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1ºANO-Direito das Obrigações-1

INTRODUÇÃO

1. Conceito de Obrigação
O termo obrigação é usado, tanto na linguagem corrente como na própria literatura jurídica, em sentidos diversos:
Dever jurídico, é a necessidade imposta pelo direito (objectivo) a uma pessoa de observar determinado comportamento. É uma ordem, um comando, uma injunção dirigida à inteligência e à vontade dos indivíduos, que só no domínio dos factos podem cumprir ou deixar de o fazer.
Quando a ordem jurídica confere às pessoas em cujo o interesse, o dever é instituído, o poder de disporem de meios coercivos que o protegem diz-se que ao dever corresponde um direito subjectivo [1].
O dever jurídico corresponde aos direitos subjectivos, não se confunde com o lado passivo das obrigações. Ao dever jurídico podem contrapor-se, no lado activo da relação não só os direitos públicos, mas ainda, no âmbito restrito do direito privado, tanto os direitos de crédito como os direitos reais, os direitos de personalidade, os direitos conjugais e dos direitos de pais e filhos.
Estado de sujeição, diferentemente do dever jurídico é o chamado estado de sujeição, que constitui o contra pólo dos direitos potestativo.
O estado de sujeição consiste na sujeição inelutável de uma pessoa ter se suportar na sua própria esfera jurídica a modificação a que tende o exercício do poder conferido a uma outra pessoa. O titular passivo da relação nada tem de fazer para cooperar na realização do interesse da outra parte, mas nada pode fazer também para a impedir.
Ónus jurídico, consiste na necessidade de observância de certo comportamento ou de manutenção de uma vantagem para o próprio onerado.
São duas, por conseguinte, as notas típicas do ónus jurídico. Por um lado, o acto a que o ónus se refere não é imposto como um dever. À sua inobservância não corresponde propriamente uma sanção.
Por outro lado, o acto não visa satisfazer o interesse de outrem, sendo estabelecido, pelo contrário, no interesse exclusivo ou também no interesse do próprio onerado, o ónus é um meio de se alcançar uma vantagem ou, pelo menos, de se evitar uma desvantagem.

2. Obrigação em sentido técnico
Diz-se obrigação a relação jurídica por virtude da qual uma (ou mais) pessoa pode exigir de outra (ou outras) a realização de uma prestação.
No mesmo sentido, mas diferindo a relação do lado oposto, diz o art. 397º CC. O vínculo obrigacional, compreende a simples realização de uma prestação (positivo ou negativo), sem ter por objecto a própria pessoa do devedor.
Trata-se de relações em que o direito subjectivo de um dos sujeitos corresponde ao dever jurídico de prestar, imposto ao outro.
Dentro da vasta categoria de deveres jurídicos, o dever corresponde às obrigações em sentido técnico, tem de característico ainda o facto de ser imposto no interesse de determinada pessoa e de seu objecto consistir numa prestação.
3. Características da obrigação
a) Autonomia
Obrigações autónomas, são aquelas que se constituíam directamente, originariamente, entre dois sujeitos jurídicos sem que entre estes preexiste qualquer outra relação jurídica conexa com a obrigação.
Por contraposição a estas há as chamadas obrigações não autónomas, que são aquelas que surgem a partir de uma relação jurídica anterior existente entre os sujeitos e em função dela (ex. arts. 1141º/1; 2009º; 2265º/1 CC).
Hoje toda a gente está de acordo em que as obrigações autónomas ou não autónomas são verdadeiras obrigações, todas elas estando submetidas ao regime geral das obrigações sem, evidentemente, deixar de ter em conta as especialidades que as obrigações não autónomas porventura comportam no seu regime jurídico.
b) Disponibilidade
É uma característica tendencial. No entanto, há organizações que são irrenunciáveis em certas circunstâncias (ex. art. 809º CC). É também o caso da obrigação não autónoma da prestação de alimentos (art. 2009º CC).
Assim a disponibilidade é uma característica tendencial das obrigações, mas há casos de indisponibilidade ou de irrenunciabilidade.
c) Patrimoniabilidade (art. 398º CC)
A lei tomas posição sobre o problema da patrimoniabilidade das obrigações e toma posição negativa.
Quer isto dizer que não podem constituir obrigações, vinculações a comportamentos que não correspondam a um interesse creditório que tenha um mínimo de relevância jurídica.
Consagra-se no art. 398º/1 CC, o princípio da liberdade ou da autonomia privada, que é a da regra no campo das obrigações onde as disposições impeditivas têm carácter excepcional. A tipicidade, que é normal nos outros campos do direito privado, é desconhecida no campo das obrigações (art. 405º CC).
Os limites do art. 398º/1 estão fixados nos arts. 280º e segs.
[1] Lembra-se que direito subjectivo é: o poder juridicamente reconhecido a um sujeito de exigir ou pretender de outrem um determinado comportamento positivo ou negativo; ou por um acto de livre vontade só de per si ou integrado por um acto de uma autoridade pública produzir determinadas consequências de direito que se impõe inelutavelmente na esfera jurídica da contraparte.

OS ELEMENTOS ESSENCIAIS DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS

4. Relações obrigacionais simples e complexas
A relação jurídica em geral diz-se una ou simples, quando compreende o direito subjectivo atribuído a uma pessoa e o dever jurídico ou estado de sujeição correspondente, que recai sobre a outra; e complexo ou múltipla, quando abrange o conjunto de direitos e deveres ou estados de sujeição nascidos do mesmo facto jurídico.

5. Elementos constitutivos da relação
São três os elementos constitutivos da relação obrigacional:
a) Os sujeitos, que são titulares (activo ou passivo) da relação;
b) O objecto, que é a prestação debitória;
c) O vínculo, que é o nexo ideal que liga os poderes do credor aos deveres do obrigado.

6. Os sujeitos
O primeiro elemento da relação, pelo papel primordial que desempenha dentro dela, é constituída pelos sujeitos: o credor, de um lado; e o devedor, do outro.
O credor, é a pessoa a quem se proporciona a vantagem resultante da prestação, o titular do interesse que o dever de prestar visa satisfazer.
Ser titular do interesse protegido, significa, no fundo o seguinte:
a) Ser o credor, o portador de uma situação de carência ou de uma necessidade;
b) Haver bens (coisas, serviços) capazes de preencherem tal necessidade;
c) Haver uma apetência ou desejo de obter estes bens para o suprimento da necessidade ou satisfação da carência.
O devedor é, por seu turno, a pessoa sobre a qual recai o dever específico) de efectuar a prestação.
Excepcionalmente (caso do art. 770º CC), a prestação feita a terceiros (naquelas condições) é liberatória e considera-se como se tivesse sido feita pelo credor. Mas são casos excepcionais.
Quando uma obrigação é plural podemos ter um de dois regimes: o da conjunção ou da solidariedade.

7. Características essenciais do regime
Considerando-se a hipótese de pluralidade passiva (vários devedores):
â Se os vários devedores forem conjuntos, isso significa que o credor, para exigir o cumprimento integral da obrigação, tem de se dirigir a cada um e a todos os condevedores, exigindo de cada um a quota que lhe cabe na obrigação comum.
â Se a obrigação for solidária, o credor pode exigir de qualquer dos devedores o cumprimento integral da obrigação. Qualquer dos devedores está obrigado ao cumprimento da totalidade da prestação e tem contra os seus devedores o direito de regresso na quota que a dada um corresponde.
Importante é saber que quando a obrigação é civil (por contraposição, designadamente à obrigação mercantil ou comercial) o regime da obrigação plural é o da conjunção, salvo se a lei ou da convenção das partes resultar o regime da solidariedade (art. 53º CC).
Considerando a hipótese da pluralidade activa (vários credores):
â Quando está perante solidariedade activa, isto significa que qualquer dos credores pode, sozinho, extinguir do devedor a titularidade da dívida e depois tem a obrigação de pagar aos outros credores a parte que lhe cabe no crédito comum.
â Se a obrigação plural do lado activo for conjunta, cada um dos credores tem a exigir do devedor comum a parte que lhe cabe no crédito comum.
A relação obrigacional não se altera pelo facto de se alterar a pessoa de um dos sujeitos da relação obrigacional.

8. O objecto
É a prestação devida ao credor é o meio que satisfaz o interesse do credor, que lhe proporciona a vantagem a que ele tem direito.
A prestação, consiste em regra, numa actividade ou numa acção do devedor. Mas também pode consistir numa abstenção, permissão ou omissão.
A prestação é o fulcro da obrigação, o seu alvo prático. Distingue-se do dever geral de abstenção próprio dos direitos reais, porque o dever jurídico de prestar é um direito específico, enquanto o dever geral de abstenção é um dever genérico, que abrange todos os não titulares (do direito real ou de personalidade). Tendo principalmente em vista as obrigações de coisas, os autores costumam distinguir entre objecto imediato, consiste na actividade devida; e o objecto mediato da obrigação, na própria coisa em si mesma considerada, ou seja, no objecto da prestação.
O objecto da obrigação é a prestação. Como objecto que é de um negócio jurídico, a prestação tem de obedecer a certos requisitos para ser válido o negócio que emerge a obrigação. São eles (art. 280º CC):
a) Determinabilidade;
b) Possibilidade física e legal;
c) Licitude.

9. Determinabilidade
É quando não estando concretamente determinada na sua individualidade, está enunciado um ou vários critérios que permitem a sua determinação. Se não houver qualquer critério de determinabilidade da prestação, em princípio é nulo o negócio de que emerge a obrigação (art. 400º CC). Admite-se que a determinação possa ser confiada, pelos próprios interessados, a uma ou outra das partes, ou a terceiro. Os critérios da equidade só são aplicáveis, se outros não estiverem sido estipulados.

10. Possibilidade física
Quando no momento da constituição da obrigação a prestação é susceptível de ser realizada humanamente, é passível de realização pelas pessoas em geral, mesmo que não seja realizável pelo devedor. É a possibilidade objectiva. A obrigação só é inválida quando for objectivamente impossível originariamente. Quando a obrigação não for realizável nem pelo devedor, nem pela generalidade das pessoas, nem por ninguém (há uma impossibilidade física) é nulo o negócio de que provinha a obrigação. Fala-se de impossibilidade legal, para significar os casos em que por força da ordem jurídica, não é possível realizar o objecto da obrigação.
Há casos em que se constitui a obrigação e no momento da sua constituição é possível a prestação. E depois, acontece algo que vem a impossibilitar o cumprimento da obrigação. A obrigação e válida e tem um outro regime que é o da impossibilidade superveniente (art. 790º segs. CC), regime esse que pode ser um de dois:
Ø O da impossibilidade superveniente não culposa, o devedor não tem culpa nenhuma que a obrigação se tivesse tornado impossível;
Ø O da impossibilidade superveniente culposa, o devedor é culpado pelo facto de a obrigação se ter tornado impossível.

11. Principais modalidades de prestação
Prestação de facto e prestação de coisa, conforme o seu objecto se esgota, num facto ou se refere a uma coisa, que constitui o objecto mediato da obrigação.
Prestação de facto ou de terceiro, a prestação de facto refere-se em regra, a um facto do devedor. É o depósito que se obriga a guardar e restituir a coisa ou o mandatário que se compromete a realizar determinados actos jurídicos, no interesse do mandante. Mas pode o facto devido reportar-se a factos de terceiro.
Prestação de coisa, prestação de coisa futura, a doutrina do direito comum distinguia, quanto ao tipo da prestação segundo um critério mais escolástico do que propriamente jurídico, entre as obrigações de dare, facere e non facere. As duas últimas correspondem às prestações de facto; as primeiras à actual prestação de coisa.
Prestação de coisa futura, a prestação de coisa refere-se, por via de regra, a coisas já existentes. Mas pode também ter por objecto coisa futura (arts. 397º; 211º CC). A expressão coisa futura é porém usada por lei numa acepção ampla abrangendo não só as coisas que ainda carecem de existência como as próprias coisas já existentes, a que o disponente ainda não tem direito ao tempo da declaração negocial.
A lei, ao admitir prestação de coisa futura, quer significar que tal prestação de coisa futura, quer significar que tal prestação pode constituir objecto da obrigação. Se a coisa futura não chega a existir, ou que vem a existir, mas em quantidade inferior à prevista, por causa não imputável ao devedor, a obrigação extingue-se total ou parcialmente, conforme os casos, ficando o credor desonerado de toda a contra prestação ou de parte dela (arts. 795º/1, 793º/1 CC). Mas nada impede que as partes convencionem que o risco da prestação não chega a existir será suportado pelo credor (art. 800º/2 CC).
Prestação instantânea e prestações duradouras, dizem-se instantâneas as prestações em que o comportamento exigível do devedor se esgota num só momento ou num período de tempo de duração praticamente irrelevante.
A prestação protela-se no tempo, tendo a duração temporal da relação creditória, influência decisiva na conformação global da prestação (prestação duradoura).
Prestação fungível [2], quando pode ser realizada por pessoas diferentes do devedor, sem prejuízo do interesse do credor; será não fungível, no caso de o devedor não puder ser substituído no cumprimento por terceiro. São as obrigações em que ao credor não interessa apenas o objecto da obrigação mas também a habilidade, o saber, a destreza, a força, o bom-nome ou outras qualidades pessoais do devedor.

