existe obrigação.
a) As doutrinas de Autolimitação e do Direito Estadual Externo:
O Estado, como poder independente e supremo, situa-se acima de todo e qualquer princípio ou norma jurídica. De forma que qualquer obrigação que surja só pode basear-se no seu consentimento, quer dizer, só pode ser uma auto-obrigação, já que nenhum órgão internacional nem nenhum outro Estado podem ditar leis que se imponham a um outro ente supremo que para tal não manifestou o seu consentimento;
b) A doutrina do Tratado-lei ou da Vontade Colectiva (“Vereinbarung”):
Quando se juntam duas ou mais vontades num acordo, pode ser para satisfazerem interesses antagónicos ou para prosseguirem finalidades comuns. Quando os Estados querem prosseguir um interesse comum, manifestam um único feixe de vontades no mesmo sentido, originando obrigações idênticas para todos, assim surge Verinbarung, acordo colectivo ou Tratado-lei. Nesta figura não se distinguem partes mas antes legisladores.
c) A teoria Marxista-leninista:
Para esta teoria, cada Estado é caracterizado por uma formação social, de cuja super estrutura também faz parte o Direito Internacional, condicionado e determinado pela infra-estrutura económica e influenciando ainda pelo Direito Constitucional, pela moral, pela filosofia, etc. O Direito Internacional não surge, portanto, dum vogo comunitarismo, mas é antes o resultado de um complexo processo em que actuam sistemas sociais opostos. De forma que, se são diferentes as vontades dos Estados, por representarem interesses de classes diferentes, o Direito Internacional deixa de ser um Direito Universal. Começa então a distinguir-se o Direito Internacional do Sistema Capitalista e o Direito Internacional do Sistema Socialista.
Foi sobretudo a partir de 1958 que Tunkin, começou a desenvolver a ideia e os princípios do Direito Internacional Socialista. Os Estados Sociais estão ligados por relações diferentes das que os ligam os Estado Capitalistas. A base económica dessas relações é a propriedade social dos meios de produção; o regime político é dirigido pela classe trabalhadora; a ideologia é o Marxismo-leninismo; e o interesse da defesa das conquistas revolucionárias contra os ataques do Capitalismo é o comum dos indivíduos de todos os Estados Socialistas: o internacionalismo proletário torna-se o princípio fundamental do Direito Internacional Socialista.
A teoria Marxista-leninista, leva a uma contradição no campo dos princípios e a outras consequências práticas que apenas podem ser justificadas pela legitimação do uso da força.
6. A teoria Objectivista de Kelsen
Conclui-se pois, que a obrigatoriedade do Direito Internacional provém doutra fonte que não a vontade dos Estados. A vontade só produz efeitos jurídicos na medida em que uma norma anterior e superior a essa vontade determina qual o seu relevo jurídico.
Para o internacionalista Vienense, a validade de uma norma não depende da vontade que a cria mas antes da norma que lhe é imediatamente superior. Num sistema jurídico, as normas escalonar-se-iam de tal forma que cada uma encontraria o seu fundamento naquela de que procede e, no vértice da pirâmide, encontrar-se-ia a “Grundnorm”, a norma fundamental, de carácter hipotético, na qual o sistema encontraria a sua unidade.

7. O Neojusnatoralismo
Fundamenta o Direito Internacional naquele conjunto de “normas que resultam da natureza racional e social do homem”, isto é, naqueles princípios objectivos que se sobrepõem à vontade humana e que são inerentes à comunidade político-social a que se destinam.
8. Posição Adoptada
O fundamento do Direito Internacional Público não é diferente do Direito em geral.
Portanto, a diferença entre o Direito Internacional e o Direito Interno pode ser uma diferença de grau mas nunca de natureza. É que, tal como para regular as relações entre indivíduos no quadro estadual há normas de determinado conteúdo que se impõem naturalmente, também as exigências da consciência pública impõem regras adequadas, em cada época, à cooperação, ao progresso e ao desenvolvimento dos povos.
Não há normas ou princípios necessários, a não ser os princípios constitucionais da comunidade internacional, mas há um certo conteúdo que é necessário em todas as normas e princípios. E só esse conteúdo de justiça evitará que tais normas e tais princípios pequem pela sua transitoriedade e sobretudo que sejam alvo de uma contestação prematura.
RELAÇÕES ENTRE O DIREITO INTERNACIONAL E O DIREITO INTERNO: O PROBLEMA NA CONSTITUIÇÃO DE 1976
9. Enunciado da questão
Ora, do conceito de soberania não se pode extrair um tipo de soberania absoluta. Esta só é absoluta na medida em que afirma que todos os Estados são iguais “enquanto sujeitos de direito e legisladores em Direito Internacional”.
A soberania levanta ainda um problema importante: uma vez estabelecidas as regras jurídicas na comunidade internacional, impõe-se automaticamente aos órgãos estaduais ou devem, pelo contrário, sofrer qualquer transformação antes de se revelarem na ordem jurídica interna?
10. Terá relevo prático o momento “especulativo”?
Perante a concepção do Direito Internacional como um direito coordenador e a do Direito Interno como uma expressão da soberania interna do Estado, qualquer solução aparece, de princípio, como defensável. E a verdade é que percorremos a literatura internacionalista, vemos as várias teses serem defendidas sucessivamente com o mesmo ardor pelos diversos doutrinadores, sendo sobremaneira importante deixarmos aqui expressa a ideia de que os mais recentes pensadores de Direito Interno e o Direito Internacional se sentem incapazes de optar, duma forma absoluta, por uma ou outra, acabando por se declarar Monistas ou Dualistas moderados.
O abandono do conceito de soberania absoluta, foi posta de lado a ideia da irresponsabilidade do Estado, com a consequência de relevo que é a de obrigar o legislador ordinário a harmonizar a legislação interna com as normas de Direito Internacional, de tal modo que, sempre que o Direito Estadual se lhes opõe, a constituição em responsabilidade internacional terá como resultado a anulação das normas emanadas do legislador interno.
O problema da relação Direito Interno – Direito Internacional é tido como puramente especulativo e teórico, não se afigurando, portanto, legítimo inferir conclusões práticas duma pura tentativa de explicação mental da realidade. A posição relativa de todas as normas de Direito Internacional e de Direito Interno só pode ser determinada pelo poder constituinte.
11. Tese Dualista
O Direito Internacional só vale na esfera estadual depois de recebido ou transformado em Direito Interno, não havendo possibilidade de conflitos entre sistemas, dado que o Direito Internacional e o Direito Interno não regem o mesmo tipo de relações
Esta doutrina tem sido atacada de várias formas.
Por um lado, apresenta uma fundamentação insuficiente e errada para o Direito Internacional Público, esquecendo que a doutrina da Vereinbarung, como Voluntarista que é, acaba por negar a natureza real daquele direito, não conseguindo explicar, mesmo que tal não acontecesse, a validade do Costume Internacional. Depois, além de ignorar a personalidade jurídica internacional das Organizações Internacionais, apresenta apenas o indivíduo “fundamentalmente mediatizado”.
Todo o Direito Internacional necessita de recepção ou de transformação para revelar na ordem interna, dado que o juiz só aplicaria directamente o Direito Interno, embora se pudesse servir do Direito Internacional para obter a disciplina jurídica de uma questão prévia ou de uma questão incidental, desde que as premissas, de facto ou de direito, de uma norma jurídica interna não se estabelecessem senão através do recurso às normas de Direito Internacional.
A Doutrina Dualista é categórica em afirmar a inexistência de conflitos entre os dois sistemas, pois que o objecto das normas de um e de outro seriam coincidentes.
12. Tese do Monismo do Direito Interno
Tendo as suas raízes especialmente na concepção Hegliana do Estado, surge outra tese das relações Direito Internacional – Direito Interno, que dá nome ao Monismo de Direito Interno, ou de Monismo com um primado na ordem jurídica interna.
Ela sustenta não a existência de duas ordens jurídicas diferentes mas apenas de uma, que é justamente a ordem jurídica estadual. De forma que o chamado Direito Internacional Público não passaria de um “direito estadual externo”, quer dizer, uma obrigação surgida na livre vinculação do Estado (tese moderada), ou reduzir-se-ia até a uma declaração de intenções sobre o comportamento futuro, não resultando qualquer tipo de responsabilidade para o Estado que, fosse qual fosse o motivo, acabasse por fazer letra morta do prometido (tese radical).
A ideia geral é, pois, a de que “o Direito Internacional obriga, porque provém da própria vontade do Estado, vincula porque é, todo ele, Direito Interno”.
13. Tese do Monismo de Direito Internacional
A ordem jurídica é homogénea e não são as normas internas que se situam num plano superior, mas são antes as normas internacionais, que, estendendo a sua eficácia directamente ao interior dos Estados, não podem ser contrariadas pelas primeiras, sob pena de nulidade das mesmas. Desenvolvendo este ponto de vista, os Monistas de Direito Internacional chegam a conclusões como esta: o poder dos órgãos estaduais é-lhes delegado pela comunidade internacional, sendo o Estado um ente não soberano, dado a soberania residir, em última análise, naquela comunidade, que seria a “detentora da competência das comunidades”.



14. Teses Conciliatórias
A ordem jurídica interna é independente da ordem jurídica internacional,
estando, todavia, ambas coordenadas pelo Direito Natural – trata-se
portanto, de uma coordenação hierárquica, sob uma ordem jurídica comum.
15. Posição adoptada
A “comunidade internacional é mais do que uma sociedade de justaposição, mas bem menos do que uma sociedade de integração” o direito segundo o qual os Estados se regem terá necessariamente de reflectir as características de indefinição dessa dita sociedade, o mesmo será dizer, dessa sociedade em evolução.
São em regra os Estados que descentralizadamente, através de manifestações de vontade ou através de certos tipos de comportamento, criam a ordem jurídica internacional. Isto, claro, para além daquelas normas que a própria natureza da sociedade internacional lhes impõe.
Há matérias que são autêntica reserva de Direito Internacional, enquanto outras só o não o são se a própria ordem jurídica internacional delegar a competência nas ordens jurídicas internas e, finalmente, a maior parte das matérias são de competência concorrente entre o legislador interno e o legislador internacional.
Estão no primeiro caso as norma sobre vícios do consentimento, os princípios sobre a aquisição e perda de Território estadual, os princípios sobre a interpretação dos Tratados, as normas sobre as condições necessárias para a criação do Costume e para a conclusão de Tratados, o princípio pacta sunt servanda.
Nenhuma ordem jurídica interna está apta a modificar unilateralmente estes princípios constitucionais do Direito Internacional; se o fizer, ao acto ou norma em questão não poderá ser reconhecido qualquer efeito jurídico. O art. 27º da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados estipula que “nenhuma parte contratante poderá invocar as disposições do seu Direito Interno para justificar a não execução de um Tratado”.
Portanto, logo que um Estado se compromete de maneira contrária a estes princípios mínimos de convivência internacional, incorrerá nos termos gerais do Direito das Gentes, em responsabilidade internacional.
A profusão nas modernas Constituições de cláusulas de inserção do Direito Internacional nas respectivas ordens jurídicas internas e de fixação da hierarquia das normas jurídicas prova-nos que não existe nenhuma regra ou princípio de Direito Internacional que impeça o legislador constituinte de atribuir na ordem jurídica interna o valor que entender aos compromissos internacionais que os órgãos estaduais assumirem, por meio de Convenções.
Ao assumir um compromisso internacional, o sujeito de Direito Internacional obriga-se a actuar, na ordem jurídica interna, de acordo com tal compromisso. Se, por imperativos constitucionais, não pode cumprir as suas obrigações internacionais, está a violar o já enunciado princípio pacta sunt servanda. Ou seja, um Estado deve cumprir pronta e integralmente as suas obrigações. Se as não cumprir, não as deve assumir, sob pena de ser internacionalmente responsável pela desconformidade dos seus actos ou omissões com o Direito das Gentes.



16. Técnicas de incorporação
A denominação da Cláusula de Incorporação varia conforme as exigências técnico-constitucionais para a relevância do Direito Internacional na ordem jurídica interna.
Estamos perante uma cláusula de recepção plena, quando o Direito Internacional adquire relevância, no espaço jurídico interno, independentemente do seu conteúdo, por meio de uma norma que habitualmente não exige uma outra formalidade que não seja a publicação.
Encontramos uma cláusula de recepção semi-plena, quando a Constituição, consagrando um sistema misto, permite que as normas com dado conteúdo revelem no espaço jurídico interno sem outra formalidade que não seja a publicação, exigindo para a relevância das restantes técnicas: a transformação.
Há transformação, se a Constituição exige que o legislador ordinário reproduza, um acto da sua competência, a norma surgida no espaço internacional. A transformação pode ser explícita ou implícita, conforme se exija um acto normativo expresso pelo legislador ordinário ou se assente em que o processo de formação da norma internacional se incluem actos de carácter internacional se incluem actos de carácter legislativo ou parcialmente legislativo de órgãos competentes para tornarem relevante na ordem jurídica interna a norma internacional.
Por vezes, as normas de Direito Internacional são directamente aplicáveis na ordem jurídica interna dos Estados, ou seja, impõem-se sem que os órgãos estaduais tenham sequer que proceder à sua publicação. Neste caso, parece ser correcto falar-se de cláusula de incorporação automática.
17. Razões da escolha das várias técnicas de incorporação
Quanto ao Direito Internacional Geral, não é necessário qualquer acto de recepção ou de transformação para que o juiz interno o aplique.
Quantos aos Tratados, é usual dizer-se que o “juiz só conhece o Direito Interno”. Quer-se, com isto, significar que é sempre necessário um acto de recepção ou de transformação para que as normas convencionais se imponham aos tribunais.
18. Hierarquia fixada pelas constituições
A posição relativa das várias Fontes de Direito é, fixada, sempre que o Direito Internacional o permite, pela Constituição de cada Estado, a qual deve, portanto, ser objecto de uma interpretação cuidada, dado o relevo prático que este aspecto assume.
Podem encontrar-se vários sistemas:
- Sistemas que consagram a igualdade entre Lei Ordinária e o Direito Internacional;
- Sistemas em que o Direito Internacional prevalece sobre a Lei Ordinária;
- Sistemas que consagram a superioridade do Direito Internacional à própria Constituição.






PRINCÍPIOS DE DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO
18. Princípio da harmonia jurídica internacional
Através da aplicação deste princípio pretende-se que o sistema jurídico aplicável ao “caso”seja o mesmo para todos os Estados conexionados com a situação da vida a regular [9].
O pilar fundamental deste princípio é a necessidade de uniformizar, por via da valoração o direito em referência.
Podendo as leis interessadas no caso ser duas ou mais, impõe-se a tarefa de coordenar de modo a evitar que o mesmo aspecto ou efeito da relação jurídica em causa venha a ser apreciados segundo a óptica de legislações diferentes.
19. Princípio da harmonia jurídica interna
Por via deste princípio pretende-se evitar as contradições normativas, isto é, pretende-se adoptar uma única lei para regular os vários aspectos da situação da vida ou situações de facto [10], exs.: arts. 41º, 56, 57º CC.
Este princípio cria uma situação de confiança entre os particulares. O legislador ou aplicador do direito vai evitar contradições normativas.
20. Direito Internacional Privado e jurisprudência de interesses
Dentro deste princípio é necessário fazer uma divisão:
a) Interesses individuais: os sujeitos têm interesse em que lhes sejam aplicados os preceitos da ordem jurídica que possam considerar como sua (art. 41º/1 CC);
b) Interesses gerais do tráfego jurídico: traduz a necessidade de tutela e da segurança das relações jurídicas, há por aplicação deste princípio a tendência para escolha de factores de conexão permanentes [11].
21. Princípio da efectividade ou da maior produtividade
Princípio pelo qual aplica-se a lei como melhor competência ou de maior proximidade; tende-se a aplicar aquela lei que se ache mais próximo da questão (ex.: arts. 45º, 46º/1 CC).
22. Princípio da boa administração da justiça
Por via deste princípio leva-se à maximização da aplicação da lei material do foro (ex. art. 22º CC).
Haverá boa administração da justiça pelo juiz nacional quando por via do alargamento das normas de conflito o juiz terá de criar uma uniformização. Elas são bilaterais, os elementos de conexão remetem, quer para o ordenamento jurídico estrangeiro quer para a lei interna e são normas bivalentes porque tentam abranger todos os ordenamentos jurídicos.
23. Princípio da ordem pública internacional
Diz que da aplicação do ordenamento jurídico estrangeiro, resulta de uma ofensa aos princípios fundamentais do Estado português aplicar-se-á, numa primeira abordagem, o direito desse ordenamento e, em último caso o direito material interno português.
A ordem pública internacional do Estado português não afasta inteiramente o direito estrangeiro considerando competente, mas somente o que é ofensivo dessa ordem pública (art. 2º/2 CC).
O que interessa, para saber se houve ou não violação da ordem pública internacional, não são os princípios consagrados na lei estrangeira que servem de base à decisão, mas o resultado da aplicação da lei estrangeira ao caso concreto.
Os princípios fundamentais da ordem pública interna do Estado português são os princípios imperativos que formulam o quadro jurídico, que são os princípios constitucionais e os princípios fundamentais.
24. Princípio dos direitos adquiridos
Uma vez adquirido (o direito), adquirido está, este princípio assenta toda a sua estrutura no direito romano (ex.: arts. 29º e 63º CC), uma vez capaz sempre capaz. Aceita-se estas situações por segurança jurídica e estabilidade.
25. Princípio da autonomia da vontade
Aquele que faculta às partes a escolha da lei aplicável, só é possível nos negócios obrigacionais (ex. art. 41º e 19º/2 CC).
Só se aceita o princípio da autonomia da vontade nos negócios obrigacionais, mas mesmo nestes, há restrições.
Não temos uma expressão normativa tão ampla que abrange todas as situações, por isso, quando não existe solução vai-se aos princípio do Direito Internacional Privado, que são princípio formais porque vão ajudar a solucionar essas questões.
26. Princípio do “favor negotti” ou princípio da justiça material
Quando determinado negócio jurídico resulte por aplicação da respectiva lei material, a sua invalidade, tendo em conta o princípio do “favor negotti” há que lhe atribuir a respectiva validade porque há que tentar salvar o negócio [12] ex. art. 19º CC.
Implica que o juiz nacional tenderá a salvar o negócio para que não sejam frustradas as expectativas das partes.
A QUALIFICAÇÃO DAS NORMAS DE INCORPORAÇÃO.
19. A Cláusula de Incorporação Automática do art. 8º/1 CRP
O art. 8º/1 da Constituição (“As normas e os princípios de Direito Internacional Geral ou Comum fazem parte integrante do Direito português”) consagra uma cláusula de incorporação automática do Direito Internacional Geral ou Comum.
Quer dizer, o legislador constituinte considerou que tanto as normas e princípios de Costume geral como os Princípios de Direito Reconhecidos pelas Nações civilizadas são directamente aplicáveis na ordem jurídica portuguesa. E tal aplicação será ainda imediata se tais normas e princípios tiverem carácter self-executing; caso contrário, os indivíduos só se poderão prevalecer dos mesmos depois de o legislador ordinário ter tomado as medidas legislativas necessárias para os tornarem exequíveis.
O legislador constituinte tomou em consideração, no art. 8º da Constituição, três tipos ou três grandes categorias de Direito Internacional Público: o Direito Internacional Geral ou Comum (art. 8º/1 CRP), o Direito Internacional Particular (art. 8º/2 CRP) e um direito especial, que é o Direito Derivado (art. 8º/3 CRP).
20. A Cláusula de Incorporação Plena do art. 8º/2 CRP
Da conjugação do art. 169º/2 CRP (requerida a apreciação de um decreto-lei elaborado no uso de autorização legislativa, e no caso de serem apresentadas propostas de alteração, a Assembleia poderá suspender, no todo ou em parte, a vigência) e do art. 161º-i CRP, ressalva que a aprovação dos Tratados que versassem matéria da competência exclusiva da Assembleia da República, dos Tratados de participação de Portugal em Organizações Internacionais, dos Tratados de amizade, de paz, de defesa e de rectificação de fronteiras e ainda quaisquer outros que o Governo entendesse submeter-lhe era feita por meio de lei. Por outro lado, depreendia-se do art. 169º/5 CRP (se, requerida a apreciação, a Assembleia não se tiver sobre ela pronunciado ou, havendo deliberado introduzir emendas, não tiver votado a respectiva lei até ao termo da sessão legislativa em curso, desde que decorridas quinze reuniões plenárias, considerar-se-á caduco o processo) que a aprovação dos Tratados Internacionais seria feita sob a forma de resolução. Esta resolução teria de ser promulgada.
As rectificações, só ultimamente começaram a ser publicadas em Diário da República, sob a forma de avisos, não se compreendendo que não seja publicado sob a mesma forma o momento de entrada em vigor da Convenção na ordem internacional, quando é certo que, a Convenção só revela na ordem interna portuguesa após o decurso do período da vacatio legis, o qual deve ser contado, não a partir da data de publicação do instrumento de aprovação, mas sim a partir do momento da entrada em vigor da Convenção no espaço internacional.
O processo de transformação é característico dos sistemas jurídicos que, consagrando a divisão estrita de poderes, não permitem ao poder executivo a edição, sob a forma de Tratados, de regras que, materialmente, constituem verdadeiras leis. Ora, tal não sucede entre nós, onde o art. 198º da CRP (art. 197º/1-b), c)/2 CRP), atribui uma extensíssima competência legislativa ao Governo. Quando muito, tal sistema justificar-se-ia quanto a uma categoria de Tratados então enunciados no art. 161º-i CRP: os Tratados que versavam matéria da exclusiva competência legislativa da Assembleia da República.
O sistema jurídico português consagrava uma Cláusula de Recepção Plena. Quer dizer, o título que legitimava a relevância do Direito Internacional Convencional no espaço interno português era a cláusula do n.º 2 do art. 8º da Constituição, e não o acto de aprovação da Convenção, revestisse ele a forma que revestisse.
Definido, como uma cláusula de recepção plena, o art. 8º/2 CRP, atribui relevância na ordem interna portuguesa, após a sua publicação oficial e enquanto vincularem internacionalmente o Estado português, às normas constantes de Convenções Internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas.
Quer dizer: as normas constantes de Convenções Internacionais válidas e em vigor internacionalmente e que obedeçam ao requisito constitucional da publicação oficial constituem fonte imediata de Direito Interno português: se se trata de Convenções self-executing, são directamente aplicáveis pelo juiz português; se o juiz depara com normas non self-executing, só as aplicará após a competente “regulamentação”.