12. Facto jurídico ou vínculo jurídico
Através do vínculo que a ordem jurídica estabelece entre o credor e o devedor. Este vínculo, constituído pelo enlace dos poderes conferidos ao credor com os correlativos deveres impostos ao titular passivo da relação, forma o núcleo central da obrigação, o elemento substancial da economia da relação. Atenta a facilidade com que mudam os sujeitos da obrigação e ponderadas as transformações que sofre a cada passo a própria prestação debitória, o vínculo estabelecido entre o devedor e o credor constitui o elemento verdadeiramente irredutível na relação. Nele reside o cerne do direito de crédito.
Na relação obrigacional há essencialmente um direito subjectivo relativo, um direito de crédito, e uma posição jurídica passiva – uma obrigação.
O direito do credor é o direito a obter a prestação voluntária ou coercivamente.
O princípio geral nesta matéria decorre do art. 817º CC. O credor tem direito à prestação e, no caso de não haver cumprimento espontâneo, tem a chamada acção de cumprimento, que é a entidade complexa que se decompõe numa acção declarativa e numa acção executiva, das quais a segunda pode depender a primeira, isto é, da condenação do devedor à realização da prestação.
A execução é o meio comum de obter coactivamente a satisfação do direito do credor. Mas não é o único. Não pode pôr-se de parte a possibilidade do exercício da acção directa (art. 336º CC), como meio do credor obter o cumprimento da obrigação.
Dizer que a relação obrigacional se resolve num direito e numa obrigação é uma verbalização tradicional mas muito empobrecera das realidades que a relação obrigacional constitui: isto porque, para além do dever de prestação principal sobre o devedor impedem numerosos, de conduta, de protecção.
Uma vez determinado concretamente o objecto da prestação, é aquele bem, que vai entrar no património do comprador, quer ele queira, quer não queira.
Os três elementos que integram o vínculo existente entre os sujeitos da relação, são:
a) O direito à prestação;
b) O dever correlativo de prestar;
c) A garantia.

13. O direito à prestação
É o poder (juridicamente tutelado) que o credor tem de exigir a prestação do devedor.
O credor e só ele pode exigir o cumprimento, e é de acordo com a sua vontade que funciona o mecanismo da execução, quando o devedor não cumpra, mesmo depois de condenado. O credor não é apenas o portador subjectivo do interesse tutelado; é o titular da tutela do interesse; é o sujeito das providências em que a protecção legal se exprime.
14. O dever de restar
É a necessidade imposta (pelo direito) ao devedor de realizar a prestação sob a cominação das sanções aplicáveis à inadimplência.

15. A garantia
A lei não se limita a impor um dever de prestar ao obrigado e a atribuir ao credor o correlativo à prestação. Procura assegurar também a realização coactiva da prestação sem prejuízo do direito que, em certos casos, cabe ao credor de resolver o contrato ou de recusar legitimamente o cumprimento da obrigação que recaía sobre ele próprio, até que a devedor se decida a cumprir.
A acção creditória, é o poder de exigir judicialmente o cumprimento da obrigação, quando o devedor não cumpra voluntariamente, e de executar o património deste (art. 817º CC).
Vista do lado do devedor, a garantia traduz-se fundamentalmente na responsabilidade do seu património pelo cumprimento da obrigação e na consequente sujeição dos bens que o integram aos fins específicos da execução forçada.
Se o devedor não cumprir espontaneamente a obrigação:
Ø Ou a prestação é de tal natureza que o credor pode exigir a sua execução específica; ou a prestação, por ser infungível, é insusceptível de execução específica.
Ø Ou o credor já perdeu o interesse que tinha na prestação e o incumprimento tornou-se definitivo.
Quando se chega a esta situação de o credor ter ao seu dispor a indemnização pelos danos decorrentes do incumprimento, o que garante o cumprimento do crédito e do crédito indemnizatório é o património do devedor.
A garantia geral das obrigações é o património do devedor. Mas nem todos os bens são susceptíveis de apreensão judicial, isto é, nem todos os bens são penhoráveis (arts. 82º, 823º CPC), dentro dos bens penhoráveis há três categorias:
â Há bens que são totalmente penhoráveis;
â Há bens que são relativamente penhoráveis, quer dizer que são impenhoráveis em relação a certos processos;
â Há bens que são parcialmente impenhoráveis, assim acontece com uma parte (2/3) de todas as remunerações periódicas de trabalho.
A garantia geral das obrigações, é constituída não por todos o património do devedor, mas apenas pelos bens componentes desse património que são susceptíveis de penhora.
Meios de conservação da garantia patrimonial:
â Declaração de nulidade/legitimidade dos credores (art. 605º CC);
â Sub-rogação do credor ao devedor (art. 606º CC);
â A impugnação pauliana (art. 610º, 612º CC);
â Arresto (art. 619º CC).

16. Garantias especiais das obrigações
Para além da garantia geral que é comum a qualquer obrigação, uma obrigação pode dispor de uma garantia especial, a qual pode ter como fonte: convenção, a lei ou decisão judicial, dependentemente do tipo de garantia. Dois subtipos:
- Garantias pessoais;
- Garantias reais.
Garantias pessoais: está-se perante esta, quando um sujeito, terceiro relativamente à relação obrigacional, responde com o seu património pelo cumprimento da obrigação. A nossa lei prevê três garantias especiais pessoais:
- A fiança (art. 627º CC);
- A sub-fiança (art. 630º CC);
- Mandato de crédito (art. 629º CC).

17. Garantias reais
Está-se perante esta, quando por convenção das partes, por estipulação da lei ou por decisão judicial, certos bens, ou o valor de certos bens, ou o valor dos rendimentos de certos bens, responde privilegiadamente pelo cumprimento da obrigação.
Quer isto dizer que quando há uma garantia real, o credor tem o direito de se fazer pagar com preferência sobre todos os credores, pelo valor de um certo bem ou dos rendimentos de um certo bem. Ele pode fazer vender judicialmente um certo bem e com o produto da venda judicial desse bem, fazer-se pagar pelo seu crédito. Isto independentemente de ser ou não suficiente. Se for insuficiente, ele depois concorre, para a parte restante com os demais credores quanto à garantia geral. As garantias reais previstas na nossa lei são:
a) A consignação de rendimentos (art. 656º CC);
b) Penhor (art. 666º/1 CC);
c) Hipoteca (art. 686º/1 CC);
d) Privilégios creditórios (art. 733; 736º CC);
e) Direito de retenção (art. 754º CC).


[2] A fungibilidade, a parece consagrada como regra no art. 767º/2 CC, que apenas ressalta os casos em que expressamente se tenha acordado que a prestação deva ser feita pelo devedor (não fungibilidade convencional) ou em que a substituição prejudique o credor (não fungibilidade fundada na natureza da prestação).


FONTES DAS OBRIGAÇÕES


18. Introdução
Diz-se fonte de obrigação o facto jurídico de onde nasce o vínculo obrigacional. Trata-se da realidade sub specie iuris que dá vida à relação creditória: o contrato, o negócio unilateral, o facto ilícito, etc.
A fonte tem uma importância especial na vida da obrigação, por virtude da atipicidade da relação creditória.
Chama-se fonte de uma obrigação ao facto jurídico de que emerge essa obrigação, ao facto jurídico constitutivo da obrigação.
A sistematização das fontes das obrigações foi feita, ao longo dos séculos, de maneiras diversas. Uma primeira classificação:
a) Contratos;
b) Quase contratos;
c) Delitos;
d) Quase delitos.
Actualmente, face à nossa lei, são fontes das obrigações:
- Os Contratos (art. 405º segs. CC);
- Os Negócios Jurídicos Unilaterais (arts. 457º segs. CC);
- A Gestão de Negócios (arts. 464º segs. CC);
- Enriquecimento Sem Causa (arts. 473º segs. CC;
- Responsabilidade Civil (arts. 483º segs. CC).

19. Contratos
Diz-se contratos o acordo vinculativo assente sobre duas ou mas declarações de vontade (oferta ou proposta, de um lado; aceitação, do outro), contrapostas mas perfeitamente harmonizáveis entre si, que visam estabelecer uma composição unitária de interesses.
O Código Civil português vigente na define expressamente a figura do contrato, além de admitir a constituição de obrigações com prestação de carácter não patrimonial (art. 398º/2 CC), considera expressamente como contratos o casamento (art. 1577º CC), do qual brotam relações essencialmente pessoais, bem como o pacto sucessório (arts. 1701º, 2026º, 2028º CC), que é fonte de relações mortis causa.
O contrato pode ser hoje, por conseguinte, não só fonte de obrigações (da sua constituição, transferência, modificação ou extinção), mas de direitos reais, familiares e sucessórios.
O contrato é essencialmente um acordo vinculativo de vontades opostas, mas harmonizáveis entre si.
O seu elemento fundamental é o mútuo consenso. Se as declarações de vontade das partes, apesar de opostas, não se ajustam uma à outra, não há contrato, por que falta o mútuo consentimento.
Se a resposta do destinatário da proposta contratual não for de pura aceitação, haverá que considerá-la, em homenagem à vontade do proponente, como rejeição da proposta recebida ou como formulação de nova proposta, até se alcançar o pleno acordo dos contraentes (art. 223º CC).
As vontades integram o acordo contratual, embora concordantes ou ajustáveis entre si, têm que ser opostas, animadas de sinal contrário.
Se as declarações de vontade são concordantes, mas caminham no mesmo sentido, reflectindo interesses paralelos, não há contrato, mas acto colectivo ou acordo.
O contrato é um negócio jurídico bilateral ou plurilateral isto é, integrado pela manifestação de duas ou mais vantagens diversas que se conjugam para a realização de um objectivo comum.
A única razão porque se fala em vontades contrapostas mas convergentes para a produção de um certo efeito, é para distinguir os contratos dos negócios jurídicos unilaterais em que há mais de que um sujeito. E aí as declarações de vontade já não são contrapostas, mas são paralelas.
A liberdade de contratual encontra-se consagrada no art. 405º CC, e corresponde a esta ideia muito simples: as partes são livres de celebrar ou não celebrar o contrato que quiserem.
A liberdade contratual tem portanto duas vertentes, ou componentes: a liberdade de celebração e liberdade de estipulação.

20. O princípio da liberdade contratual
É uma aplicação da regra da liberdade negocial, sendo ambos eles um corolário do princípio da autonomia privada, só limitando, em termos gerais, nas disposições dos arts. 280º e segs. CC (art. 398º CC) e em termos especiais, na regulamentação de alguns contratos.
Em virtude deste princípio, ninguém pode ser compelido à realização de um contrato. Esta regra tem também excepções (ex. art. 410º segs. CC).
O princípio da liberdade contratual desdobra-se em vários aspectos:
a) A possibilidade de as partes contratarem ou não contratarem, como melhor lhes aprouver;
b) A faculdade de, contratando, escolher cada uma delas, livremente, o outro contraente;
c) A possibilidade de, na regulamentação convencional dos seus interesses, se afastarem dos contratos típicos ou paradigmáticos disciplinados na lei ou de incluírem em qualquer destes contratos paradigmáticos cláusulas divergentes da regulamentação supletiva contida no Código Civil.

21. Formação do contrato sem declaração de aceitação
A lei civil (art. 234º CC) [3] ajuda a compreender e enquadrar uma parte importante desse fenómeno negocial.
Trata-se, por conseguinte, de casos em que, mercê de circunstâncias especiais, a lei tem o contrato por concluído sem declaração de aceitação, embora se não prescinda da vontade da aceitação.
São situações em que, dispensando-se a declaração de aceitação, mas não se prescindindo da vontade de aceitação, esta se demonstra as mais das vezes por actos de execução da vontade.

22. A disciplina legislativa dos contratos: princípios fundamentais por que se rege
Mais que uma das fontes das obrigações, o contrato, como negócio unilateral que é, pode considerar-se em certo sentido a fonte natural das relações de crédito.
Os princípios fundamentais em que assenta toda a disciplina legislativa dos contratos é a seguinte:
a) Princípio da autonomia privada, que atribui aos contraentes o poder de fixarem, em termos vinculativos, a disciplina que mais convém à sua relação jurídica.
b) Princípio da confiança, assente da stare pactis, segundo o qual cada contraente deve responder pelas expectativas, que justificadamente cria, com a sua declaração, no espírito da contraparte.
c) Princípio da justiça cumutativa ou da equivalência objectiva, de acordo com o qual, nos contratos a título oneroso, à prestação de cada um dos contraentes deve corresponder uma prestação de valor objectivo sensivelmente equivalente da parte do outro contraente.

23. O princípio da autonomia privada
Reveste na área específica dos negócios bilaterais ou plurilaterais, a forma da liberdade contratual.
A autonomia privada é um princípio da área bastante mais dilatada (do que a liberdade contratual), pois compreende ainda a liberdade de associação, a liberdade de tomar deliberações nos órgãos colegiais, a liberdade de testar, a liberdade de celebrar acordos que não são contratos e a liberdade de praticar os numerosos actos unilaterais que concitam a tutela do Direito.