Mas, note-se bem, a norma de Direito Internacional convencional nunca entrará em vigor na ordem interna antes de entrar em vigor na ordem internacional.
O período da vacatio legis deverá ser contado, não a partir da data da publicação do acto de aprovação ou ratificação da Convenção Internacional. Mas a partir da data da sua entrada em vigor na ordem internacional.
Para surgir a responsabilidade internacional do Estado, têm de existir normas internacionais susceptíveis de violação, quer por acção, quer por omissão. Ora, se o direito ainda não entrou em vigor, não é internacionalmente obrigatório.
Segundo o Direito Constitucional português, a publicação oficial do instrumento de aprovação ou ratificação não obsta a que a Convenção Internacional só revele na ordem jurídica portuguesa após ter entrado em vigor na ordem internacional.
21. A cláusula de incorporação automática do art. 8º/3 CRP
“As normas emanadas dos órgãos competentes das Organizações Internacionais de que Portugal seja parte vigoram directamente na ordem interna, desde que tal se encontre expressamente estabelecido nos respectivos Tratados constitutivos”.
Assim se obstou à prática de futuras inconstitucionalidades, já que, autorizando determinado resultado – a aplicabilidade directa de determinadas normas na ordem jurídica portuguesa – implicitamente se tem como adquirido que a Constituição autoriza a delegação de competências a tal necessária.
Como será fácil verificar, esta norma constitucional reproduz uma cláusula de incorporação automática.
A esta possibilidade de relevância não mediatizada pelo Estado dá-se, portanto, o nome de aplicabilidade directa.
De acordo com a Constituição, de momento, só os regulamentos comunitários estarão aptos a ser directamente aplicáveis em Portugal. Com efeito, estipulando aquela que só vigoram directamente na ordem jurídica interna as normas emanadas de organizações de que Portugal faça parte e cujo Tratado constitutivo tal expressamente estabeleça, decorre do texto do art. 189º do Tratado de Roma, de 25 de Março de 1957, que instituiu a CEE, que só os regulamentos é expressamente reconhecido aplicabilidade directa.
O regulamento tem carácter geral. É obrigatório em todos os seu elementos e directamente aplicável em todos os Estados membros.
A directiva vincula o Estado membro destinatário quanto ao resultado a alcançar, deixando no entanto, às instâncias nacionais a competência quanto à forma e quanto aos meios.
A decisão é obrigatória em todos os seus elementos para os destinatários que ela designar.
O art. 189º do Tratado de Roma atribui expressamente aplicabilidade directa aos regulamentos comunitários, parece que, em rigor, a Constituição não deve obstar a que o interesse comunitário essencial seja posto em causa só por causa da mera questão de forma que o acto comunitário reveste.
Os regulamentos entram em vigor na ordem jurídica comunitária na data neles fixada ou, nada dizendo sobre o assunto, no vigésimo dia posterior ao da publicação, e se as directivas e as decisões entraram em vigor a partir do momento em que são notificados os interessados, tal significa que nenhum destes actos pode ser publicado no jornal oficial de qualquer Estado membro da comunidade.
A HIERARQUIA ENTRE AS FONTES DE DIREITO
22. O Direito Internacional Geral ou Comum, a Lei ordinária e a Constituição
Em relação ao Direito Internacional Geral, não temos a menor dúvida em atribuir-lhe carácter supra-legal. Mesmo quando se defende que o Costume geral possui uma posição hierárquica coincidente com a da lei ordinária (por exemplo na Inglaterra), sempre se tem prescrito que esta lei deve ser interpretada no sentido de ser harmonizada com o Direito Internacional comum, dado se presumir ter sido intenção do legislador não o violar.
A Constituição seguiu, a melhor solução. Ao dizer que “as normas e os princípios de Direito Internacional Geral ou Comum fazem parte integrante do Direito português” (art. 8º/1 CRP), não terá querido o legislador constituinte afirmar que eles “se transformam” ou “entram” na ordem jurídica interna portuguesa, porque, conservam o seu carácter de normas internacionais. A sua intenção terá sido portanto, a de significar, com as palavras fazem parte integrante, a prevalência do Direito Internacional comum sobre o Direito português infra-constitucional.
O Direito Internacional Geral ou Comum faz parte integrante da ordem jurídica portuguesa, enquanto existir na ordem jurídica internacional como tal; e não pode, deste modo, deixar de fazer parte integrante do Direito português prevalecendo assim, sobre as normas ordinárias, enquanto o Estado português a ele estiver vinculado.
Há normas e princípios internacionais aplicáveis às relações entre os Estados que, por terem recebido ao longo dos tempos um consenso universal, se transformaram em direito que constitui património comum da uma unidade e se impõe, como tal, a todos os Estados
23. O Direito Internacional Convencional, a Lei ordinária e a Constituição
Não se pode argumentar a favor da superioridade das Convenções Internacionais invocando o argumento da dignidade e da solenidade dos compromissos por esse meio assumidos. A Constituição de muitos Estados fixa a paridade hierárquica entre lei e Tratado ou Acordo Internacional e nem, por isso esses Estados se vinculam com menos dignidade nem com menos solenidade do que outros cuja a Constituição atribui valor supra-legal às normas internacionais.
Também não parece que possa argumentar-se contra tal superioridade, afirmando que a soberania do Estado ficaria restringida ou limitada em termos constitucionalmente inaceitáveis. De facto, o direito de concluir Tratados constitui justamente um dos elementos característicos dos Estados soberanos e também não consta que os Estados que atribuem primazia ao Direito Internacional convencional sobre as suas leis internas se sintam ou sejam considerados menos soberanos do que os restantes.
Concluímos, portanto, que a solução a seguir há-de ser obtida a partir das disposições normativas do nosso texto constitucional.
Portanto, as normas convencionais só vigorarão internamente desde que vigorem internacionalmente e também podem deixar de vigorar internamente enquanto vigoram internacionalmente.
A vigência internacional é, assim, condição de vigência na ordem interna num duplo sentido. Ora, uma norma convencional só pode deixar de vigorar internacionalmente nos termos do Direito Internacional, ou seja, nos termos previstos pela própria Convenção ou nos termos gerais.
Se as Convenções Internacionais podem ser declaradas inconstitucionais, é porque as suas normas têm de se conformar à Constituição, sendo-lhes esta logicamente superior.
24. O Direito Comunitário Derivado, a Lei ordinária, a Constituição e as Convenções Internacionais
O Direito Comunitário tem primado sobre o Direito Interno e esta qualidade é-lhe reconhecida por todas as jurisdições dos Estados membros da Comunidade Europeia.
Embora não possa ser apreciada previamente a constitucionalidade das normas comunitárias, já que estas são incorporadas na ordem jurídica portuguesa sem qualquer intervenção dos órgãos estaduais, os Tribunais Ordinários e o Tribunal Constitucional não podem, nos termos dos arts. 204º, 277º, 280º e 281º da Constituição, deixar de apreciar a constitucionalidade sucessiva, em concreto e em abstracto, das normas comunitárias.
FONTES DE DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO: O COSTUME INTERNACIONAL E AS CONVENÇÕES INTERNACIONAIS
25. Noção de Fontes Formais e Fontes Materiais
A expressão Fontes de Direito pode ser tomada em duas acepções: como Fontes Formais, ou seja, como processos de formulação do conteúdo de certa regra; e como Fontes Materiais, isto é, como razões do surgimento do conteúdo das fontes formais, por exemplo, as necessidades sociais.
Apenas as Fontes Materiais criam Direito, enquanto as Fontes Formais se limitam a revelá-lo.
26. O Costume Internacional e a doutrina do “Tacitum Pactum”.
O Costume é uma prática reiterada e constante com convicção de obrigatoriedade. É uma concepção Voluntarista, reduzindo toda a regra consuetudinária aos Costumes particulares, fundamenta a obrigatoriedade do Direito Internacional do acordo interestadual, que, quanto ao Costume, revestiria a forma de um Tacitum Pactum.
A doutrina do Tacitum Pactum, destrói completamente o fundamento do Costume Internacional e diverge em pleno do seu entendimento clássico.
27. A Doutrina Clássica sobre a natureza jurídica do Costume Internacional
O elemento objectivo, que consiste na recepção geral, constante e uniforme da mesma atitude, ou seja, sempre que os Estados se encontram em dada situação, todos eles praticam ou omitem certo acto, fazendo-o da mesma forma.
O elemento subjectivo ou psicológico, por seu turno, consiste na convicção de que, se adopta aquela atitude, se está a agir segundo o Direito. Sem este segundo elemento, a prática internacional não passa de mero uso, uma vez que lhe falta a consciência da sua jurisdicidade.
28. Relevo do Direito Internacional Público consuetudinário, apesar dos seus defeitos. O “Ius Cogens”
Não podemos de forma alguma, negar a preponderância que assumiu o Direito convencional como Fonte de Direito Internacional. É impensável pôr lado a lado a mole das normas que diariamente surgem de fonte convencional e de fonte Costumeira. Aliás, é importante verificar que os Tratados Multilaterais vão desempenhando uma certa função de Direito Consuetudinário, ao mesmo tempo que a necessidade de rapidez de formação e regulação dos vínculos internacionais faz surgir “modelos” menos solenes e menos formais, como são os acordos em forma simplificada.
As normas consuetudinárias, integradas em Convenções Internacionais, conservam a sua natureza de Direito Costumeiro.
O Direito Internacional consuetudinário tem ainda um relevo importantíssimo na formação de normas de Ius Cogens, ou seja, das normas de direito imperativo que regulam as relações entre os sujeitos da nossa disciplina. O art. 53º da Convenção de Viena define a norma de Ius Cogens como “a que for aceite e reconhecida pela comunidade internacional dos Estados no seu conjunto como norma à qual nenhuma derrogação é permitida e que só pode ser modificada por norma de Direito Internacional da mesma natureza”.
29. Hierarquia entre as fontes e hierarquia entre as normas de Direito Internacional Público
O Princípios de Direito Reconhecidos pelas Nações civilizadas constituem fonte subsidiária de Direito Internacional Público, só se devendo recorrer aos mesmos não existindo Costume ou Tratado aplicáveis.
Não existe, porém, qualquer hierarquia entre Costume e a Convenção. O Tratado pode revogar ou modificar o Costume, se bem que esta hipótese seja menos usual, dado que normalmente o Tratado prevê o processo de modificação.
Verifica-se, contudo, uma hierarquia entre normas, não podendo as de Ius Cogens ser contrariadas por outras quaisquer de natureza diferente.
O Costume Local é aquele que se estabelece entre Estados concretos, normalmente só dois, constituindo um verdadeiro pacto tácito.
Perante a existência de um Direito Geral e um Direito Particular, ninguém vai, certamente, negar a unidade do Direito Internacional Público, pois “o particular só se manifesta nos limites fixados pelo geral”. A relação entre ambos não pode deixar de ser de subordinação do Direito Regional ao Direito Geral.
AS CONVENÇÕES INTERNACIONAIS
30. Delimitação do conceito de Tratado Internacional. Os termos “Convenção” e “Acordo” Internacional
O art. 2º/1-a da Convenção de Viena, sobre o Direito dos Tratados, de 23 de Maio de 1969, põe-nos logo de sobreaviso quanto ao alcance da palavra Tratado e da palavra Convenção, em Direito Internacional: “a expressão Tratado designa um Acordo Internacional, quer esteja consignado num instrumento único, quer em dois ou vários instrumentos conexos, e qualquer que seja a sua denominação particular”. Quer dizer, o acto jurídico plurilateral, concluído entre sujeitos de Direito Internacional e submetido por estes à regulamentação específica deste Direito, tanto pode ter a designação de carta, acordo, estatuto, pacto, convenção, tratado, protocolo, declaração, etc. o que define, portanto, esta nossa Fonte de Direito é o seu carácter plurilateral, a submissão da sua regulamentação ao Direito Internacional e a sua conclusão entre sujeitos deste ramo de Direito, que nada importando, internacionalmente, a designação que lhe seja atribuída, em cada caso concreto.
A Convenção de Viena, só se aplica aos Tratados Internacionais concluídos por escrito entre Estados e não aos Acordos Internacionais concluídos entre Estados e outros sujeitos de Direito Internacional, nem aos Acordos Internacionais, concluídos em forma não escrita (art. 3º CV). Daqui se podem tirar várias conclusões.
Primeira, é clara a divergência entre o termo Acordo na Convenção de Viena, e na Constituição, o que, de resto, acontece também com o termo Tratado. De facto a Constituição utiliza o termo genérico Convenções Internacionais para abranger tanto os Tratados solenes como os acordos em forma simplificada. Quando se quer referir especificamente aos Tratados solenes, usa o termo Tratado. Quando se quer referir aos acordos em forma simplificada, utiliza apenas a expressão Acordo Internacional.
Segunda, a Convenção de Viena, não se aplica aos Tratados verbais.
Terceira, os acordos entre um Estado e uma Organização Internacional não são regidos pela Convenção de Viena, embora ela se aplique ao acto constitutivo dessa organização e aos Tratados concluídos e adoptados no seu âmbito e às relações entre Estados regidas por Acordos Internacionais escritos dos quais também sejam parte as Organizações Internacionais. O Tratado Internacional é a forma normalmente utilizada para a criação de relações entre Estados soberanos. O estabelecimento de qualquer relação económica, comercial ou financeira entre Estados pressupõe habitualmente um Tratado de cooperação.
Os Tratados sobre o comércio também se limitam geralmente a enunciar umas quantas regras muito gerais, a observar em trocas ulteriores, das quais a mais importante não deixa de ser a cláusula da nação mais favorecida.
As relações entre Estados e Organizações Internacionais também são habitualmente regidas pelo Direito Internacional Público, se bem que, por vezes, seja difícil a qualificação da forma do acto que reveste o estabelecimento de tais relações. Há quem considere, Convenção Internacional, o acordo entre dois Estados submetidos ao Direito Interno de um deles, argumentando que, mesmo assim, sempre estaria subordinado aos Princípios de Direito Reconhecidos pelas Nações civilizadas. Ora, de duas uma: tal acordo ou está submetido ao Direito Interno ou ao Direito Internacional. Não sendo regulado, por via principal, por este último, não pode qualificar-se como Convenção Internacional. Estaremos perante um simples contracto de Direito Interno.
Uma outra hipótese muito frequentemente verificada na prática consiste em uma Convenção Internacional concluída entre Estados remeter, quanto à sua execução, para acordos a concluir por organismos públicos ou privados daqueles mesmos; neste caso, é habitual ainda que aquela Convenção considere tais acordos executivos sua “parte integrante”.
Bastante semelhantes às Convenções Internacionais são ainda os acordos celebrados por pessoas privadas de vários Estados com vista a adoptarem regras jurídicas visando suprir lacunas ou melhorar determinados sectores da ordem jurídica internacional existente.
As Convenções Internacionais tem por objectivo criar normas jurídicas vinculativas dos sujeitos intervenientes. Por esta mesma razão, é habitual excluir do campo do Direito Internacional os acordos que dão pelo nome de gentlemen"s agreements. Estes acordos de cavalheiros são concluídos entre representantes governamentais em seu próprio nome, ou seja, sem intenção de vincular os respectivos Estados.
31. Classificação de Convenções Internacionais
Se atendermos à forma que revestem, podemos classificar as Convenções Internacionais em escritas e orais, conforme constam de um documento ou de um comportamento verbal; e em Tratados (solenes) e Acordos (em forma simplificada).
Uma segunda classificação releva para efeitos de Direito Constitucional e de Direito Internacional, em virtude do maior ou menor número de actos necessários à sua perfeição. De facto, enquanto os Tratados Solenes carecem de ratificação, tal não sucede com os Acordos de forma simplificada.
A mesma Convenção pode apresentar simultaneamente a forma de Tratado para uma parte e a de Acordo simples para outra. Isto, claro, no caso da própria Convenção não prever a necessidade da sua ratificação.
De acordo com o número de partes, pode a Convenção ser Bilateral ou multilateral, conforme tenham participado, na sua conclusão, duas ou mais partes.
Tratados Multilaterais Gerais, significando-se com isso que os estes tendem para a universalidade, sendo, portanto, irrelevante o número de partes que venham a ter; chamam-se Tratados Multilaterais Restritos àqueles que apresentam como ponto essencial o número de partes que nele participam. Todavia, é impossível dizer apenas pelo número de partes se a Convenção Multilateral é restrita ou não.
A qualidade das partes também origina uma classificação das Convenções, que tem expressão no art. 3º da CV, sobre o Direito dos Tratados. Tem-se assim, Tratados concluídos entre Estados, acordos concluídos entre Estados e Organizações Internacionais e acordos concluídos entre Organizações Internacionais.
É habitual falar-se ainda da distinção entre Tratados-leis e Tratados-contractos. Enquanto estes seriam semelhantes aos contractos de Direito Interno, criando situações opostas de carácter subjectivo, nos primeiros, as partes emitiram, não vontades convergentes e contrapostas, mas antes um único feixe de vontades paralelas, no mesmo sentido, criando, assim regras gerais e objectivas, tal como acontece com os actos normativos de Direito Interno.
32. Processo da conclusão das Convenções Internacionais
a) Processo geral ou comum às Convenções Bilaterais e Multilaterais
A primeira peça do processo de conclusão de uma Convenção Internacional é a negociação. Falamos de negociação no seu sentido mais amplo, abrangendo quer a discussão do texto-projecto, apresentado por peritos, quer a redacção e adopção do texto da futura Convenção.
Em Portugal, nos termos do art. 197º/1-b CRP – negociar e ajustar Convenções Internacionais. Sendo esta, competência do Governo, devendo os Governos regionais participar na negociação de todas as que digam respeito às Regiões Autónomas (art. 227º/t - participar nas negociações de Tratados e Acordos Internacionais que directamente lhes digam respeito, bem como nos benefícios deles decorrentes da Constituição).
Depois de redigido o texto, a Convenção Internacional apresenta-se com a seguinte contextura: preâmbulo, dispositivo ou corpo da Convenção e anexos.
À negociação segue-se a fase de autenticação do texto, depois da qual este não pode mais ser alterado (art. 10º CV).
A autenticação do texto da Convenção Internacional cria, para o Estado signatário, um dever geral de Boa Fé e o direito de exercer certos actos para a defesa da sua integridade.
Após a autenticação, vem, nos Tratados solenes, a manifestação do consentimento à vinculação.
Segundo o art. 11º da Convenção de Viena, “o consentimento de um Estado a estar vinculado por um Tratado pode manifestar-se pela assinatura, pela troca de instrumentos constitutivos de um Tratado, pela ratificação, pela aceitação, pela aprovação ou pela adesão, ou por qualquer outro meio convencionado”. Nos Tratados solenes, a vinculação do Estado dá-se através da ratificação, que é o acto mediante o qual o órgão competente segundo o Direito Constitucional manifesta a vontade de o Estado se declarar obrigado em relação às disposições daqueles.
Pode dar-se o caso de a ratificação (art. 14º CV) vir a ser feita antes de se dar cumprimento a algumas formalidades anteriores previstas pela Constituição estamos, então, perante as chamadas ratificações imperfeitas, a respeito das quais rege o art. 46º da Convenção de Viena.
Quer o Acordo em forma simplificada quer os Tratados solenes têm de ser objecto de um acto de aprovação, a praticar pelo Governo, em relação a ambos, sob a forma de Decreto simples, art. 197.º/1-c CRP – aprovar os Acordos Internacionais cuja aprovação não seja da competência da Assembleia da República ou que a esta não tenham sido submetidos. Ou pela Assembleia da República, só em relação aos Tratados, sob a forma de resolução art. 161º/i CRP – aprovar os Tratados, designadamente os Tratados de participação de Portugal em Organizações Internacionais, os Tratados de amizade, de paz, de defesa, de rectificação de fronteiras e os respeitantes a assuntos militares, bem como os Acordos Internacionais que versem matérias da sua competência reservada ou que o Governo entenda submeter à sua apreciação.
Teremos uma ratificação imperfeita se o Presidente da República proceder à ratificação de um Tratado solene sem que o Governo ou a Assembleia da República o tenha aprovado.
Mas o art. 46º da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados tem um campo mais amplo de aplicação do que o das ratificações imperfeitas e diz respeito à violação de qualquer regra de Direito Interno relativa à competência para a conclusão de Convenções Internacionais. Quer dizer, tal disposição tem em vista ainda as inconstitucionalidades orgânicas, abrangendo, por exemplo, os casos em que o Governo aprova Tratados de competência do Parlamento.
De facto, pode dizer-se que um Tratado nunca está regularmente ratificado se não for regularmente aprovado, ou seja, se sofrer de inconstitucionalidade formal.
O Tratado tem o seu momento de entrada em vigor. A tal respeito, rege o art. 24º CV.
Uma Convenção pode, nos termos do art. 25º da CV, aplicar-se a título provisório, antes de entrar em vigor. Advirta-se também que há disposições das Convenções que vinculam um Estado mesmo antes de essas Convenções terem entrado em vigor relativamente a esse Estado, isto é, vinculam-no desde a adopção do texto.
Finalmente, as Convenções Internacionais são registadas e publicadas. A norma que tal impõe é o art. 102º da Carta das Nações Unidas, completada pelo art. 80º da CV.
b) Especificidade do Processo de Conclusão das Convenções Multilaterais
A negociação é colectiva e feita numa conferência internacional onde os textos são adoptados por maioria, ou no seio de uma Organização Internacional, por meio de um seu órgão permanente.
Aparece-nos a distinção entre Convenções Multilaterais abertas e Convenções Multilaterais fechadas. Enquanto, nas primeiras, podem vir a participar membros diferentes dos contratantes originários, nas Convenções fechadas, só é admitida a participação dos contratantes originários.
A participação nas Convenções abertas pode dar-se, quer pela assinatura diferida, quer pela adesão.
A assinatura diferida, é aquela que podem fazer os Estados, quer tenham quer não tenham tomado parte na negociação, durante um prazo fixado na própria Convenção. A adesão, consiste no acto pelo qual um Estado não-signatário duma Convenção Internacional, concluída entre outros Estados, em relação aos quais ela se encontra em vigor, se torna parte nesta, tenha ou não tenha participado na sua negociação (art. 15º da CV). As Convenções Multilaterais Gerais deveriam estar abertas à adesão de todos os Estados. Tal não é, contudo, a prática seguida, dado que, muitas vezes, se pretendem retirar efeitos políticos colaterais da mera possibilidade de participação numa Convenção Internacional.
Como a adesão não é precedida de assinatura, a aprovação parlamentar ou governativa da Convenção, por acaso, necessária deverá ser feita antes do envio do instrumento de adesão.