24. O princípio da confiança (pacta sunt servanda)
Explica por sua vez, a força vinculativa do contrato, a doutrina válida em matéria de interpretação e integração dos contratos (arts. 236º, 238º, 239º - 217º CC), e a regra da imodificabilidade do contrato por vontade unilateral, de um dos contraentes (art. 406º CC).

25. O princípio da justiça cumutativa (ou da equivalência das prestações)
Encontra-se por seu turno, latente em várias disposições importantes no nosso direito constituído, entre as quais podem salientar-se as seguintes: a anulação ou modificação dos negócios usurários (art. 282º segs. CC); a possibilidade de redução oficiosa da cláusula penas excessiva (art. 812º CC), etc.…

26. A liberdade de contratar e as suas limitações
Envolve dois termos da expressão, a junção de duas ideias sucessivas de sinal oposto.
Por um lado, através do termo liberdade, exprime a faculdade de os indivíduos formularem sem limitações às suas propostas e decidirem sem nenhuma espécie de coacção externa sobre a adesão às propostas que outros lhes apresentem.
Por outro lado, a liberdade reconhecida às partes aponta para a criação do contrato. E o contrato é um instrumento jurídico vinculativo, é um acto com força obrigatória. A liberdade de contratar é, por conseguinte, a faculdade de criar sem constrangimento um instrumento objectivo, um pacto que, uma vez concluído, nega a cada uma das partes a possibilidade de se afastar (unilateralmente) dele – pacta sunt servanda.
A liberdade de contratar sofre porém, limitações ou restrições em vários tipos de casos:
a) Dever de contratar: há múltiplos casos em que as pessoas singulares ou colectivas, têm o dever jurídico de contratar, logo que se verifiquem determinados pressupostos. Quando assim seja, a pessoa que se recusa a contratar pratica um acto ilícito, que pode constitui-la em responsabilidade perante a que deseja realizar o contrato. Casos há inclusivamente em que a esta pessoa se permite obter a execução coerciva do contrato.
a) Promessa negocial de contratar, quando uma das partes ou ambas elas hajam assumido (previamente) em contrato-promessa (art. 410º segs. CC), a obrigação de celebrar determinado contrato. Quando exista uma convenção desta natureza, o promitente já não é livre de contratar; tem o dever de fazê-lo, sob pena de a contraparte poder exigir judicialmente o cumprimento da promessa ou a indemnização pelo dano proveniente da violação desta.
b) Dever de contratar relativo a serviços públicos, são também obrigadas a contratar, em certos termos, as empresas concessionárias de serviços públicos, sempre que o acto constitutivo da concessão ou os regulamentos aplicáveis lhes permitam recusar a celebração do contrato, sem especial causa justificativa.
c) Profissão de exercício condicionada, restrição semelhante ainda, por força da lei expressa, sobre pessoas que desempenham profissões liberais cujo exercício esteja condicionado à posse de certo título de habitação ou à inscrição em determinados organismos.
b) Proibição de contratar com determinadas pessoas: restrições à liberdade contratual, mas de sinal contrário às discriminadas no grupo anterior, são as provenientes de normas que proíbem a realização de alguns contratos com determinadas pessoas (arts. 579º e 876º CC, quanto à venda e à cessação de direitos ou coisas litigiosas; art. 877º CC [4]; art. 953º CC [5]).
c) Renovação ou transmissão do contrato imposta a um dos contraentes: sem prejuízo da liberdade inicial dos contraentes, a lei impõe a um deles a renovação do contrato ou a transmissão para terceiros da posição contratual da outra parte.
d) Necessidade do consentimento, assentimento ou aprovação de outrem: figuram ainda entre as limitações à liberdade contratual os casos em que, para contratar, certas pessoas necessitam do consentimento ou do assentimento de outrem, e aqueles em que a validade do contrato livremente celebrado entre as partes depende da aprovação de certa entidade.

27. Limites à liberdade de contratar
Depois de se decidir livremente contratar, a pessoa goza ainda da faculdade de escolher livremente a pessoa com quem vai realizar o contrato.
Essa faculdade reveste uma importância especial nos negócios realizados intuitu personae, nos contratos a crédito ou nos contratos destinados a criar relações entre os contraentes.
Mas também neste domínio existem limitações à liberdade contratual, umas resultantes da vontade das partes, outras provenientes directamente da lei.
Entre as primeiras, avultam as criadas pelos chamados pactos de preferência, mediante os quais um dos contraentes se compromete a escolher o outro como sua contraparte, na hipótese de se ter decidido a realizar determinado contrato.
Entre as segundas, destacam-se as resultantes dos chamados direitos legais de preferência e as impostas pelas normas que reservam para certas categorias profissionais a realização de determinados tipos de prestação de serviços.
Os direitos legais de preferência, têm eficácia limitativa da liberdade contratual ainda mais forte do que a resultante dos pactos de preferência.

28. A livre fixação do conteúdo dos contratos; limitações
Além da liberdade de contratar e da liberdade de escolha do outro contraente, reconhece-se aos contraentes a faculdade de fixarem livremente o conteúdo do contrato.
Tomando como ponto de referência os contratos em especial regulados na lei, a liberdade de modelação do conteúdo do contrato desdobra-se sucessivamente:
a) Na possibilidade de celebrar qualquer dos contratos típicos ou nominados previstos na lei;
b) Na faculdade de aditar a qualquer desses contratos as cláusulas que melhor convirem aos interesses prosseguidos pelas partes;
c) Na possibilidade de se realizar contratos distintos dos que a lei prevê e regula.
Porém, como a liberdade de contratar e a liberdade de escolha do outro contraente, também a regra da livre fixação do conteúdo do contrato está sujeita a limitações. Pode mesmo dizer-se que, uma vez destruídos os pressupostos fundamentais em que assentava o liberalismo económico e afastada pelo intervencionalismo político-económico a relutância do Estado em se intrometer nas relações do comércio privado, essas limitações se têm multiplicado de forma acentuada nas modernas legislações, principalmente nos contratos que afloram, com mais frequência ou maior intensidade, poderosos interesses colectivos ao lado dos meros interesses de terceiros. As limitações são, todavia, menos frequentes no campo das obrigações do que nos outros sectores do direito privado. [6]
Estes limites abrangem concretamente, em primeiro lugar, os requisitos formulados nos arts. 280º segs. CC, quanto ao objecto do negócio jurídico, e no art. 398º/2 CC, e compreendem ainda as numerosas disposições dispersas por toda a legislação, que proíbem, no geral sob pena de nulidade a celebração de contratar com certo conteúdo.
Em segundo lugar, cumpre mencionar os contratos-normativos e os contratos-colectivos, cujo o conteúdo, fixado em termos genéricos, se impõe, em determinadas circunstâncias, como um padrão que os contraentes são obrigados a observar nos seus contratos individuais de natureza correspondente.
As normas imperativas, que se reflectem no conteúdo dos contratos: umas aplicáveis à generalidade dos contratos ou a certas categorias de contratos; outras, privativas de certos contratos em especial, e que são vulgares nos sistemas de economia fortemente dirigida.
Entre as primeiras – abstraindo das regras relativas aos negócios formais (arts. 220º, 875º, 947´º 1029º…CC), que respeitam à formação e não aos efeitos do contrato, e das que estão compreendidas no regime geral do negócio jurídico –, avulta o princípio da boa fé, pelo qual se deve pautar a conduta das partes, tanto no cumprimento da obrigação, como no exercício do direito correspondente (art. 762º/2 CC).

29. Cláusulas contratuais gerais (DL 446/85)
Quando se fala dos limites à liberdade contratual, fala-se dos limites jurídicos.
Muitas vezes esses limites introduzidos pela lei à liberdade das partes resultam de a lei (ordem jurídica) verificar que as partes não eram livres e iguais na celebração dos contratos. Isto é, resultaram muitas vezes de haver limites materiais à liberdade contratual, de haver situações contratuais em que uma das partes não tinha o mesmo poder negocial que a outra.
Um dos problemas que os contratos celebrados com base em cláusulas contratuais gerais colocam é desde logo o aderente ao contrato não reconhecer a totalidade do clausulado contratual.
A lei, impõe ao predisponente das cláusulas contratuais gerais um dever de comunicação, na integra das cláusulas dos seus destinatários. Esse dever de comunicação, que está expressamente consagrado no art. 5º, consubstancia uma reafirmação do dever de comunicação que existe, para qualquer contraente, em qualquer contrato que queira celebrar, de comunicar ao outro contraente o conteúdo do contrato que pretende concluir.
Por cláusulas contratuais gerais entende o diploma (art. 1º), as elaboras antes do contrato em que são insertas e que os proponentes ou destinatários indeterminados se limitam, respectivamente, a subscrever ou aceitar.

30. Responsabilidade pré-contratual, a culpa in contraendo e o princípio da boa fé
O art. 227º CC, segundo o qual “quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo regras de boa fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte”.
A lei, consagra a tese da responsabilidade civil pré-contratual pelos danos culposamente causados à contraparte tanto no período de negociações como no momento decisivo da conclusão do contrato, abrangendo por conseguinte a tese crucial da relação final das cláusulas do contrato.
Em segundo lugar, a responsabilidade das partes não se circunscreve, à cobertura dos danos culposamente causados à contraparte pela invalidade do negócio. A responsabilidade pré-contratual, com a amplitude que lhe dá a redacção do art. 277º CC, abrange os danos provenientes de esclarecimento e de lealdade em que se desdobra o amplo aspecto negocial da boa fé.
Em terceiro lugar, além de indicar o critério pelo qual se deve pautar a conduta de ambas as partes, a lei portuguesa aponta concretamente a sanção aplicável à parte que, sob qualquer forma, se afasta da conduta exigível: a reparação dos danos causados à contra parte.
Em quarto lugar, a lei não se limita a proteger a parte contra o malogro da expectativa de conclusão do negócio, cobrindo-a de igual modo contra outros danos que ela sofra no inter negotii.
CLASSIFICAÇÃO DE CONTRATOS
EFEITOS/EFICÁCIA DO CONTRATO
EXTINÇÃO DOS CONTRATOS
CONTRATO-PROMESSA
PACTOS DE PREFERÊNCIA
CONTRATOS TIPIFICADOS
NEGÓCIOS UNILATERAIS
GESTÃO DE NEGÓCIOS
ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
RESPONSABILIDADE CIVIL


[6] Todas estas restrições se podem considerar englobadas genericamente no art. 405º CC (“dentro dos limites da lei”).
CLASSIFICAÇÃO DE CONTRATOS

31. Contratos típicos (ou nominados) e contratos atípicos (ou inominados)
Dizem-se contratos típicos ou nominados, os que, além de possuírem um nome próprio, que os distingue dos demais, constituem objecto de uma regulamentação legal específica.
Os contratos típicos ou nominados, que a lei chama a si para os disciplinar juridicamente, correspondem às espécies negociais mais importantes no comércio jurídico. E a disciplina específica traçada na lei para cada um deles obedece, pelo menos, a um duplo objectivo do legislador.
Por um lado, exactamente porque se trata dos acordos negociais mais vulgarizados na prática, a lei pretende auxiliar as partes e os Tribunais, fixando a disciplina jurídica aplicável aos pontos em que, não obstante a importância que revestem, as convenções redigidas pelas partes são frequentemente omissas.
Por outro lado, a lei aproveita o esquema negocial típico do contrato nominado para, a propósito do conflito de interesses particulares subjacente a cada um deles, fixar as normas imperativas ditadas pelos princípios básicos do sistema.
Distintos dos contratos típicos ou nominados são aqueles (chamados contratos atípicos ou inominados) que as partes, ao abrigo do princípio da liberdade contratual (art. 405º/1 CC), criam fora dos modelos traçados e regulados na lei.

32. Contratos mistos
Diz-se misto, o contrato no qual se reúnam elementos de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei. Em lugar de realizarem um ou mais dos tipos ou modelos de convenção contratual incluídos no catálogo da lei, as partes, porque os seus interesses o impõem a cada passo, celebram por vezes contratos com prestações de natureza diversa ou com uma articulação de prestações diferentes da prevista na lei, mas encontrando-se ambas as prestações ou todas elas compreendidas em espécies típicas directamente reguladas na lei.

33. Contratos gratuitos e contratos onerosos
Diz-se contrato oneroso, o que a atribuição patrimonial efectuada por cada um dos contraentes tem por correspectivo, compensação ou equivalente a atribuição da mesma natureza proveniente do outro, para alcançar ou manter a atribuição patrimonial da contraparte, cada contraente tem (o ónus hoc sensu) de realizar uma contraprestação.
Para que o contrato seja oneroso é preciso que cada uma das partes tenha simultaneamente uma vantagem de natureza patrimonial e um sacrifício do mesmo tipo.
É gratuito o contrato em que, segundo a comum interacção dos contraentes, um deles proporcionou uma vantagem patrimonial ou outro, sem qualquer correspectivo ou contraprestação.
Para que o contrato seja gratuito, é preciso que uma das partes tenha um benefício patrimonial e a outra sofra apenas um sacrifício patrimonial.