Quando um Estado adere, sob reserva de ratificação, o depositário deve entender que não se manifesta uma vontade definitiva de aderir, mas sim uma mera intenção de aderir, sem qualquer efeito jurídico diferente daquele que provoca a assinatura dum Tratado solene.
A entrada de um Estado para uma Convenção Multilateral é ainda facilitada pela possibilidade de formulação de reservas.
A reserva é, segundo o art. 2º/1-d da CV, “uma declaração unilateral, qualquer que seja o seu conteúdo ou uma designação, feita por um Estado quando assina, ratifica, aceita ou aprova um Tratado ou a ele adere, pela qual visa excluir ou modificar o efeito jurídico de certas disposições do Tratado na sua aplicação a este Estado”.
Pela formulação da reserva, modifica-se a Convenção nas relações entre o Estado que a formulou e o Estado que a aceitou; não sem modificar as relações das outras partes entre si; a Convenção entra em vigor entre o Estado que formulou a reserva e a parte que a ela objectou e não se opôs a que a Convenção entrasse em vigor entre ambos, embora as disposições sobre que incide a reserva não se apliquem entre os dois Estados, na medida do que foi previsto pela reserva. A formulação de uma reserva nem a objecção à mesma têm carácter definitivo, podendo ser unilateralmente retiradas (art. 22º da CV).
As Convenções Multilaterais obrigam à instituição de um depositário, que evita as trocas excessivas de instrumentos de ratificação, enviando-se, assim, apenas um instrumento de ratificação que é depositário ou no Estado no Território do qual se desenrolaram as negociações ou no secretariado de uma Organização Internacional, quando a Convenção é negociada sob os auspícios ou no seio dessa Organização. O depositário notifica os restantes Estados do depósito das ratificações que se forem operando.
33. Condições de validade das Convenções Internacionais
a) Capacidade das partes
Só têm capacidade para celebrar Convenções Internacionais os sujeitos activos de Direito Internacional.
Face ao art. 6º da CV (“todo o Estado tem capacidade para contrair Tratados”), a incapacidade de um Estado só pode resultar de um Tratado anterior
A sanção da incapacidade internacional é a nulidade da Convenção.
b) Regularidade do consentimento
1. Irregularidades formais
Estas irregularidades dizem respeito à competência e ao processo para a conclusão das Convenções.
2. Irregularidades substanciais.
I. ERRO
Art. 48º da CV. Tanto se pode tratar de um Erro de facto como de direito. O Erro pode ser determinante e desculpável.
O Erro de redacção da Convenção não afecta a sua validade, dando apenas lugar à sua rectificação, segundo o art. 79º da CV.
Não se faz, no art. 48º CV, qualquer distinção entre Erro Bilateral e Erro Unilateral.
Também o Erro provoca uma nulidade relativa, só podendo o vício ser invocado pela parte que dele é vítima.
II. DOLO
O Dolo encontra-se muito próximo do Erro. Simplesmente, no Dolo, há artimanhas da contra-parte, que induzem a vítima em erro. Sucede, por isso, que também só a vítima o pode arguir (nulidade relativa), ou pode sanar o vício expressa ou tacitamente, art. 49º da CV.
III. CORRUPÇÃO DO REPRESENTANTE DE UM ESTADO
A Corrupção produz a nulidade do Tratado. Para que tal vício possa ser imputado a um Estado, basta que o acto que lhe dá origem emane de uma pessoa que age por conta desse Estado ou sob seu controlo, art. 50º da CV.
IV. COACÇÃO EXERCIDA SOBRE O REPRESENTANTE DE UM ESTADO E COACÇÃO EXERCIDA SOBRE UM ESTADO PELA AMEAÇA OU PELO EMPREGO DA FORÇA
São casos de nulidade absoluta regulados pelos arts. 51º e 52º da CV.
c) Licitude do objecto
Segundo o art. 53º da CV, “é nulo todo o Tratado que, no momento da sua conclusão, é incompatível com uma norma imperativa de Direito Internacional Geral”.
Segundo o art. 64º da CV, “se sobrevier uma nova norma imperativa de Direito Internacional Geral, todo o Tratado existente que seja incompatível com esta norma torna-se nulo e cessa a sua vigência”.
34. Processo de anulação das Convenções Internacionais
O processo de anulação de uma Convenção Internacional vem regulado nos arts. 65º, 66º e 67º da Convenção de Viena.
A parte que pretende arguir a nulidade ou a anulabilidade de uma Convenção deve notificar a sua pretensão à outra ou outras partes. Não há prazo de caducidade para o exercício deste direito, sendo ele exclusivo das partes, não podendo, portanto, qualquer terceiro Estado invocar o vício, mesmo que se trate de um caso de anulabilidade absoluta.
De acordo com o art. 44º da CV, a arguição da nulidade só pode ser feita em relação a toda a Convenção e não apenas em relação a certas cláusulas, salvo se:
a) Essas cláusulas são separáveis do resto do Tratado, no que respeita à execução;
b) Resulta do Tratado ou foi por outra forma estabelecido que a aceitação das referidas cláusulas não constituiu para a outra parte ou para as outras partes no Tratado uma base essencial do seu consentimento a estarem vinculadas pelo Tratado no seu conjunto;
c) E não for justo continuar a executar o que subsiste do Tratado.
Tratando-se de dolo ou corrupção do representante dum Estado, o Estado lesado tanto pode arguir a nulidade de todo o Tratado, como pode invocar apenas a nulidade de certas cláusulas. Caso a nulidade tenha origem na coacção ou na incompatibilidade da Convenção com uma norma de “Ius Cogens”, apenas pode ser invocada a nulidade de toda a Convenção.
35. Consequências das nulidades das Convenções Internacionais
As consequências das nulidades variam conforme a espécie de nulidade em causa.
As disposições duma Convenção nula não têm força jurídica, mas, se tiverem sido praticados actos nulos com fundamento numa tal Convenção:
a) Qualquer parte pode pedir a qualquer outra parte que restabeleça, tanto quanto possível, nas suas relações mútuas, a situação que teria existido se esses actos não tivessem sido praticados
b) Os actos praticados de Boa Fé, antes de a nulidade haver sido invocada, não são afectados pela nulidade do Tratado.
Quer dizer: os actos praticados devem, tanto quanto possível, desaparecer. Todavia, como foram praticados de Boa Fé, não originam, a Responsabilidade Internacional do Estado.
Quando a nulidade resulta da oposição da Convenção a uma norma de Ius Cogens, as partes são obrigadas:
a) A eliminar, na medida do possível as consequências de todo o acto praticado com base numa disposição que seja incompatível com a norma imperativa de Direito Internacional; e
b) A tornar as suas relações mútuas conformes à norma imperativa de Direito Internacional geral.
Quando tal norma surge posteriormente à conclusão da dita Convenção, a cessação da sua vigência:
a) Liberta as partes da obrigação de continuar a executar a Convenção;
b) Não afecta nenhum direito, nem nenhuma obrigação, nem nenhuma situação jurídica das partes, criados pela execução da Convenção, antes de se extinguir.
36. Execução de Convenções Internacionais
Uma Convenção Internacional deve ser executada de acordo com o princípio de Boa Fé, abstendo-se o Estado de reduzir a nada o seu objecto e o seu fim, e, salvo disposição em contrário, não se aplica retroactivamente, nem apenas a uma ou algumas partes do Território de um Estado.
O art. 30º da CV, fixa uma ordem de prioridade. Assim, e não falando, de novo, da prioridade absoluta das normas de Ius Cogens:
- As normas de uma Convenção que violem as normas da Carta das Nações Unidas deverão ceder perante estas;
- Se uma Convenção estabelece que está subordinada a outra anterior ou posterior ou não deve ser considerada incompatível com essa outra Convenção, as disposições desta prevalecem sobre as daquela;
- Se estamos em face de duas Convenções sucessivas com identidade de partes, sem que a primeira tenha deixado de vigorar, as disposições da primeira, que sejam incompatíveis com a segunda, não se aplicam;
- Se não se verifica a identidade das partes:
a) Nas relações entre Estados-partes em ambas as Convenções, aplicam-se as disposições da primeira, que sejam compatíveis com a segunda;
b) Nas relações entre um Estado-parte nas duas Convenções e um Estado-parte apenas numa dessas Convenções na qual os dois Estados são partes rege os seus direitos e obrigações recíprocos.
37. Efeitos das Convenções Internacionais
De acordo com o Princípio da Relatividade das Convenções Internacionais, “um Tratado não cria obrigações nem direitos para um terceiro Estado sem o consentimento deste último”.
Uma Convenção também pode atribuir um direito a um Estado terceiro, através daquilo a que habitualmente se chama estipulação a favor de outrem, mediante a qual, as partes, com o consentimento, mesmo presumido, do terceiro, lhe concedem tal direito, que permanece irrevogável e imodificável a não ser com o consentimento deste último, desde que tal tenha sido estatuído.
A cláusula da nação mais favorecida é outra das técnicas destinadas a criar direitos a favor de Estados terceiros com o seu consentimento.
38. Interpretação das Convenções Internacionais
O art. 31º da CV, manda interpretar de Boa Fé, segundo o sentido comum atribuível aos termos da Convenção no seu contexto e à luz dos respectivos objecto e fim.
Como meio complementar de interpretação, as partes podem lançar mão dos trabalhos preparatórios e das circunstâncias em que foi concluída a Convenção, desde que a utilização dos meios descritos tenha conduzido a um sentido ambíguo, absurdo ou não razoável.
39. Extinção ou suspensão da vigência das Convenções Internacionais
A extinção distingue-se da suspensão, porque, pela primeira, uma Convenção perde definitivamente a vigência e a potencialidade de produzir os seus efeitos jurídicos, enquanto pela segunda, tal só acontece duma forma provisória, retomando a Convenção a sua vigência logo que cesse o motivo que tenha determinado a suspensão.
A extinção e a suspensão podem resultar das próprias disposições da Convenção, expressas, ou implícitas.
Podem ainda resultar da conclusão duma Convenção posterior.
Uma terceira ordem de fundamentos para a extinção (ou suspensão, quando possível) é constituída por:
- Nascimento de uma norma de Ius Cogens com a qual a Convenção seja incompatível;
- Nascimento de um Costume derrogatório;
- Violação culposa pela contraparente;
- Impossibilidade superveniente de execução;
- Mudança radical e imprevisível das circunstâncias;
- Extinção das partes contratantes;
- Estado de Guerra.
O processo para se invocar uma causa de suspensão ou extinção duma Convenção Internacional é semelhante ao da arguição da nulidade e encontra-se nos arts. 65º e seg. da Convenção de Viena.
As consequências da extinção encontram-se reguladas no art. 70º e as da suspensão no art. 72º da Convenção de Viena.
40. Revisão e modificação das Convenções Internacionais
Os termos Modificação, Revisão e Emenda são juridicamente equivalentes.
A necessidade de consentimento unânime vigora como regra, quanto à revisão das Convenções Bilaterais e Multilaterais restritas.
Nas Convenções Multilaterais, podem dar-se dois casos:
a) Ou as Convenções contêm cláusulas de revisão, que fixam as condições e o processo a seguir na revisão, sendo tais cláusulas de observância imperativa;
b) Ou tais cláusulas não existem e, então, o acordo que revê a primeira Convenção não necessita de ser aprovado por unanimidade; basta que o seja por maioria.