34. Contratos bilaterais e unilaterais
Dizem-se contratos unilaterais, os contratos dos quais resultam obrigações só para uma das partes. O contrato é sempre um negócio jurídico bilateral, visto nascer do enlace de duas declarações de vontade contrapostas e ter assim sempre duas partes. Mas há negócios bilaterais que só criam obrigações para uma das partes (ex. doações – art. 940º CC – comodato – art. 1129º CC – no mútuo e no mandato gratuito – art. 1157º CC, etc.; estes são contratos unilaterais.
Dos contratos bilaterais (ou sinalagmáticos), como a compra e venda, a empreitada, não só nascem obrigações se encontram unidas uma à outra por um vínculo de reciprocidade ou interdependência. O vínculo que, segundo a intenção dos contraentes, acompanha as obrigações típicas do contrato desde o nascimento deste [7], continua a reflectir-se no regime da relação contratual, durante todo o período de execução do negócio e em todas as vicissitudes registadas ao longo da existência das obrigações [8].
Os contratos bilaterais ou sinalagmáticos, são contratos de que emergem duas obrigações, cada uma a cargo de uma das partes, ligadas pelo tal sinalagma genético ou funcional.
O sinalagma, liga entre si as prestações essenciais de cada contrato bilateral, mas não todos os deveres de prestação dele nascidos.

35. Excepção do não cumprimento (art. 428º CC)
Um dos traços fundamentais do regime dos contratos bilaterais, que constitui um simples corolário do pensamento básico do sinalagma funcional, consiste na excepção do não cumprimento do contrato (exceptio non adimpleti contratus). Desde que não haja prazos diferentes para o cumprimento das prestações, qualquer dos contraentes pode recusar a sua prestação (invocando a excepção do não cumprimento do contrato), enquanto o outro não efectuar a que lhe compete ou não o oferecer o seu cumprimento simultâneo (art. 428º CC). As obrigações compreendidas no sinalagma devem, em princípio, ser cumpridas simultaneamente.
A excepção do não cumprimento, consiste na faculdade de recusar o cumprimento da obrigação própria, enquanto a outra não cumpra ou não ofereça o cumprimento, quando as obrigações são sinalagmáticas ou não têm prazos diferentes de cumprimento.
Havendo prazos diferentes de um cumprimento, ainda assim a “exceptio” pode ser invocada. E designadamente pode ser invocada, obviamente, por maioria de razão, pelo contraente que está obrigado a cumprir em segundo lugar quando aquele que estava obrigado a cumprir em primeiro lugar o não tenha feito.
Quando um dos contraentes ofereça um cumprimento parcial ou imperfeito (defeituoso), o outro pode invocar a excepção do não cumprimento. O credor pode juridicamente, com fundamento, recusar um cumprimento que não é perfeito ou que não é integral.
- Se o recusar, pode invocara excepção do não cumprimento, para não cumprir a sua própria obrigação;
- Se, tendo aceitado o cumprimento parcial ou defeituoso, o tiver feito sob reserva de reparação dos defeitos, ou reserva de prestação da parte faltosa do cumprimento; se não houver cumprimento da parte que falta a prestação, pode então, tendo essa reserva no momento da aceitação do cumprimento, invocar a excepção do não cumprimento.
A exceptio se oponível, por força do art. 431º CC [9], tanto ao outro contraente, como a terceiro que venham ocupar o lugar dele no contrato.
Para que a exceptio se aplique, não basta que o contrato seja obrigatório, ou crie obrigações para ambas as partes: é necessário que as obrigações sejam correspectivas ou correlativas, que uma seja o sinalagma da outra.
Dentro dos próprios contratos bilaterais, interessa ver quais são as prestações interdependentes, visto que outras podem existir ao lado delas na relação contratual e a exceptio só aproveita às primeiras.
A exceptio não funciona como uma sanção, mas apenas como um processo lógico de assegurar, mediante o cumprimento simultâneo, o equilíbrio em que assenta o esquema do contrato bilateral. Por isso ela vigora, não só quando a outra parte não efectua a sua prestação porque não quer, mas também quando ela a não realiza, ou a não oferece porque não pode. E vale tanto para o caso de falta integral do cumprimento, como para o cumprimento parcial ou defeituoso, desde que a sua invocação não contrarie o princípio geral de boa fé (arts. 227º, 762º/2 CC).

36. Condição resolutiva tácita
Se a impossibilidade da prestação proceder de facto imputável ao devedor, tem o credor a faculdade de resolver o contrato e de exigir a restituição da sua prestação por inteiro, se porventura a tiver já realizado (art. 810º/2 CC).
É a principal sanção apontada contra o inadimplemento da obrigação nos contratos bilaterais, medida que assenta sobre a chamada condição resolutiva tácita. A designação de condição resolutiva tácita, repousa sobre a ideia de que, atento o nexo de interdependência psicológica existente entre as prestações integradoras do contrato bilateral, cada uma das partes se reserva a faculdade de resolver o contrato (fazendo cessar a sua eficácia) se a outra não quiser ou não puder cumprir.

37. Contrato a favor de terceiro
É o contrato em que um dos contraentes (promitente) atribui, por conta e à ordem do outro (promissário), uma vantagem a um terceiro (beneficiário) estranho à relação contratual.
A vantagem traduz-se em regra numa prestação assente sobre o respectivo direito de crédito; mas pode consistir outro sim na liberação de um débito, na constituição, modificação ou extinção de um direito real.
Essencial ao contrato a favor de terceiro, como figura típica autónoma, é que os contraentes procedam com a intenção de atribuir, através dele, um direito (de crédito ou real) a terceiro ou que dele resulte, pelo menos, uma atribuição patrimonial imediata para o beneficiário.

38. Contrato para pessoa a nomear (art. 452º CC)
É o contrato em que uma das partes se reserva a faculdade de designar uma outra pessoa que assuma a sua posição na relação contratual, como se o contrato tivesse sido celebrado com esta última.
Não há no contrato para pessoa a nomear nenhum desvio ao princípio da eficácia relativa (inter partes) dos contratos. O contrato para pessoa a nomear produz todos os seus efeitos apenas entre os contraentes. Só que, enquanto não há designação do animus electu, os contraentes são os outorgantes do contrato. Depois da designação, o contraente passa a ser, de acordo com o conteúdo do contrato, já não o outorgante, mas a pessoa designada (art. 455º/1 CC).
Este contrato tem o seu campo principal de incidência na compra e venda. E tanto pode ser posteriormente nomeado o comprador, como o vendedor.
Ou a pessoa a nomear aceita o negócio e considera-se contraente o que o foi originariamente, salvo, neste último caso, se houver estipulação em contrário. Admite-se assim, dentro dos princípios da autonomia privada, que se deixe o negócio sob condição, ou seja, ineficaz se a pessoa a nomear não o ratificar.

EFEITOS/EFICÁCIA DO CONTRATO

39. Efeitos do contrato
Os contratos podem produzir efeitos de natureza jurídica muito variada. Tipicamente e privilegiadamente os contratos são fontes de obrigações, podem produzir e muitas vezes produzem efeitos de natureza obrigacional. Mas podem produzir efeitos de natureza real.
• Um contrato de compra e venda produz um efeito real, transmite-se um direito real por eles;
• Um contrato de constituição de usufruto é um contrato que produz um efeito real, constitui um direito real;
• Um contrato de constituição de uma servidão é um contrato com um efeito de natureza real.
O princípio da eficácia inter partes do contrato (art. 406º CC), é um princípio geral de imodificabilidade e indestrutibilidade do contrato: a não ser “por mútuo consentimento dos contraentes”.
Em princípio o contrato não pode modificar-se nem extinguir-se, senão, com o acordo de ambas as partes.

40. Quanto à resolução dos contratos; e à eficácia inter partes
O direito à resolução pode ser exercido extrajudicialmente, em muitos casos, basta o contraente que tem fundamento dizer à outra parte “acabou, extingue-se com este fundamento”.
E há casos em que a lei impõe o recurso ao Tribunal, o direito à resolução é um direito potestativo, que às vezes é de exercício judicial.
Também há excepções, que a lei enuncia que em relação a terceiros (inter partes) o contrato produz efeitos em termos previstos na lei (art. 406º/2 CC).
Afirmando que o contrato deve ser pontualmente cumprido, a lei quer dizer que todas as cláusulas contratuais devem ser observadas, que o contrato deve ser cumprido ponto por ponto, e não apenas que ele deve ser executado no prazo fixado.
A regra da ineficácia dos contratos em relação a terceiros não contraria o princípio geral de que todos têm de reconhecer a eficácia deles entre as partes. É pois, de distinguir entre efeitos directos e efeitos reflexos. Estes atingem terceiros.
Uma importante categoria de contratos no que respeita aos efeitos que produzem são os chamados contratos com eficácia real, também designados por contratos reais “quod effectum”, quer dizer contratos reais quanto aos efeitos.
Estes contratos produzem efeitos de direito real, isto é, constituem, transmitem, modificam ou extinguem direitos reais.
Quanto a estes contratos vigora o princípio da consensualidade: significa que o efeito real emergente do contrato se produz pela mera celebração do contrato, pelo mero acordo das partes, independentemente de qualquer acto ulterior, designadamente, independentemente de qualquer entrega do bem.
Temos pois o princípio da consensualidade com duas acepções:
• Princípio da consensualidade, para significar que um contrato se celebra pelo mero acordo das partes, independentemente da observância de qualquer forma especial ou da entrega de qualquer bem.
• E princípio da consensualidade, com o sentido que lhe é atribuído pelo art. 408º CC, nos contratos com eficácia real, significando que o efeito real decorrendo do contrato independentemente de qualquer acto posterior ao acordo conclusivo do contrato (art. 1129º, 1142º, 1185º CC).
O princípio geral decorrente do art. 408º CC, é o de que o efeito real do contrato em princípio se produz pela mera celebração do contrato.
Os contratos “quod constitutionem” (ou contratos reais quanto à constituição), são aqueles que se aperfeiçoam, que se celebra apenas com a entrega da coisa que é seu objecto (ex.: comodato, mútuo, depósito).
São três as principais diferenças existentes entre os regimes da eficácia real e da eficácia meramente obrigacional dos contratos de alienação ou operação de coisa determinada:
a) O contrato de alienação, não dispensando um acto posterior de transmissão da posse e de transferência do domínio, mercê da sua eficácia meramente obrigacional, torna o adquirente um simples credor da transferência de coisa, com todas as contingências próprias do carácter relativo dos direitos de crédito.
b) No sistema de translação imediata, o risco do perecimento da coisa passa a correr por conta do adquirente, antes mesmo do alienante efectuar a entrega (arts. 408º/1, 796º/1 CC), ao invés do que sucede com outra orientação, se a coisa, por qualquer circunstância, só depois da conclusão do contrato se transferir para o adquirente, somente a partir deste momento posterior o risco passa a correr por conta dele.
c) A nulidade ou anulação do contrato de alienação tem como consequência, no regime tradicionalmente aceite entre nós a restauração do domínio da titularidade do alienante (art. 291º – limitação).

41. Coisa futura
Isto não é assim, porém, quando o contrato com eficácia real respeitar a coisa futura ou indeterminada.
Coisa futura, é a coisa que ainda não existe materialmente, é a coisa que já existindo materialmente não tem autonomia jurídica; e ainda são as coisas futuras aquelas que não estão em poder do disponente ou a que ele não tem direito ao tempo da declaração negocial (art. 211º CC).
Quando a coisa é indeterminada, tem de ser indeterminável, também não se constitui ou transmite imediatamente o efeito real, só quando a coisa for determinada com o conhecimento de ambas as partes.
Quando se tratar de partes componentes ou integrantes, a lei diz que o efeito real opera no momento da separação ou colheita do bem.

42. Reserva de propriedade
O princípio da transferência imediata do direito real constitui a regra dos contratos de alienação de coisa determinada (art. 408º/1 CC); mas não se trata de um princípio de ordem pública. É uma pura regra supletiva, que as partes podem afastar, por exemplo, mediante o estabelecimento de uma cláusula de reserva de propriedade. A reserva de propriedade, prevista no art. 409º CC (art. 934º, quanto à reserva de venda a prestações), consiste na possibilidade, conferida ao alienante de coisa determinada, de manter, na sua titularidade o domínio da coisa até ao cumprimento (total ou parcial) das obrigações que recaíam sobre a outra parte ou até à verificação de qualquer outro evento. Trata-se de uma cláusula que naturalmente há-de convir, por excelência, às vendas a prestações e às vendas com espera de preço.
No caso previsto no art. 409º CC, o negócio é realizado sob condição suspensiva, quanto à transferência da propriedade.
A reserva, quando incida sobre coisas imóveis, ou sobre coisas móveis sujeitas a registo, carece de ser registada, sem o que não produz efeitos em relação a terceiros.
Tratando-se de coisa móvel, não sujeita a registo, o pacto vale em relação a terceiros, sem necessidade de qualquer formalidade especial, uma vez que não vigora, quanto às próprias coisas móveis, o princípio segundo o qual a posse vale título.