41. Fiscalização da constitucionalidade das Convenções Internacionais
São possíveis, nos termos dos arts. 280º e 281º da Constituição, de ser submetidas à fiscalização sucessiva concreta e abstracta. Se forem declaradas inconstitucionais, serão, na primeira hipótese, desaplicadas ao caso sub iudice e deixarão, na segunda hipótese, de vigorar desde a data da sua entrada em vigor (se a inconstitucionalidade for originária) ou desde a entrada em vigor de norma constitucional posterior com aquelas incompatível (se a inconstitucionalidade for superveniente).
O Presidente da República pode requerer ao Tribunal Constitucional a apreciação preventiva da constitucionalidade de qualquer norma constante de Tratado Internacional que lhe tenha sido submetido para ratificação, de Decreto que lhe tenha sido enviado para promulgação como Lei ou como Decreto-lei ou de Acordo Internacional cujo decreto de aprovação lhe tenha sido remetido para assinatura (art. 278º/1 CRP).
Se o Tribunal Constitucional se pronunciar pela inconstitucionalidade de norma constante de qualquer Decreto ou Acordo Internacional, deverá o diploma ser vetado pelo Presidente da República ou pelo Ministro da República, conforme os casos, e devolvido ao órgão que o tiver aprovado (art. 279º/1 CRP).




AS RESTANTES FONTES DE DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO
42. Os princípios de Direito reconhecidos pelas nações civilizadas
A alínea c) do art. 38º do Estatuto do Tribunal Internacional de Justiça manda aplicar, nas controvérsias submetidas a este órgão jurisdicional, “os Princípios de Direito Reconhecidos pelas Nações civilizadas”.
As posições sobre este assunto são três: ou se trata de princípios de Direito Internacional Público, ou de princípios de Direito Interno, ou de princípios que tanto podem ser de Direito Internacional Público como ao Direito Interno.
Temos por correcta a segunda posição, por vários motivos.
Por um lado, sendo os princípios gerais de direito considerados fonte subsidiária de Direito Internacional, impeditiva de um non liquet, que só funcionará quando falharem as normas convencionais e consuetudinárias, não se compreende que se confundem com os próprios princípios de Direito Internacional a cuja lacuna pretendem obviar.
Além disso, a formulação do art. 38º coloca esta fonte, sem ambiguidade, ao lado das restantes, com perfeita autonomia.
Em terceiro lugar, os trabalhos preparatórios da alínea c) mostram que se quis consagrar apenas os princípios de Direito Interno (Público ou Privado) e não quaisquer princípios de Direito Internacional.
Entendemos pois, os Princípios de Direito Reconhecidos pelas Nações civilizadas como fonte autónoma e directa de Direito Internacional, embora com carácter subsidiário, visando possibilitar ao juiz a resolução de todos os diferendos que lhe sejam submetidos. O art. 38º/1-c funciona, não como regra constitutiva, mas como norma puramente declarativa duma prática que já vinha de 1794.
O princípio do abuso do direito, significa que o Estado exerce uma competência de forma a iludir uma obrigação internacional ou leva-a a cabo com desvio de poder, isto é, desenvolve-a com vista a prosseguir um fim diferente daquele em virtude do qual a dita competência lhe foi reconhecida.
O princípio segundo o qual a lei especial prevalece sobre a lei geral, é de fácil apreensão: se entre os Estados de uma região do globo se forma um Costume regional, ele prevalece, nas relações entre tais Estados, sobre o Costume geral.
O princípio do estoppel, significa que uma parte num processo vê precludido o direito de adoptar uma atitude que contradiz o que ela expressa ou implicitamente admitiu anteriormente, se da adopção da nova atitude resulta prejuízo para a contra-parte.
43. A Jurisprudência e a Doutrina
“Sob reserva do disposto no art. 59º, as decisões judiciais e a doutrina dos publicista mais qualificados das diferentes nações, como meio auxiliar para a determinação das regras de direito” serão também tidas em conta pelo Tribunal Internacional de Justiça.
Devemos assentar nisto: nem a Jurisprudência nem a Doutrina são Fontes Imediatas e Formais de Direito Internacional Público. De modo que a decisão que o Tribunal Internacional de Justiça venha a emanar não pode apoiar-se senão nas regras das três alíneas do n.º 1 do art. 38º do seu estatuto. O papel da Jurisprudência e da Doutrina é apenas o de servirem de meios auxiliares na determinação do sentido daquelas regras.
44. A Equidade
Nenhum Estado se obrigará a submeter, duma forma geral, todos os seus diferendos a julgamentos segundo a equidade. Casos raros existem, contudo, em que as partes atribuem ao juiz arbitral ou ao tribunal permanente o papel de legislador, chegando mesmo a afastar o direito que, em princípio, seria aplicável ao caso sub iudice. De acordo com o exposto, o n.º 2 do art. 38º reconhece expressamente “a faculdade de o juiz decidir ex aequo et bono, se as partes estiverem de acordo”.
45. Os actos jurídicos unilaterais
Tais actos podem produzir efeitos jurídicos, mas não são criadores de regras atributivas de direitos e obrigações aos sujeitos de Direito Internacional.
Achamos que o Acto Jurídico Unilateral autónomo deve ser considerado como autêntica Fonte Formal de Direito Internacional. Não o é, portanto, quer o acto unilateral que consiste na concretização duma Convenção, quer o acto unilateral, para a validade do qual foi necessário o concurso de outra manifestação de vontade seja ela Bilateral, Multilateral ou Unilateral.
Para que um Acto Unilateral se considere uma Fonte Formal de Direito Internacional, tem de constituir um acto jurídico anterior. Respeitam estes pressupostos o protesto, o reconhecimento a promessa, a renúncia e a notificação.
ORDEM PÚBLICA INTERNACIONAL
46. Critérios gerais de delimitação da ordem pública
Está fora de causa a necessidade da reserva da ordem pública. Mas também é patente a necessidade de “indicar critérios juridicamente fundamentados”, que sejam aptos a conter dentro dos limites convenientes a “corrente livre do sentimento jurídico do juiz”. Com efeito, o perigo inerente à excepção da ordem pública reside na sua indeterminação e na consequente possibilidade de se fazer nela um uso excessivo.
Existem no Código Civil duas disposições que nos vão remeter para o conceito de ordem pública internacional do Estado português: o art. 280º/2 CC (requisitos do objecto negocial); art. 22º CC.
Quando se sai de L1 para L2, não se sabe quantos ordenamentos jurídicos vão ser chamados para regular o caso, o art. 22º CC é uma excepção, salvaguarda da ordem jurídica portuguesa porque o Estado tem interesse na conservação da harmonia jurídica interna porque tem que manter as concepções éticas dos bons costumes.
Para nós, são princípios gerais ou imperativos, quando a norma da ordem jurídica estrangeira viole os nossos princípios fundamentais, tem-se que ir buscar ao ordenamento jurídico estrangeiro alguma norma que se aproxime à nossa ordem jurídica se não se encontrar uma disposição que de algum modo se possa aproximar à nossa ordem jurídica, aplica-se subsidiariamente a ordem interna do Estado português, o que implica o afastamento total da outra ordem jurídica.
A doutrina tem estabelecido alguns critérios limitativos da ordem pública, são critérios aptos a criar limites convenientes para a aplicação da ordem pública porque o conceito de ordem pública é um conceito indeterminado.
3) Critério da natureza dos interesses ofendidos: a ordem pública intervém sempre que a aplicação da norma estrangeira possa envolver ofensa dos interesses superiores do Estado ou da comunidade local;
4) Critério do grau de divergência: a aplicação do direito estrangeiro será precludida sempre que, entre as disposições aplicáveis desse direito e as disposições correspondentes da lex fori, exista divergência essencial;
5) Critério da imperatividade: serão de ordem pública as disposições rigorosamente imperativas do sistema jurídico local.
OS SUJEITOS DE DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO. GENERALIDADES. O ESTADO
46. Discordância da doutrina quanto ao número e natureza dos sujeitos de Direito Internacional Público
São três correntes, que se têm defrontado neste campo.
Para uma delas, chamada Clássica ou Estadualista, apenas os Estados são sujeitos de Direito Internacional. Estado e pessoa jurídica internacional são duas noções que se identificam, portanto, a não ser que se verifiquem quaisquer anomalias históricas, a personalidade jurídica internacional deriva da reunião de todos os atributos da soberania.
Foi ultrapassada por uma dupla de acontecimentos. Por um lado, verificou-se uma certa “sublimação” das soberanias na Constituição das várias Organizações Internacionais, dotadas de autonomia e capacidade de agir. Por outro lado, as circunstâncias levaram a reconhecer certas capacidades jurídicas aos insurrectos e aos movimentos de libertação nacional, assim como a reconhecer um verdadeiro locus standi internacional à pessoa humana e a certas minorias.
A Tese Individualista, situa-se no pólo oposto: não é já o Estado o único sujeito de Direito Internacional, mas é antes o indivíduo. Partindo do pressuposto de que o indivíduo é o verdadeiro sujeito numa sociedade qualquer, a conclusão não pode modificar-se na sociedade internacional.
O verdadeiro sujeito na ordem jurídica internacional será todo o indivíduo que em cada Estado tenha a seu cargo a direcção das relações internacionais ou que intervenha activamente nelas.
É de rejeitar esta doutrina.
Na verdade, faz caber no Direito Internacional Público muitas normas ou instituições cuja a verdadeira sede é Direito Internacional Privado. Por outro lado, não compreende a personalidade jurídica do Estado e das Organizações Internacionais, que confere a tais entidades a qualidade de verdadeiros centros autónomos de direito e deveres.
No surgimento das Teorias Ecléticas ou Heteropersonalistas. Para estas, o âmbito dos sujeitos de Direito Internacional é muito vasto.
Os sujeitos, aqui, são o Estado, as Organizações Internacionais e o próprio indivíduo.
É a que se encontra mais próxima da realidade.
É a verdade que os Estados e as Organizações Internacionais são os principais actores internacionais. O indivíduo vai-se afirmando cada vez mais como pessoa jurídica internacional.
47. O Estado
a) O Reconhecimento declarativo do Estado
Os Estados são as pessoas jurídicas internacionais por excelência. Ao contrário de outros sujeitos de Direito Internacional, cuja a personalidade é criada e cuja capacidade é delimitada por Tratado e muito raramente pelo Costume Internacional, “os Estados são sujeitos imediatos ou primários da ordem jurídica internacional”. O Estado é hoje a forma política essencial por meio da qual toda a colectividade tem acesso à vida internacional.
O reconhecimento é um acto unilateral e livre pelo qual um Estado manifesta ter tomado conhecimento da existência de outro, como membro da comunidade internacional.
Nesta definição está já pressuposto um modo de ver quanto ao problema da natureza do reconhecimento como declarativo ou constitutivo. De facto, quem considerar o acto de reconhecimento como unilateral, enfileira na tese dos defensores do seu carácter declarativo, acontecendo o contrário com os defensores do reconhecimento como acto bilateral.
Além do voluntarismo inerente a esta concepção, repudiamos a doutrina do efeito constitutivo por várias razões: primeiro, porque a prática internacional é justamente no sentido do efeito declarativo; por outro lado, se o reconhecimento tivesse efeito constitutivo, seria um acto retroactivo, e só perante ele o Estado reconhecido assumiria em face do reconhecedor os seus deveres e responsabilidades desde o momento em que constituiu e nunca os assumiria se não fosse reconhecido.