EXTINÇÃO DOS CONTRATOS

43. Extinção dos contratos
Os contratos extinguem-se, desde logo nos termos do art. 406º CC, que é o regime geral, por mútuo consenso, isto é, por acordo das partes. Se ambas as partes quiserem terminar o contrato que celebraram, naturalmente que podem livremente fazê-lo. Esta forma extintiva do contrato designa-se por revogação ou distrate do contrato.
A revogação ou distrate tem normalmente uma eficácia “ex nunc”, isto é, para o futuro, todos os efeitos produzidos pelo contrato se mantêm e ele deixa de produzir efeitos a partir do momento da sua revogação. Mas as partes podem atribuir-lhe eficácia retroactiva, desde que não afectem direitos de terceiros.
As estipulações posteriores ao negócio formal só estão sujeitas às exigências formais do próprio negócio se a razão de ser dessa exigência lhe for extensiva (art. 221º/2 CC).
Para além da revogação ou distrate, o contrato pode extinguir-se por caducidade. É um efeito jurídico decorrente da verificação de um facto jurídico “stricto sensu”.
Num negócio o contrato caduca quando, por exemplo, tinha um prazo ou quando tinha um termo incerto, pela verificação de um facto jurídico “stricto sensu”, que é o decurso do tempo, em que o contrato deixa de produzir efeitos, isto é a caducidade.
A caducidade tem tipicamente, apenas efeitos para o futuro, todos os efeitos já produzidos pelo contrato até ao momento da verificação do prazo são preservados.
Outra forma de extinção dos contratos e a denúncia. Esta é uma forma de extinção dos contratos de execução duradoura, sem tempo de duração convencional ou legalmente fixada.
Só pode haver denúncia [10], nos contratos de execução duradoura que não tenha prazo, nem convencional nem legalmente fixado, que não tenham termo de duração, que tenham, sido acordados para vigorar indefinidamente.
Uma última forma de extinção dos contratos é a chamada resolução, também designada sobretudo pela doutrina mais antiga rescisão do contrato. A resolução do contrato encontra-se prevista e regulada nos arts. 432º segs. CC, e consiste na extinção do contrato com eficácia retroactiva por declaração unilateral e vinculada de uma das partes. Tal significa que a resolução do contrato é feita por um dos contraentes – por apenas um dos contraentes. Porém ela não é feita livremente por esse ou por qualquer dos contraentes; só pode ser feita, é um direito potestativo, que só pode ser exercido, quando tiver fundamento na lei ou no próprio contrato.
O exercício do direito à resolução do contrato tem como efeito a extinção de todos os efeitos do contrato, retroactivamente “abinicio”, o que significa que na esfera jurídica do outro contraente todos os efeitos jurídicos que o contrato lá tinha produzido desaparecem. Isso quer ele queira, quer não queira, sem que se possa opor a isso. É por isso que a resolução de um contrato é um direito potestativo, vinculado a um fundamento legal ou convencional.

44. Fundamentos legais de resolução de um contrato
a) Falta de pagamento de uma prestação que não exceda o oitavo do preço (art. 934º CC)
Não é geral, é privativo da compra e venda a prestação com reserva de propriedade.
A excepção aberta no art. 934º CC, ao regime geral de venda na prestações reveste carácter imperativo. Não obstante convenção em contrário, ainda que haja, ou mesmo que haja “convenção em contrário”.
É esse o sentido que inquestionavelmente decorre do espírito da lei, toda empenhada em defender o comprador contra a perigosa sedução do pagamento a prestações e da máquina publicitária dos vendedores e em atenuar as consequências da desigual condição económica dos contraentes. Para conseguir esse objectivo, a norma legal necessita de impor-se ao próprio contraente protegido, a fim de que ele não seja vítima da sua mesma fraqueza.
b) Um fundamento que é extensivo a toda uma categoria de contratos, e o art. 810º/2 CC, o incumprimento definitivo e culposo de uma das obrigações das partes
Este fundamento permite a resolução do contrato, quando o contrato for sinalagmático, for bilateral: nos contratos bilaterais, o credor tem direito à resolução do contrato se o devedor incumprir definitiva e culposamente a obrigação que sobre ele impendia.
O principal objectivo da cláusula penal (art. 810º CC) é evitar dúvidas futuras e litígios entre as partes quanto à determinação do montante da indemnização. Muitas vezes porém, ela é fixada com o intuito de pôr um limite à responsabilidade nos casos em que os danos possam atingir proporções exageradas em relação às previsões normais dos contraentes. Também pode servir para atribuir carácter patrimonial a prestação que o não têm (art. 398º/2 CC [11]).
Não só porque se trata de uma cláusula acessória, mas porque a obrigação do devedor se modifica, quando haja lugar à aplicação de pena, exige o n.º 2 do art. 810º CC, para a cláusula penal, a forma exigida para a obrigação principal, e considera a cláusula nula, se for nula esta obrigação.
Pela mesma razão se deve considerar inexigível a pena convencionada, embora a lei não o diga expressamente, se for inexigível a obrigação principal, como acontece nas obrigações naturais, pelo menos quando a razão da inexigibilidade for a mesma.
Apesar do carácter acessório que normalmente reveste, nada obsta a que a cláusula penal seja assumida como penalidade para a não realização de determinado acto, sem que a parte se obrigue propriamente à realização desse acto.

45. Fundamento geral da resolução dos contratos
É aquele que está previsto e regulado nos arts 437º a 439º CC, é a chamada alteração das circunstâncias.
A resolução ou modificação do contrato é admitida em termos propositadamente genéricos, para que, em cada caso o Tribunal, atendendo à boa fé e à base do negócio, possa conceder ou não a resolução ou modificação. Alude a lei, aos seguintes requisitos:
a) Que haja alteração anormal das circunstâncias em que as partes tenham fundado receio de contratar. É preciso que essas circunstâncias se tenham modificado;
b) Que a exigência de obrigação à parte lesada afecte gravemente os princípios da boa fé contratual e não seja coberta pelos riscos do negócio como no caso de se tratar de um negócio por sua natureza aleatório.
Não exige a lei que os contratos tenham prestações correspectivas. Pode tratar-se, assim, dum contrato unilateral, como uma doação, um depósito gratuito, um mandato gratuito, etc.
Tem especial relevo a aplicação dos princípios dos arts 433º a 435º CC. A restituição, quando houver lugar a ela, não está subordinada às regras do enriquecimento sem causa. Há que restituir tudo o que tiver sido recebido.
Tem ainda grande importância prática o disposto no art. 434º/2 CC, visto ser nos contratos de execução continuada ou periódica que a resolução ou modificação fundada na alteração das circunstâncias tem o seu campo de mais frequente aplicação.

CONTRATO-PROMESSA

46. Noção
É a convenção pelo qual ambas as partes, ou apenas uma delas, se obrigam dentro de certo prazo ou verificados certos pressupostos, a celebrar determinado contrato. Ao contrato, a cuja futura realização as partes, ou uma delas apenas, ficam adstritas, dá-se o nome genérico de contrato prometido.
O contrato-promessa [12] cria a obrigação de contratar, ou, mais concretamente, a obrigação de emitir a declaração de vontade correspondente ao contrato prometido. A obrigação assumida por ambos os contraentes, ou por um deles se a promessa é apenas unilateral, tem assim por objecto uma prestação de facto positivo, “facere oportere”. E o direito correspondente atribuído à outra parte traduz-se numa verdadeira pretensão.
Quando se diz que o contrato-promessa é um contrato ou uma convenção, quer dizer que as mais das vezes o contrato-promessa é um contrato-autónomo; mas também é contrato-promessa a convenção inserida noutro contrato pelo qual ambas as partes, ou apenas uma delas, se obriga à celebração de um futuro contrato. Portanto, para que estejamos perante um contrato promessa e lhe sejam aplicáveis as regras próprias desse negócio não é indispensável que se trate de um contrato autónomo. Por outro lado:
- É contrato-promessa aquele pelo qual as partes, ou apenas uma delas, se obriga(m) à celebração de um outro contrato
- Mas também é contrato-promessa o contrato pelo qual uma das partes se obriga perante outra, que nisso tenha um interesse digno de protecção legal, à realização de um negócio jurídico unilateral.
Um contrato-promessa pode ser sinalagmático (ou bilateral), ou não sinalagmático (ou unilateral). Quer isto dizer que pelo contrato-promessa à celebração podem ambas as partes ficar reciprocamente obrigadas à celebração do futuro contrato, ou pode apenas uma das partes ficar obrigada a essa conclusão, ficando a outra com o direito de exigir a celebração do contrato prometido e não estando por sua vez vinculada a tal celebração.

47. Figuras próximas
a) Pacto de preferência (arts. 414º segs. CC): a pessoa não se obriga a contratar, como sucede no contrato-promessa, mas apenas a escolher em certos termos uma ou outra como contraente, no caso de decidir contratar.
b) Venda a retro (arts. 927º segs. CC): o comprador não promete celebrar uma outra venda com o vendedor; fica antes sujeito a que este, mediante uma simples notificação resolva o contrato.
c) Pactos de opção: uma das partes emite logo a declaração correspondente ao contrato que pretende celebrar, enquanto a outra se reserva a faculdade de aceitar ou declinar o contrato, dentro de certo prazo: aceitando, o contrato aperfeiçoa-se sem necessidade de qualquer nova declaração da contra parte, ao contrário do que sucede na promessa unilateral, onde se torna necessário um acordo posterior para dar vida ao contrato definitivo.
d) Promessa unilateral: deriva para o não-promitente uma verdadeira pretensão à celebração do contrato prometido do pacto de opção deriva um direito potestativo à aceitação da proposta contratual emitida e mantida pela outra parte. A promessa unilateral também não se confunde com a proposta contratual (art. 228º/2, 230º CC). Nesta prescinde-se de nova manifestação de vontade do proponente, para que o contrato se aperfeiçoe; na promessa unilateral não, pois o promitente obriga-se apenas à celebração de um contrato futuro. Além disso, enquanto a promessa unilateral assenta sobre um contrato consumado, a proposta é uma simples declaração de vontade emitida por uma das partes que só se converte num contrato com a aceitação do outro contraente, que ela visa provocar.
e) Sinal: a celebração do contrato com sinal, tendo íntima ligação com o contrato-promessa, não se confunde com ele. O sinal consiste na coisa, que um dos contraentes entrega ao outro, no momento da celebração do contrato ou em momento posterior, como prova da seriedade do seu propósito negocial e garantia do seu cumprimento, ou como antecipação da indemnização devida ao outro contraente, na hipótese de o autor do sinal se arrependa do negócio e voltar atrás, podendo a coisa entregue coincidir ou não com o negócio da prestação devida ex contrato.

48. Consagração legal do contrato-promessa
Os traços mais salientes da nova regulamentação são os seguintes:
a) Reconhece-se expressamente a validade do contrato-promessa, não apenas em relação à compra e venda, mas seja qual for o contrato prometido;
b) O art. 411º CC, consagra de modo explícito a validade da promessa unilateral;
c) Admite-se a possibilidade de a promessa de alienação ou de oneração de bens imóveis, ou de móveis sujeitos a registo, produza efeitos em relação a terceiros (art. 413º CC);
d) Admite-se a possibilidade da execução específica do contrato-promessa (art. 830º CC), mediante decisão negocial do contraente faltoso;
e) Afirma-se a regra da transmissibilidade dos direitos e obrigações dos promitentes (art. 412º CC).
Nos termos do art. 410º CC, o regime do contrato-promessa é integrado pelas regras próprias do contrato-promessa, que se encontram nos arts 410º a 413º CC, e se encontram também em grande parte nos arts 441º e 442º CC, e finalmente no art. 830º e art. 755º/1-f CC.
Para além destas regras, são aplicáveis ao contrato-promessa, como determina o art. 410º/1 CC, todas as regras que compõem o regime do contrato prometido – contrato que é o objecto do contrato-promessa. A isso se chama princípio da equiparação.

49. O princípio da equiparação
A directiva de ordem geral que a lei estabelece quanto ao regime do contrato-promessa é a do princípio da equiparação (art. 410º CC), que consiste em aplicar, como regra, aos requisitos e aos efeitos do contrato-promessa as disposições relativas ao contrato prometido.
Duas excepções no entanto se abrem, ao princípio da equiparação: a primeira, relativa à forma do contrato; a segunda referente às disposições que, pela sua razão de ser, se não podem considerar extensivas ao contrato-promessa.
Quanto à forma, a solução aplicável ao contrato-promessa traduz-se nos seguintes preceitos:
a) Se, para o contrato prometido, a lei exigir documento, como sucede para a venda ou doação de coisas imóveis (arts 875º, 947º/1 CC), o respectivo contrato-promessa só é válido se constar de documento escrito, assinado pelos promitentes;
b) Tratando-se de contrato-promessa relativo à celebração de contrato oneroso de transmissão ou constituição de direito real sobre edifício já construído, em vias de construção ou que deva vir a ser construído, o documento escrito necessita de ter o reconhecimento presencial das assinaturas dos outorgantes, bem como a certificação notarial da existência da licença de utilização ou de construção.
c) Se o contrato prometido estiver subordinado a qualquer outra finalidade, que não seja a redução a documento, vale a respectiva promessa a regra geral da liberdade de forma (art. 29º CC).
O princípio da equiparação, significa portanto que ao contrato-promessa, além das suas regras próprias, são aplicáveis as regras próprias do contrato que é seu objecto, do contrato prometido.

50. Forma do contrato-promessa
A forma do contrato-promessa não é a do contrato prometido, visto que as regras formais estão exceptuadas do princípio da equiparação
Do art. 410º/2 CC, resulta quanto à forma do contrato-promessa o seguinte: a regra é a da consensualidade, a regra é a de que o contrato-promessa seja válido independentemente da observância de forma especial.
Quando o contrato-promessa tenha por objecto um contrato, que seja ele próprio, um contrato formal, então o contrato-promessa também é formal.
Nesta hipótese tem-se duas sub-hipóteses:
• O contrato prometido é um contrato formal, sendo a forma para ele imposta por lei o documento particular. O contrato-promessa é um contrato formal e a sua forma é o documento particular subscrito pelas partes.
• O contrato prometido é um contrato formal e a forma para ele imposta é a escritura pública, é o documento autêntico. O contrato-promessa é um contrato formal e a sua forma é o documento particular assinado pelas partes.
O contrato-promessa é formal (quando é) e a sua forma nunca pode ser nem mais, nem menos, do que o documento particular: é sempre documento particular, tanto nos casos em que para o contrato prometido é imposto o documento particular, como para aqueles em que para o contrato prometido é imposto documento autêntico.
Há certos contratos-promessa que a lei exige requisitos formais suplementares. Quais são?
São contratos-promessa de contratos onerosos com eficácia real, são contratos-promessa cujo contrato prometido seja um contrato com efeitos reais transmissivos ou constitutivos e seja um contrato oneroso.
Os requisitos formais suplementares exigidos para o contrato-promessa de compra e venda de um edifício, quer o edifício esteja construído, esteja a meio, ou esteja por construir são:
• O reconhecimento presencial da assinatura ou assinaturas das partes;
• E a certificação pelo notário da existência da licença de construção ou utilização.
Porém a lei admite que o contrato-promessa adquira eficácia real em certas circunstâncias (art. 413º CC).

51. Eficácia real do contrato-promessa
O contrato-promessa, criando para o promitente uma obrigação de contratar, cujo objecto é uma prestação de facto, goza apenas, em princípio, de eficácia meramente obrigacional, restrita por conseguinte às partes contraentes, ao invés do contrato prometido, quando se trate de contrato de alienação ou oneração de coisa determinada, que goza de eficácia real.
Na fixação das consequências do não cumprimento, há também que corrigir o princípio da equiparação à luz das prescrições especiais constantes nos arts 442º e 830º/1/2 CC, para a falta de cumprimento do contrato-promessa.
Admite-se, que a promessa de transmissão ou constituição de direitos reais sobre bens imóveis, ou sobre móveis sujeitos a registo, produza efeitos em relação a terceiros, desde que se verifique:
a) Constar a promessa de escritura pública, salvo se para o contrato prometido a lei não exigir escritura, porque nesse caso a lei se contenta com documento particular;
b) Pretenderem as partes atribuir-lhe eficácia real;
c) Serem inscritos no registo os direitos emergentes da promessa (art. 413º CC).
Quando assim for, a promessa, enquanto não for revogada, declarada nula ou anulada, ou não caducar, prevalece sobre todos os direitos (pessoais ou reais) que posteriormente se constituam em relação à coisa, tudo se passando, sob esse aspecto, em relação a terceiros, como se a alienação ou oneração prometida, uma vez realizada, se houvesse efectuado na data em que a promessa foi registada.
A falta de registos exigidos, o contrato-promessa, ainda que válido, terá eficácia meramente obrigacional. E é especialmente nestes casos, em que o contrato, podendo ter eficácia real, carece dos requisitos para tal efeito exigidos, que mais se acentua a sua eficácia relativa. Os direitos nascidos do contrato não valem contra terceiro, não podem ser opostos a terceiros, nem destes pode ser exigido qualquer indemnização pelo facto da sua violação.

52. Requisitos da eficácia real: requisitos de validade
O objecto do contrato-promessa tem se ser um contrato com eficácia real transmissiva ou constitutiva. Isto é, não pode atribuir-se eficácia real, por ex., a um contrato-promessa de comodato, ou de prestação de serviços, de trabalho ou de arrendamento.
Só será possível atribuir eficácia real a um contrato-promessa quando o seu objecto seja um contrato com eficácia real. E não qualquer eficácia real: tem de ser transmissiva ou constitutiva.
O objecto do contrato prometido sejam imóveis ou móveis sujeitos registáveis.
A forma:
O contrato-promessa para ter eficácia real tem de ser celebrado por escritura pública quando o contrato prometido tenha, ele próprio, como regime formal, o documento autêntico.
Bastar-se-á com o documento particular com as assinaturas reconhecidas por semelhança, quando o contrato prometido não careça de documento autêntico.
Haver no contrato-promessa convenção expressa de atribuição de eficácia real.

53. Requisito de publicidade
O contrato-promessa que obedecer aos requisitos de validade, é um contrato com eficácia real, porém ele não pode ser oposto a terceiros enquanto não estiver registado.
E enquanto não estiver registado com eficácia real dele traduz-se, na prática, em muito pouco porque a eficácia real do contrato-promessa consubstancia-se na constituição a favor do comissário, de um direito real de aquisição.
Direito real esse susceptível de ser oposto a terceiros, isto é, de fazer prevalecer o direito do promissário à celebração do contrato prometido contra qualquer direito por terceiro depois da celebração do contrato-promessa.
é atribuída eficácia real, o promitente da constituição da transmissão do direito real fica constituído num direito real de aquisição do direito prometido transmitir.
E esse direito pode ser oposto a terceiros, isto é, tomando o exemplo de compra e venda, se o contrato-promessa tiver eficácia real e for violado, não obstante a coisa já ter sido alienada a terceiro, interpor acção de execução específica (neste caso terá de ser interposta contra o promitente vendedor e contra terceiro) e obter a sentença que faz as vezes do contrato de compra e venda que com ele não foi celebrado. Os efeitos jurídicos dessa sentença prevalecem sobre os efeitos jurídicos da compra e venda celebrada com terceiro.
O art. 413º CC, estabelece que a eficácia real depende de declaração expressa e de inscrição da promessa no registo.

54. Transmissão dos direitos e obrigações dos promitentes
Os direitos e obrigações resultantes da promessa contratual são, em princípio transmissíveis por morte e por negócio entre vivos (art. 412º/1 CC). Se para um dos contraentes, a promessa cria apenas um direito de crédito, ele poderá cedê-lo, nos termos dos arts. 577º e segs. CC, quando ao contrato-promessa lhe advenham ao mesmo tempo direito e obrigações, como no caso da promessa de compra e venda, ele poderá ceder a sua posição contratual, em conformidade com o disposto no art. 424º segs. CC. Falecendo qualquer das partes, a posição dela transmite-se aos seus sucessores, de acordo com as regras da sucessão.
As regras gerais a que se refere o art. 412º/2 CC, são as relativas à transmissão das posições de credor e de devedor, constantes dos arts 577º segs. CC. Se, para um dos contraentes, a promessa cria simultaneamente direitos e obrigações, ele poderá ceder a sua posição contratual, em conformidade com o disposto no art. 424º segs. CC.

55. Não cumprimento do contrato-promessa
Quando há incumprimento de uma obrigação, esse pode ter natureza muito diversa. Pode ser devido, ou não a culpa do devedor.
Neste caso, de não cumprimento culposo (resultante de culpa do devedor). Dentro desta hipótese, duas sub-hipóteses muito importante, podem ocorrer:
A do devedor não cumprir no momento em que devia tê-lo feito, mas ainda poder cumprir e o cumprimento ainda manter interesse para o credor, nesta hipótese está-se perante um atraso no cumprimento. Está-se perante um incumprimento temporário ou, perante uma situação de mora [13] do devedor.
A do devedor não cumprir quando devia tê-lo feito porque não podia cumprir, há uma impossibilidade de cumprimento. Ou então o devedor não cumpre, entra em mora e entretanto o credor perde o interesse no cumprimento: o cumprimento retardado já não serve para satisfazer o interesse que ele tinha na prestação. Quando estamos perante uma situação de impossibilidade de cumprimento, ou de perda objectiva do interesse do credor no cumprimento, está-se perante incumprimento definitivo.
A interpelação admonitória do devedor em mora, sob a cominação apontada no art. 808º/1 CC, não constitui apenas um poder conferido ao credor, porque representa ao mesmo tempo um ónus que a lei lhe impõe.
Se quiser que a mora do devedor, enquanto o seu interesse na prestação devida se mantiver, se converta em verdadeira falta de cumprimento, com as consequências jurídicas que o inadimplemento liberta, o credor necessita de conceder ao devedor esta nova chance de cumprir.
Os termos declarados no Código Civil, quanto ao não cumprimento voluntário das obrigações fundamentais emergentes do contrato-promessa, são exactamente os de execução específica prevista e regulada no art. 830º CC.
Pode excepcionalmente, acontecer num ou noutro caso, como se prevê de resto, em termos genéricos, no art. 808º/1 CC, que a simples mora do promitente faltoso faça desaparecer o interesse da contraparte na prestação.

56. Sinal
É uma cláusula que pode ser oposta a qualquer contrato que tem natureza real quanto à constituição, isto é só se considera convencionado quando houver entrega da coisa que constitui o seu objecto. A convenção do sinal traduz-se na entrega de uma coisa por um dos contraentes ao outro, desde que essa entrega seja atribuído o carácter de sinal.
O sinal tipicamente é constituído em dinheiro ou coisas fungíveis, é-o em dinheiro, mas nada obsta a que ele seja constituído em coisa diversa de coisa fungível.

57. Função do sinal
Tem duas funções completamente diferentes:
Pode constituir uma cláusula de arrependimento lícito e remunerado do contrato para qualquer das partes, fala-se neste caso em sinal penitencial. Quanto o sinal penitencial, a coisa entregue será perdida pelos contraentes que entregou, se quiser desistir do contrato; terá se ser restituída em dobro pelo outro contraente que a recebeu, se for ele a pretender a desvinculação do contrato.
Para além deste, tem-se o sinal penal, funciona a um de dois títulos jurídicos, em alternativa:
a) Princípio de pagamento, se o contrato a que ele foi oposto for cumprido, se o sinal for coisa que coincida, no todo ou em parte, com a prestação devida pelo contraente que o entregou; nesse caso ele é computado no pagamento e funciona como princípio do pagamento.
b) Quando o contrato é incumprido culposamente por qualquer das partes, o sinal funciona como cláusula penal.
A cláusula penal pode ser:
• Moratória: quando é prevista para o atraso culposo no cumprimento da obrigação do devedor;
• Compensatória: a que fixa imutavelmente o montante indemnizatório pelo incumprimento definitivo culposo.

58. Sinal nos contratos-promessa
Pelo que especificamente respeita ao contrato-promessa em que exista sinal, o regime decorrente da redacção do art. 442º CC, é o seguinte:
a) A coisa entregue a título de sinal “deve ser imputada na prestação devida, ou restituída quando a imputação não for possível (art. 442º/1 CC, aplicável a todos os contratos);
b) “Se quem constitui sinal deixar de cumprir a prestação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente a faculdade de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem daquele a faculdade de exigir o dobro do que prestou” (art. 442º/2 CC, 1ª parte, aplicável a todos os contratos);
c) Em vez de exercer o direito que a lei lhe confere em relação ao sinal, o contraente não faltoso pode “requerer a execução específica do contrato nos termos do art. 830º CC” (art. 442º/3, 1ª parte CC);
d) Se houver tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, o promitente – adquirente, quando o incumprimento do contrato-promessa seja imputável à contraparte, pode, em vez de exigir o dobro do sinal ou de requerer à contraparte, pode, em vez de exigir o dobro do sinal ou de requerer a execução específica, reclamar o valor da coisa (ou o direito a transmitir ou a constituir sobre ela), “determinado objectivamente, à data do não cumprimento da promessa, com dedução do preço convencionado, devendo ainda ser-lhe restituído o sinal e a parte do preço que tenha pago” (art. 442º/2, 2ª parte CC);
e) Sempre que o contraente não faltoso opte pelo valor da coisa, nos termos referidos, a outra parte pode “opor-se ao exercício dessa faculdade, oferecendo-se para cumprir a promessa, salvo o disposto no art. 808º” (art. 442º/3, 2ª parte CC).