A personalidade jurídica do Estado não surge com o reconhecimento, mas antes quando se reúnem todos os elementos constitutivos. O reconhecimento apenas consigna um facto preexistente.
O reconhecimento de um Estado pode ser expresso ou tácito. No primeiro caso, há uma declaração explícita numa nota ou num Tratado. O reconhecimento tácito é aquele que resulta de um acto que, implicitamente, mostra a intenção de tratar o novo Estado como membro da comunidade internacional.
O facto de um Estado ser membro de uma Organização Internacional não implica que tenha reconhecido todos os Estados da mesma.
Costuma-se falar ainda em reconhecimento de iure e de facto, considerando-se o segundo como um reconhecimento provisório, ou apenas referente a certo número de relações, enquanto o primeiro é definitivo e completo.
b) O Reconhecimento constitutivo dos Beligerantes e dos Insurrectos
O reconhecimento como Estado pode ser precedido do reconhecimento como grupo beligerante ou insurrecto.
Um grupo é Beligerante quando uma parte da população se subleva, dando origem a uma guerra civil, pretendendo desmembrar-se do Estado de que faz parte ou ocupar definitivamente o poder. Neste caso, quando o grupo sublevado constitui um Governo estável, mantém um exército organizado com o qual domina uma parte considerável do Território nacional e se mostra disposto a respeitar os deveres de neutralidade de qualquer Estado atingido pela luta ou que não possa ficar indiferente perante ela pode reconhecer-lhe o carácter de beligerante. Reconhecidos, os beligerantes adquirem, de facto, os direitos e deveres de um Estado.
Por vezes, tem sucedido que uma esquadra se amotina contra o Governo legal, exercendo sobre o mesmo uma grande pressão política.
Nestes casos, se os Estados estrangeiros ou o Governo legal reconhecerem os amotinados como Insurrectos, obrigam-se a não os tratar como piratas ou malfeitores, desonerando-se ainda o Governo legal da responsabilidade dos seus actos.
Todavia, tais insurrectos, mesmo quando reconhecidos, não podem exercer direitos de visita, de captura de contrabando de guerra, etc.
O Direito Internacional não se impõe às legislações internacionais quanto aos efeitos do reconhecimento, porque não regula as consequências na ordem jurídica estadual da atitude do poder executivo perante uma entidade que possui todas as características dum Estado.
ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO ESTADO
48. Generalidades. Os vários elementos que compõem o Território
A importância do Território como elemento constitutivo do Estado é muito grande. Por um lado, marca o domínio dentro do qual o Estado exerce a sua soberania. Em segundo lugar, e referindo-se agora a sua extensão, é factor de defesa militar e de defesa económica, sobretudo quando à extensão se alia a fertilidade do solo ou a riqueza do subsolo.
Todo o Estado deve obstar a que o seu Território seja utilizado para a prática de actos contrários aos direitos de outros Estados.
O Território deve ser bem demarcado. A demarcação segue normalmente os acidentes naturais, quando só há, ou acompanha um paralelo, um meridiano, etc., quando aqueles não existem. As fronteiras chamam-se naturais, no primeiro caso, e artificiais, no segundo.
Podemos dividir o Território em Domínio Terrestre, Domínio Fluvial, Domínio Marítimo, Domínio Lacustre e Domínio Aéreo.
49. Domínio Terrestre
O Domínio Terrestre é a parte do Território que faz parte o solo e o subsolo situados dentro das fronteiras do Estado. O subsolo, seja qual for a profundidade, é considerado pertencente ao Estado que exerce soberania sobre o solo correspondente.
50. Domínio Fluvial
O Domínio Fluvial é constituído por todos os cursos de água ou pela parte dos mesmos que correm no Território de um Estado e pela parte dos cursos de água que o separam de outro ou outros Estados e sobre o qual exercem soberania.
51. Domínio Marítimo Tradicional
O Domínio Marítimo do Estado abrange tradicionalmente as águas interiores, o mar territorial, a zona contígua, a plataforma continental, os mares internos, os estreitos e os canais.
52. Domínio Lacustre
Os lagos são superfícies maiores ou menores de água doce totalmente rodeados de terra.
Em princípio, aplicam-se-lhes as normas que vigoram quanto aos mares internos. Não lhes aplicam tais regras quando o lago comunica com o mar por meio de um curso de água que se situa no Território de mais que um Estado. Neste caso, parece que a jurisdição sobre cada parte da extensão de águas deve ser da exclusividade de cada Estado ribeirinho. Aplicam-se, pois as normas do domínio fluvial.
53. Domínio Aéreo e Espaço Exterior
O Direito Aéreo é formado por uma série de acordos Bilaterais e Multilaterais, que o fazem contrastar com muitas regras de origem consuetudinária vigentes em direito marítimo.
Cada Estado exerce soberania sobre o espaço aéreo suprajacente ao seu domínio terrestre, fluvial, lacustre e suprajacente ao mar territorial e águas interiores.
PARTE ESPECIAL DO DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO
50. Direito das obrigações
Para as obrigações (provenientes de negócios jurídicos) a regra de conflitos básica é a do art. 41º CC: a lei competente é a que tiver sido designada pelas partes ou estas houverem tido em vista. Na falta de determinação da lei competente nos termos do art. 41º CC intervém o critério supletivo do art. 42º CC por força do qual serão aplicáveis:
a) Aos negócios jurídicos unilaterais, a lei da residência habitual do declarante;
b) Aos contratos, a lei da residência habitual comum das partes e, na falta de residência comum:
i) Aos contratos gratuitos, a lei da residência habitual daquele que atribui o benefício;
ii) Aos restantes contratos, a lei do lugar da celebração.
O princípio da autonomia: em matéria de obrigações procedentes de negócios jurídicos, e designadamente em matéria de contratos, prevalece os interesses das partes. Os interesses do tráfico jurídico ou da tutela de terceiros têm, neste domínio, pouca ou nenhuma expressão. É, portanto, em atenção ao interesse das partes que se deve determinar a conexão ou “localização” decisiva dos negócios jurídicos.
O Código Civil no art. 41º/2 adoptou a seguinte posição:
a) Se a escolha das partes recair sobre uma das leis com as quais o negócio, através dos seus vários elementos (sujeitos, declaração, objecto, execução, sanção), tenha uma conexão objectiva, ela será sem mais relevante;
b) Se não for esse o caso, então apenas será atendível se “recair sobre a lei cuja aplicabilidade corresponda a um interesse sério dos declarantes”. Admite-se portanto, que a escolha possa recair sobre uma lei não ligada ao negócio por qualquer conexão objectiva, mas neste caso haverá que examinar se tal escolha foi motivada por um interesse sério e digno de tutela – ou se foi apenas determinada por motivos caprichosos ou fraudulentos.
51. Direitos reais
a) Princípio básico da “lex rei sitae”
Segundo o art. 46º/1 CC é a lei do Estado em cujo território, as coisas se acham situadas que se aplica à posse, à propriedade e aos demais direitos reais. Pelo que respeita aos imóveis, este princípio da lex rei sitae tem atrás de si uma longa tradição. O mesmo princípio se aplica hoje aos móveis. Quanto a estes, porém, a tradição mais antiga fundava-se na máxima mobília personan sequuntur, mandando aplicar a lei pessoal (lei do domicílio) do titular do direito real. O recurso à lei pessoal ainda hoje se torna necessário pelo que respeita a coisas situadas em territórios que se não acham integrados em qualquer soberania estadual.
Depois de estabelecer no n.º 1 o estatuto básico dos direitos reais e da posse, o art. 46º/2 e 3 CC define dois estatutos especiais: um para a res in transito, isto é, para as coisas que são objecto de um transporte internacional, enquanto atravessam o território de um país com destino a outro país; e outro para os meios de transporte submetidos a um regime de matrícula. As primeiras, manda-se aplicar a lei do país do destino, e aos segundos a lei do país de matrícula.
Por último, no que respeita à capacidade para constituir direitos reais sobre imóveis ou para dispor deles, o art. 47º CC faz uma remissão condicionada à lex rei sitae, mandando aplicar esta lei, desde que ela assim determine. Não sendo este o caso, vale a regra geral, isto é, aplica-se a lei pessoal.
b) Âmbito de aplicação do estatuto real
Conforme resulta do art. 46º CC é por este estatuto que se rege a constituição, a transferência e a extinção da posse, da propriedade e dos demais direitos reais. Por ele se determinam, desde logo, a classificação das coisas, na medida em que esta classificação das coisas, na medida em que esta classificação interessa ao regime de direito material das mesas, os tipos de direitos reais admissíveis, as coisas susceptíveis de apropriação, os limites de propriedade, etc.
52. Direito da família
Segundo o art. 49º CC os requisitos de validade intrínseca do casamento, ou seja, a falta e vícios do consentimento e a capacidade negocial são regulados, em relação a cada nubente, pela respectiva lei pessoal de cada nubente que se apreciará, desde logo, quais as características que deve revestir o consentimento, quais as consequências da divergência intencional entre a vontade e a declaração (casamento simulado), do erro (simples ou qualificado por dolo, quando esta qualificação revele) e da coacção. A mesma lei determina ainda a habilitas ad núpcias, ou seja, toda a matéria de impedimentos matrimoniais.
Quando ambos os nubente têm a mesma lei pessoal, nenhuma dificuldade particular se levanta, visto ser uma única lei a reger a constituição do estado de casado. Tendo os nubentes leis diferentes, importa coordenar as duas leis pessoais. Conforme resulta claramente do art. 49º o nosso legislador seguiu o princípio da aplicação distributiva (e não cumulativa) das duas leis: aplica-se em relação a cada nubente, a respectiva lei pessoal.
53. Separação de pessoas, bens e divórcio
São muito acusadas as divergências entre as várias legislações neste domínio de matérias. Por isso, e porque os problemas da separação e do divórcio contendem com a própria concepção do casamento e da família, matéria sobre maneira melindrosa, não admira que este seja o campo em que com maior frequência e intensidade intervém a excepção da ordem pública, para afastar a aplicação do direito estrangeiro. Assim, entende-se que um tribunal português não deverá decretar o divórcio, mesmo entre estrangeiros, por fundamentos que não sejam para a lei portuguesa.
O art. 55º/1 CC determina como lei aplicável à separação judicial de pessoas e bens e ao divórcio a lei designada pelos critérios estabelecidos no art. 52º CC. É essa, com efeito, a lei que fornece o estatuto básico da sociedade familiar (ver também art. 57º CC). A conexão decisiva em causa é, pois, uma conexão móvel, tal como aliás é postulado pela regra da submissão do estatuto pessoal à lei nova. A conexão decisiva há-de ser aquela que se verificar à data da acção do divórcio – e, designadamente, no dia da audiência de discussão e julgamento, se houver mudança entre a data da proposição da acção e a do julgamento.

54. Direito das sucessões
Pelo que respeita à determinação do estatuto sucessório básico ou estatuto sucessório tout court, deve partir-se da consideração de que hoje prevalece toda a parte, no plano do direito material, a ideia de que a devolução de todos os elementos da herança deve ser submetida às mesas regras, de acordo com a noção romanista de que a sucessão opera a transmissão de uma universalidade jurídica.