59. Execução específica
O art. 830º/1 CC, estabelece que aquele que tiver direito à celebração de um contrato e vir insatisfeito esse direito pela contraparte, pode requerer ao Tribunal, requerendo deste a emissão de uma sentença que produza os mesmos efeitos da declaração negocial do faltoso.
A execução específica do contrato-promessa sem eficácia real, nos termos do art. 830º CC, não é admitida no caso de impossibilidade de cumprimento por um promitente vendedor haver transmitido o seu direito real sobre a coisa objecto do contrato prometido antes de registada a acção de execução específica, ainda que o terceiro adquirente não haja obtido registo da aquisição antes do registo da acção; o registo da acção não confere eficácia real à promessa.
Para se obter sentença nos termos do art. 830º CC, que produza efeitos de declaração negocial faltosa, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Não ser incompatível com a substituição da declaração negocial a natureza da obrigação assumida pela promessa;
b) Não existir convenção em contrário
c) Haver incumprimento por parte do demandado.
O art. 830º, tornou o direito à execução específica, um efeito necessário e automático (sem necessidade de estipulação) do contrato-promessa mas, restrito à promessa de compra e venda de edifícios ou fracções autónomas de edifícios para habitação própria. A possibilidade de execução específica só é de excluir se a ela se quiser a natureza da obrigação assumida. Em princípio o direito de execução específica vale só entre as partes, não podendo ser exercido contra terceiro a quem o promitente tenha, entretanto, alienado a coisa, já assim não ocorre se ao contrato tiver sido atribuído eficácia real.
O art. 830º/2, tem carácter dispositivo ou supletivo, não torna imperativa a execução específica, às partes é admissível excluir a execução específica, salvo se em consequência das regras gerais, a convenção de exclusão não for juridicamente válida. A existência de sinal não faz presumir convenção contrária à execução específica salvo se se depender a vontade de excluir o direito de tal execução.
O pressuposto da execução específica é a mora e não o incumprimento definitivo. A regra geral da execução específica é supletiva, podendo as partes afastá-la por convenção expressa ou tácita. A existência de sinal no contrato-promessa faz presumir – presunção iuris tantum – convenção contrária à execução específica. O direito à execução específica não pode ser afastado pelas partes, art. 830º/3 CC, a que se refere o art. 410º/3 CC, não valendo, portanto, qualquer convenção em contrário, expressa ou tácita. A regra contida na 2ª parte do art. 830º/3 CC, é geral e existe também ns.º casos abrangido pelo art. 830º/1 CC, sempre que a execução específica seja validamente pedida e a alteração das circunstâncias seja anterior à mora ou atraso no cumprimento – art. 438º CC.
A excepção do não cumprimento do contrato (art. 830º/5 CC) não é de conhecimento ofícios. Porém, uma vez deduzida, antes de mais, averiguar se essa excepção se mostra ou não procedente, o que pode exigir a produção de prova na altura própria. Caso a excepção proceda, o juiz deverá tornar a execução específica dependente da consignação em depósito da contra prestação cuja falta se demonstre. Mas a fixação do prazo que, para tanto, a lei comete ao juiz ocorrerá tão-só na decisão final que decrete a execução específica.

60. Violação do contrato-promessa
Se, em lugar de se recusar apenas a cumprir, o promitente violar definitivamente a promessa, impossibilitando o seu comportamento, quid juris?
A sanção varia consoante a eficácia relativa ou absoluta da promessa.
A contraparte apenas poderá exigir indemnização dos danos provenientes do não cumprimento (no primeiro caso). Se houver cláusula penal ou sinal passado, o montante da indemnização é dado pela pena fixada ou pela substância ou o valor do sinal, consoante os casos (arts. 811º e 442º/2 e 3 CC).
Se tiver havido tradição da coisa, apesar de o contrato-promessa não gozar de eficácia real, e houver sinal passado, terá o promitente faltoso direito ainda à segunda das sanções previstas, em alternativa, no art. 442º/2 CC.
Mesmo que a perda ou a restituição em dobro do sinal se afigurem sanções excessivas, não pode o julgador reduzir a sanção, com base em razões de equidade. Ao invés do que ocorre com a cláusula penal (art. 812º CC), a lei não reconhece ao julgador tal faculdade quanto ao sinal. E não há entre as duas situações a analogia capaz de justificar a aplicação do disposto no art. 812º CC.
Tendo a promessa eficácia real, nos termos do art. 413º CC, o direito da contraparte é oponível a terceiro adquirente, cujo direito se não ache registado antes do registo do contrato-promessa. E haverá lugar à execução específica, tendo o contrato-promessa eficácia real, mesmo que haja sinal passado ou convenção de cláusula penal. Cumprindo, ainda que judicialmente, o contrato-promessa, se este for uma promessa de venda feita a terceiro passará a ser tratada como venda de bens alheios, atenta a ineficácia da venda após o registo da promessa com eficácia erga omnes. Nada obsta a que, tendo o adquirente que ser demandado para a acção de execução específica, o credor da promessa requeria desde logo, como pedido cumulativo, a declaração de nulidade da alienação efectuada pelo promitente faltoso e a consequente entrega da coisa. Se a promessa for antes da hipoteca de bens, a hipoteca feita a favor de terceiro cederá o grau da sua prioridade à constituída, a favor da contraparte, com base naquela promessa.


PACTOS DE PREFERÊNCIA

61. Noção
São os contratos pelos quais alguém assume a obrigação de, em igualdade de condições escolher determinada pessoa como seu contraente, no caso de se decidir a celebrar determinado negócio.
Os pactos de preferência [14] não têm apenas por objecto a compra e venda mas também outros contratos, como o arrendamento, o aluguer, o contrato de fornecimento, a sociedade de parceria, etc. De modo geral, pode dizer-se que os pactos de preferência são admitidos em relação à compra e venda (art. 414º CC) e relativamente a todos os contratos onerosos em que tenha sentido a opção por certa pessoa sobre quaisquer outros concorrentes (art. 423º CC).
Dar preferência, significa escolher preferencialmente para contraparte no contrato, a pessoa do credor no pacto de preferência, desde que esse sujeito se disponha a celebrar contrato que é o objecto da preferência, tanto por tanto, seja, em igualdade de condições com aquelas que são oferecidas ao obrigado à preferência por um qualquer terceiro.
A obrigação de dar preferência pode ser assumida em quaisquer circunstâncias; não depende, necessariamente, dum contrato de compra e venda. E a lei admite mesmo (art. 2235º CC) que essa obrigação seja imposta pelo testador ou legatário, independentemente, portanto, de um pacto.
A obrigação de dar preferência não importa a obrigação de realizar o negócio a que a mesma respeita, como sucede no contrato-promessa (art. 410º CC). A vinculação assumida pelo obrigado à preferência é condicional: se contratar, ele promete preferir certa pessoa a qualquer outro interessado.
Ao lado da preferência de origem negocial, há direito legais de preferência (que são direitos reais de aquisição), destinados a facilitar, na maioria dos casos, a extinção de situações que a facilitar, na maioria dos casos, a extinção de situações que não são as mais consentâneas da boa exploração económica dos bens (arts 1409º e 2130º; 1535º e 1555º/1; 1830º, etc. CC).

62. Requisitos e efeitos
Valem para os pactos de preferência, como verdadeiros contratos que são, as regras estabelecidas na Parte Geral do Código Civil sobre os requisitos de validade dos negócios jurídicos.
Quanto à forma, se a preferência respeita o contrato para cuja celebração a lei exija documento, como seja a venda de bens imóveis, o pacto de preferência só é válido se constar de documento escrito, assinado pelo obrigado.
O pacto de preferência apenas possui, em regra, eficácia obrigatória ou relativa, não sendo o seu titular chamado sequer a exercer o direito nos processos de execução, falência, insolvência, etc., nem procedendo a preferência contra alienação efectuada nos processos desta natureza.

63. Acção de preferência (art. 1410º CC)
Recorrendo à acção de preferência, o titular lesado tem a faculdade de haver para si a coisa alienada, contanto que o requeira no prazo de seis meses a contar da data em que teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação e deposite judicialmente o objecto da prestação que lhe cumpre efectuar. Se a alienação efectuada com violação da preferência tiver sido procedida da promessa de venda ao adquirente, o prazo (de seis meses) de propositura da acção conta-se a partir do conhecimento dos elementos essenciais da venda, e não da promessa de alienação, embora esta já possa servir de objecto à acção de preferência. Se o alienante não se tiver reservado ou a lei não lhe conceder o direito de arrependimento.
A acção de preferência está prevista (art. 1410º CC) a propósito de um direito legal de preferência: o direito legal de preferência do comproprietário na venda da quota de qualquer dos outros comproprietários. Mas este instrumento (acção de preferência) é aplicável a todos os direitos legais de preferência que para aqui remetem, e também aos direitos convencionais de preferência com eficácia real, nos termos do art. 421º/2 CC.
A acção de preferência é pois um instrumento de que pode socorrer-se o preferente legal, ou o preferente convencional com eficácia real, cujo direito foi violado pelo obrigado.
Para que se possa exercer a acção de preferência:
- Não basta que o obrigado à preferência tenha dito que quer celebrar o contrato numas dadas condições e depois venha a dizer que já não quer;
- Não basta que o obrigado à preferência tenha celebrado um contrato-promessa do contrato que era objecto da preferência de um terceiro;
- É indispensável que o obrigado tenha efectivamente impossibilitado o cumprimento da obrigação, isto é, tenha celebrado com terceiro o contrato que era objecto de preferência;
- Para a acção ser admissível e ter provimento, é indispensável que o contrato entre o obrigado e o terceiro fosse um contrato válido.
Sempre que o obrigado à preferência projecte vender ou dar em cumprimento a coisa sujeita à prelação, a lei impõe-lhe, sucessivamente, os seguintes deveres:
• O dever de notificar o preferente, o projecto de alienação e as cláusulas essências do contrato a realizar (arts 416º e 1410º/1 CC);
• O dever de não efectivar o projecto de alienação enquanto o preferente não declarar, dentro do prazo em que lhe é lícito fazê-lo (art. 416º/2 CC), se pretende ou não preferir;
• O dever de realizar o contrato com o preferente, se este, em resposta à notificação, manifestar a vontade de exercer o seu direito.
[14] É um contrato pelo qual alguém se obriga a dar a outrem preferência na venda de determinado bem (art. 414º - 423º CC).
CONTRATOS TIPIFICADOS

64. Compra e venda (art. 874º e segs. CC) [15]
Do art. 874º CC, resulta claramente a atribuição de natureza real, e não apenas obrigacional, ao contrato de compra e venda o que resulta também do art. 879º-a CC.
Dos próprios termos da definição – que alude à transmissão de propriedade ao outro direito – se depreende, porém, que a compra e venda continua a ser o instrumento jurídico da troca de bens – e não da troca da prestação de serviços.
Tem por objecto essencial a transmissão de um direito, que, para ser transmitido, necessita de existir previamente como tal, na titularidade do vendedor, a compra e venda não se confunde com o contrato de empreitada (art. 1207º CC).

65. Doação (art. 940º e segs. CC) [16]
São três os requisitos exigidos no art. 940º CC, para que exista uma doação:
a) Disposição gratuita de certos bens, ou assunção de uma dívida, em benefício do donatário, a atribuição patrimonial sem correspectivo;
b) Diminuição do património do doador;
c) Espírito de liberdade.
Forçoso é, para haver doação, que a atribuição patrimonial seja gratuita, e que não exista, portanto um correspectivo de natureza patrimonial. Pode existir, entretanto, um correspectivo de natureza moral, sem que o acto para a sua gratuitidade, assim como podem existir encargos impostos ao donatário (cláusulas modais), que limitem o valor da liberalidade (art. 963º CC).

66. Sociedade (arts. 980º e segs. CC) [17]
O art. 980º, não dá uma definição de sociedade, mais do contrato de sociedade. A origem necessariamente contratual da sociedade reflecte-se no regime do acto jurídico que dá lugar à sua constituição, são três os requisitos essenciais do contrato de sociedade:
• A contribuição dos sócios;
• O exercício em comum de certa actividade económica que não seja de mera fruição;
• E a repartição dos lucros.
A sociedade tem sempre por objecto a repartição dos lucros, não bastando que os sócios lucrem directamente através da actividade em comum.
Às sociedades são aplicáveis subsidiariamente, as disposições que regulam as pessoas colectivas, quando a analogia das situações o justifique (art. 157º CC).

67. Locação (art. 1022º segs. CC) [18]
O contrato de locação é puramente consensual, não tendo, por conseguinte, carácter real quod constitutionem.
É oneroso e tem efeitos duradouros (porquanto dele nasce uma relação – a relação locativa – que tem, de um lado, uma prestação continuada – a do locador – e, do outro, uma prestação periódica ou reiterada – a do locatário).

68. Parceria pecuária (art. 1121º segs. CC) [19]
Os sujeitos deste contrato têm as designações de parceiro proprietário e parceiro pensador (art. 1123º e 1127º CC). A lei não impede que as posições atribuídas neste artigo, quer ao parceiro proprietário quer ao parceiro pensador, sejam exercidas, em parte, pelo outro contraente.