Ao estatuto sucessório cabe em geral regular todas as questões relativas à abertura, devolução, transmissão e partilha de herança. Desde logo, compete-lhe regular a abertura da sucessão é, em toda a parte, a morte física. Mas poderá porventura ser ainda a morte civil ou a entrada cara o claustro. As presunções de morte e de sobrevivência, devem ser reguladas também pela lei pessoal. Isto mesmo que se trate de presunções relativas a pessoas reciprocamente sucessíveis e que faleceram num mesmo acontecimento (comoriência). Quanto a este ponto, porém, não falta quem considere, sobre tudo na doutrina francesa, as presunções de sobrevivência como verdadeiras regras de devolução sucessória.
Ao estatuto sucessório cabe igualmente determinar o âmbito da sucessão. E de igual forma regulada pela lei da sucessão a capacidade sucessória, ou seja, a questão de saber quem tem capacidade para adquirir mortis causa.
A POPULAÇÃO
54. Jurisdição do Estado sobre nacionais. A Nacionalidade
A População é o “agregado de indivíduos de ambos os sexos que vivem em conjunto, formando uma comunidade”.
A população de cada Estado é objecto da jurisdição deste. Assim, todas as pessoas residentes num Território estão submetidas, em princípio, à competência do respectivo Estado.
Portanto, a jurisdição do Estado exerce-se sobre os seus nacionais. A nacionalidade pode definir-se como a “pertença permanente e passiva” de uma pessoa a determinado Estado, sob cuja autoridade directa se encontra, reconhecendo-lhe estes direitos civis e políticos e dando-lhe protecção quando se encontra além-fronteiras.
A nacionalidade pode classificar-se em originária e adquirida. É originária, aquela que o indivíduo toma pelo nascimento. É adquirida a que resulta de facto posterior ao nascimento.
A nacionalidade originária pode obter-se segundo o ius sanguinis, isto é, o indivíduo receba a nacionalidade dos seus pais independentemente do local em que nasceu; e pode obter-se segundo o ius soli, ou seja, o local do nascimento é que determina a nacionalidade.
Normalmente sucede que as leis internas combinam os dois sistemas, resultando daí um sistema misto. Geralmente nenhum Estado adopta de modo exclusivo o sistema ius sanguinis ou ius soli. Se um predomina, sempre aparecem excepções na legislação, que se afastam da regra geral, devendo todavia realçar-se que predomina este último critério nos Estados carecidos de população.
Deve notar-se que nenhum Estado é obrigado a permitir que um estrangeiro tome a sua nacionalidade, mesmo depois de preenchidos os requisitos legais.
Para efeitos de naturalização, as pessoas ficam geralmente equiparadas aos nacionais originários em matéria de direitos civis, o mesmo não acontecendo no campo os direitos políticos (art. 15.º - Estrangeiros, apátridas, cidadãos europeus:
1. Os estrangeiros e os apátridas que se encontrem ou residam em Portugal gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres do cidadão português.
2. Exceptuam-se do disposto no número anterior os direitos políticos, o exercício das funções públicas que não tenham carácter predominantemente técnico e os direitos e deveres reservados pela Constituição e pela lei exclusivamente aos cidadãos portugueses.
4. A lei pode atribuir a estrangeiros residentes no Território nacional, em condições de reciprocidade, capacidade eleitoral activa e passiva para a eleição dos titulares de órgãos de autarquias locais.
A naturalização pode não fazer perder a nacionalidade de origem. E quando faz, não tem efeitos retroactivos.
RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL DO ESTADO
55. Casos de responsabilidade subjectiva e de responsabilidade objectiva
A Responsabilidade Internacional do Estado tanto pode resultar duma omissão, como dum acto positivo. Qualquer destas violações da ordem jurídica internacional pode ter como fonte quer o Costume quer os Tratados Internacionais.
A Responsabilidade Internacional do Estado advém, em primeiro lugar, dos actos do seu órgão. Deve, contudo ficar explícito que nem sempre a actividade de um órgão produz a responsabilidade de um Estado: basta que ele aja num domínio em que é incompetente e essa incompetência seja manifesta.
Por actos do poder legislativo, que possam tornar o Estado responsável, entende-se geralmente a promulgação duma lei contrária ao Direito Internacional, ou a não publicação de uma norma exigida para o cumprimento dos seus compromissos internacionais, ou a sua aprovação de uma forma defeituosa.
Igualmente os actos dos órgãos administrativos podem responsabilizar o Estado.
É também muito frequente a responsabilização do Estado por actos do seu aparelho judicial. Em primeiro lugar, pode ser recusado o acesso do estrangeiro ao tribunal. Por outro lado, pode fazer-se uma má administração da justiça quer recusando-se o tribunal a decidir, quer retardando-se inexplicavelmente o processo, quer submetendo o estrangeiro a um tribunal de excepção ou irregularmente constituído. A mesma responsabilidade advém ainda dos julgamentos manifestamente injustos, quer porque violam leis destinadas a proteger estrangeiros, quer porque fazem interpretações abusivas e que lesam a pessoa que recorreu ao tribunal.
O Estado não é responsável apenas pelos actos dos seus órgãos. Há também certos actos praticados pelos indivíduos que podem responsabilizar: são sobretudo os actos praticados contra o Estado estrangeiro ou seus representantes.
Para além da responsabilidade por actos dos seus órgãos, o Estado pode ser internacionalmente responsável por actos de entidades públicas territoriais, por actos de entidades não integradas na estrutura do Estado, mas habilitadas pelo Direito Interno a exercer prerrogativas de poder público, e por actos de órgãos de um Estado ou de uma Organização Internacional postos à disposição do Estado territorial.
Um Estado pode também ser responsável pelos actos de outro quando o representa internacionalmente. A sua responsabilidade não ultrapassa os actos em que representa o outro no exterior.
A Responsabilidade Internacional dum Estado pode ainda advir da prática de crimes contra a paz.
56. O recurso à protecção diplomática
A Protecção Diplomática consiste na acção diplomática levada a cabo pelo Estado nacional do indivíduo prejudicado junto do Governo ou do Estado que internacionalmente é presumível responsável. Esta acção tem em vista obter a reparação do dano causado ao nacional do Estado reclamante, é empreendida pelos canais diplomáticos normais e termina, ou por uma solução política, ou pela sentença dum tribunal arbitral ou dum tribunal internacional a que ambos os Estados resolverem submeter o diferendo.
Ora, tanto a jurisprudência como a doutrina, têm sustentado que é considerada extemporânea qualquer reclamação diplomática feita antes do indivíduo lesado ter esgotado todos os recursos ou instâncias de Direito Interno postas ao seu dispor pelo Estado onde sofre o dano.
Quer dizer, para além da produção de um dano a um indivíduo e da existência de uma relação de casualidade adequada entre a violação de uma norma ou princípio de Direito Internacional e a produção de tal dano, o recurso à protecção diplomática tem um terceiro pressuposto: é necessário que o lesado tenha agido de acordo com o princípio do esgotamento dos recursos ou instâncias de Direito Interno.
Este princípio parece justificado por três ordens de razões.
Em primeiro lugar, deve dar-se ao Estado-réu a possibilidade de demonstrar que não houve dano em relação ao estrangeiro ou a possibilidade de o reparar quando ele existe.
Para além disso, um delito internacional só muito tardiamente é colocado à disposição dos árbitros ou juízes internacionais, os quais normalmente também não estão muito apetrechados para conhecerem até à exaustão o Direito Interno dos Estados intervenientes. Daí que o princípio do esgotamento funcione também como resposta a exigências de carácter técnico.
Podem os Estados interessados renunciar à exigência do esgotamento dos recursos de Direito Interno através do compromisso arbitral ou através da Convenção de reclamações.
O princípio admite excepções. Ora, o princípio nunca as poderia admitir, se não constituísse uma regra processual, porque doutro modo, estar-se-ia a ficcionar, nos casos constitutivos de excepções, uma responsabilidade também antecipada.
O princípio só tem aplicação nos casos em que a vítima do acto ilícito é uma pessoa privada. Compreende-se que a condição do esgotamento dos recursos locais não se verifique sempre que os lesados gozam de imunidade de jurisdição.
Mesmo quando a vítima é uma pessoa privada, o princípio não se aplica quando já houve pedidos iguais rejeitados pelos tribunais locais, quando se verifica um grave perigo na demora do processo, quando os tribunais internos são constitucionalmente incompetentes e, ainda, quando os particulares podem fazer valer o direito à protecção directamente num, Tratado e não o direito que consuetudinariamente lhes é reconhecido.
Também se admite que o particular se abstenha de seguir aquele princípio quando há grave perigo na demora.
Outra excepção verifica-se habitualmente quando um Estado emana uma lei de nacionalização ou pratica actos políticos que lesam o estrangeiro
A excepção preliminar de não-esgotamento dos recursos de Direito Interno pode ser convencionalmente dispensada. Basta que os Estados interessados a ela renunciem expressamente.
Outra regra para que se possa recorrer à protecção diplomática é a da necessidade de um vínculo de nacionalidade efectiva entre o indivíduo lesado e o Estado reclamante.
Quer isto dizer, pelo menos duas coisas: que nenhum Estado, salvo disposição em contrário, faz reclamações a favor de estrangeiros e apátridas; e que nenhuma reclamação é aceite se se verificar uma mera nacionalidade técnica entre o lesado e o Estado reclamante.
Deverá fazer a reclamação diplomática o Estado que mais possa mostrar interessado na causa. Deste modo, não será difícil concluir que o Estado reclamante deverá ser o novo Estado, nos casos de acesso à independência, o mesmo acontecendo nos casos de anexação territorial. Sempre que a nova nacionalidade resulte de um acordo voluntariamente celebrado entre dois Estados, não há óbice a que o mesmo acordo fixe as regras a seguir.
O vínculo da nacionalidade deve existir no momento da produção do dano, devendo manter-se até à reclamação, sendo irrelevante que já não exista no momento em que é proferida a sentença. Seria manifestamente injusto que um particular deixasse de obter reparação de um dano sofrido, depois de ter sido feita a queixa por um Estado. Na verdade, uma vez abandonada a dita queixa, muito dificilmente outro Estado secundária a reclamação do primeiro.
Refira-se que o Estado não exerce apenas a protecção diplomática a favor de cidadãos. Pode exercê-la também a favor de pessoas colectivas que tenham a sua nacionalidade.
57. Formas de reparação da responsabilidade internacional
Constitui princípio geral de Direito reconhecido pelas nações civilizadas aquele segundo o qual sempre que um Estado seja internacionalmente responsável por negligência deve repara o dano a que a sua conduta deu lugar.
A reparação é devida que em relação aos danos materiais quer em relação aos danos morais.
A primeira forma de reparação é a restitutio in integrum, que consiste no restabelecimento da situação anterior.
Sempre que este restabelecimento é possível materialmente ou juridicamente, o Estado internacionalmente responsável deve repor as coisas no seu estado primitivo.
Por vezes, muito embora seja materialmente possível a restituição material ou jurídica, o certo é que ou o lesado está mais interessado numa indemnização ou a reposição da situação jurídica anterior causa tais problemas internos que constitui manifesto abuso do direito a inexistência da restituição jurídica.
Nestes casos, nada obsta o que a indemnização substitua a restitutio in integrum.
Sempre que os danos são de natureza moral ou política, a forma de reparação adquire o nome de satisfação.
A satisfação pode constituir na apresentação de desculpas por via diplomática, no julgamento e punição dos culpados pelos danos morais ou políticos, etc.
Finalmente, a reparação pode consistir numa indemnização, ou seja, na entrega duma quantia pecuniária à vítima do delito internacional.
A indemnização é utilizada, sempre que a restitutio in integrum é material ou juridicamente impossível.