69. Comodato (arts 1129º e segs. CC) [20]
É por sua natureza real quod constitutionem – no sentido de que só se completa pela entrega da coisa. A lei diz intencionalmente que o comodato é o contrato pelo qual uma das partes entrega…certa coisa, e não pelo qual se obriga a entregar.
O comodato é um contrato gratuito, onde não há por conseguinte, a cargo do comodatário, prestações que constituam o equivalente ou o correspectivo da atribuição efectuada pelo comodante. Nenhuma das obrigações discriminadas no art. 1135º CC, está realmente ligada a esta atribuição pelo nexo próprio do sinalagma ou mesmo dos contratos onerosos.
O objecto do comodato há-de ser certa coisa, móvel ou imóvel, e portanto, uma coisa não fungível, dada a obrigação imposta ao comodatário de restituir.

70. Mútuo (arts. 1142º segs. CC) [21]
O mútuo implica a transferência da propriedade, não porque a função do contrato se dirija a esse fim, mas porque a traslatio dominii é indispensável – como meio ou instrumento jurídico – de obtenção do gozo da coisa que se visa proporcionar ao mutuário, dada a natureza fungível dela. Implicando o contrato de mútuo a transferência da propriedade da coisa.
O contrato de mútuo (gratuito) é tal, como o comodato, um contrato unilateral sobre a obrigação de restituir imposta ao mutuário.
O mútuo tem naturalmente por objecto o dinheiro, mas pode recair sobre outras coisas, desde que sejam fungíveis.

71. Contrato de trabalho (art. 1152º CC)
Contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta.

72. Prestação de serviços (art. 1154º CC)
Contrato de prestação de serviço é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.
O mandato, o depósito e a empreitada, regulados nos capítulos subsequentes, são modalidades do contrato de prestação de serviço.

73. Mandato (art. 1157º segs. CC)
Mandato é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra.
O mandato presume-se gratuito, excepto se tiver por objecto actos que o mandatário pratique por profissão; neste caso, presume-se oneroso.
Se o mandato for oneroso, a medida da retribuição, não havendo ajuste entre as partes, é determinada pelas tarifas profissionais; na falta destas, pelos usos; e, na falta de umas e outros, por juízos de equidade.
O mandatário é obrigado:
a) A praticar os actos compreendidos no mandato, segundo as instruções do mandante;
b) A prestar as informações que este lhe peça, relativas ao estado da gestão;
c) A comunicar ao mandante, com prontidão, a execução do mandato ou, se o não tiver executado, a razão por que assim procedeu;
d) A prestar contas, findo o mandato ou quando o mandante as exigir;
e) A entregar ao mandante o que recebeu em execução do mandato ou no exercício deste, se o não despendeu normalmente no cumprimento do contrato.
O mandato é livremente revogável por qualquer das partes, não obstante convenção em contrário ou renúncia ao direito de revogação.
Se, porém, o mandato tiver sido conferido também no interesse do mandatário ou de terceiro, não pode ser revogado pelo mandante sem acordo do interessado, salvo ocorrendo justa causa.
O mandato caduca:
a) Por morte ou interdição do mandante ou do mandatário;
b) Por inabilitação do mandante, se o mandato tiver por objecto actos que não possam ser praticados sem intervenção do curador.
Salvo estipulação em contrário, o mandatário não é responsável pela falta de cumprimento das obrigações assumidas pelas pessoas com quem haja contratado, a não ser que no momento da celebração do contrato conhecesse ou devesse conhecer a insolvência delas.

74. Depósito (art. 1185º segs. CC)
Depósito é o contrato pelo qual uma das partes entrega à outra uma coisa, móvel ou imóvel, para que a guarde, e a restitua quando for exigida.
É aplicável ao depósito o disposto no artigo 1158.º [22]
O depositário é obrigado:
a) A guardar a coisa depositada;
b) A avisar imediatamente o depositante, quando saiba que algum perigo ameaça a coisa ou que terceiro se arroga direitos em relação a ela, desde que o facto seja desconhecido do depositante;
c) A restituir a coisa com os seus frutos.
O depositário pode guardar a coisa de modo diverso do convencionado, quando haja razões para supor que o depositante aprovaria a alteração, se conhecesse as circunstâncias que a fundamentam; mas deve participar-lhe a mudança logo que a comunicação seja possível.
O depositário não pode recusar a restituição ao depositante com o fundamento de que este não é proprietário da coisa nem tem sobre ela outro direito.
Se, porém, for proposta por terceiro acção de reivindicação contra o depositário, este, enquanto não for julgada definitivamente a acção, só pode liberar-se da obrigação de restituir consignando em depósito a coisa.
Se chegar ao conhecimento do depositário que a coisa provém de crime, deve participar imediatamente o depósito à pessoa a quem foi subtraída ou, não sabendo quem é, ao Ministério Público; e só poderá restituir a coisa ao depositante se dentro de quinze dias, contados da participação, ela não lhe for reclamada por quem de direito.
75. Empreitada (art. 1207º segs. CC)
Empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço.
Essencial para que haja empreitada é que o contrato tenha por objecto a realização de uma obra e não um serviço pessoal.
Os sujeitos do contrato de empreitada têm as designações legais de empreiteiro e de dono da obra.

76. Renda perpétua (art. 1231º segs. CC)
Contrato de renda perpétua é aquele em que uma pessoa aliena em favor de outra certa soma de dinheiro, ou qualquer outra coisa móvel ou imóvel, ou um direito, e a segunda se obriga, sem limite de tempo, a pagar, como renda, determinada quantia em dinheiro ou outra coisa fungível.
Como elementos do contrato, exige o art. 1231º CC, que haja, por parte de um dos contraentes, a transferência de certa soma de dinheiro ou qualquer outra coisa móvel ou imóvel, ou um direito, e que o adquirente se obrigue a pagar, como renda, determinada quantia em dinheiro ou outra coisa fungível.
A renda perpétua só é válida se for constituída por escritura pública. O devedor da renda é obrigado a caucionar o cumprimento da obrigação.
Ao beneficiário da renda é permitido resolver o contrato, quando o devedor se constitua em mora quanto às prestações correspondentes a dois anos, ou se verifique algum dos casos previstos no artigo 780º CC.
O devedor pode a todo o tempo remir a renda, mediante o pagamento da importância em dinheiro que represente a capitalização da mesma, a taxa legal de juros.
O direito de remissão e irrenunciável, mas é lícito estipular-se que não possa ser exercido em vida do primeiro beneficiário ou dentro de certo prazo não superior a vinte anos.

77. Renda vitalícia (art. 1238º segs. CC)
Contrato de renda vitalícia é aquele em que uma pessoa aliena em favor de outra certa soma de dinheiro, ou qualquer outra coisa móvel ou imóvel, ou um direito, e a segunda se obriga a pagar certa quantia em dinheiro ou outra coisa fungível durante a vida do alienante ou de terceiro.
Sem prejuízo da aplicação das regras especiais de forma quanto à alienação da coisa ou do direito, a renda vitalícia deve ser constituída por documento escrito, sendo necessária escritura pública se a coisa ou o direito alienado for de valor igual ou superior a 20 000 euros.
A renda pode ser convencionada por uma ou duas vidas.
Ao beneficiário da renda vitalícia é lícito resolver o contrato nos mesmos termos em que é permitida a resolução da renda perpétua ao respectivo beneficiário.

78. Jogo e aposta (art. 1245º CC)
O jogo e a aposta não são contratos válidos nem constituem fonte de obrigações civis; porém, quando lícitos, são fonte de obrigações naturais, excepto se neles concorrer qualquer outro motivo de nulidade ou anulabilidade, nos termos gerais de direito, ou se houver fraude do credor na sua execução.
O jogo e aposta, mesmo quando lícitos, não são contratos válidos nem, portanto, fonte de obrigações civis. Os jogos lícitos, são porém, fonte de obrigações naturais, sendo aplicável a estas obrigações o disposto no art. 402º [23] e segs. CC. Quer isto dizer, no essencial, que não é judicialmente exigível o cumprimento das obrigações emergentes dos jogos lícitos, mas que, na hipótese de o devedor cumprir espontaneamente, já lhe não será permitido exigir a repetição do indevido. A atribuição por ele efectuada em tais circunstâncias é juridicamente reconhecida como incumprimento de um dever social.

79. Transacção (art. 1248º segs. CC)
Transacção é o contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante recíprocas concessões.
O fim do contrato é prevenir ou terminar um litígio. Admite portanto, a lei que a transacção tenha lugar, não só estando a causa pendente, mas também antes da proposição da acção judicial, trata-se neste caso, da transacção chamada preventiva ou extra judicial a que se refere o art. 1250º CC. A transacção tem por objecto recíprocas concessões.
A transacção preventiva ou extrajudicial constará de escritura pública quando dela possa derivar algum efeito para o qual a escritura seja exigida, e constará de documento escrito nos casos restantes.
As partes não podem transigir sobre direitos de que lhes não é permitido dispor, nem sobre questões respeitantes a negócios jurídicos ilícitos.

NEGÓCIOS UNILATERAIS

80. Introdução
Vigora o princípio de que o negócio unilateral só é reconhecido como fonte de obrigações nos casos previstos na lei, sendo o contrato, consequentemente, a fonte normal das obrigações ex negotio.
O art. 457º CC, afirma que “a promessa unilateral de uma prestação só obriga nos casos previstos na lei”.
Em regra, portanto, fora dos casos em, que a obrigação nasce directamente da lei, para que haja o dever de prestar e o correlativo poder de exigir a prestação é necessário o acordo (contrato) entre o devedor e o credor. A esta ideia se tem dado o nome de princípio de contrato, não é razoável (fora dos casos especiais previstos na lei) manter alguém irrevogavelmente obrigado perante outrem, com base numa simples declaração unilateral de vontade, visto não haver conveniências práticas do tráfico que o exijam, nem quaisquer expectativas do beneficiário de graus de tutela, anteriormente à aceitação quer a lei cumpre salvaguardar.
O negócio jurídico unilateral é na sua estrutura sempre unilateral, isto é, composto por uma única declaração de vontade ou um conjunto de declarações de vontades, tidas com o mesmo sentido. Apenas intervêm, um sujeito jurídico, ou podem intervir vários sujeitos jurídicos cujas declarações são paralelas; são declarações que têm o mesmo conteúdo e, portanto, há apenas uma parte.
Há dois casos, que não são fontes de obrigações, embora venham previstos nesta secção: a promessa de cumprimento, e o reconhecimento de dívida (art. 458º [24] CC).
A lei admite que através do acto unilateral se efectue a promessa de uma prestação ou reconhecimento de uma dívida sem que o devedor indique o fim jurídico que o leva a obrigar-se, presumindo-se a existência e a validade da relação fundamental. Mas, trata-se de uma simples presunção cuja prova em contrário, produzirá as consequências próprias da falta de licitude ou da imortalidade da causa dos negócios jurídicos. Trata-se de negócios causais apenas se dando uma inversão no ónus da prova.
A existência destes negócios serve apenas para dispensar o credor de provar a fonte da obrigação: presume-se que a fonte existe, até que o devedor prove que não existe.
A promessa de cumprimento e o reconhecimento de dívida têm que constar de documento escrito, salvo se para a prova da fonte fosse necessário um documento de força probatória superior.
Mas, existem alguns negócios jurídicos unilaterais que são fontes de obrigações: a promessa pública, e o concurso público.

81. A promessa unilateral
Diz-se promessa pública, a declaração feita mediante anúncio divulgado entre os interessados, na qual o autor se obriga a dar uma recompensa ou gratificação a quem se encontre em determinada situação ou pratica certo facto (positivo ou negativo) – art. 459º CC.
O autor do negócio fica obrigado à prestação logo que haja alguém que se encontre na situação prevista – tenha praticado ou deixar de praticar o facto – mesmo que esse alguém, credor dele, não saiba que existe a promessa pública.
É uma declaração negocial receptícia, tem como destinatário um sujeito indeterminado, mas determinável. O art. 460º [25] CC, determina que:
- Se a promessa tiver prazo ela dura enquanto se mantiver o prazo;
- Se não tiver prazo, pode ter um termo imposto pela natureza ou pelos fins da promessa e também caducará findo esse período.
A promessa pública, como negócio unilateral que é, não se identifica com as ofertas ao público a que se refere o art. 230º CC. Estas são propostas negociais que, fazendo parte de um contrato in itinere ou em mera expectativa, só se aperfeiçoam com a aceitação de outra parte, que completa o ciclo da formação contratual.

82. Concurso público
É um negócio unilateral pelo qual alguém promete um prémio a quem realizar certas provas que se encontram discriminadas no concurso.
O concurso público (art. 463º CC) é um negócio jurídico unilateral feito por anúncio público; dele deve constar:
- Prazo para apresentação dos concorrentes;
- A prova do concurso;
- O prémio do concurso
Não tem que forçosamente constar do concurso público a designação das pessoas que vão proceder à selecção dos concorrentes para atribuição do prémio final. Se o anúncio público não contiver essa indicação, a decisão de concessão do prémio cabe ao autor do concurso público.

GESTÃO DE NEGÓCIOS

83. Noção
À intervenção, não autorizada, das pessoas na direcção de negócio alheio, feita no interesse e por conta do respectivo dono, dá-se o nome de gestão de negócios (art. 464º [26] CC).
A gestão de negócios é uma situação em que um sujeito assume a condução, a gestão, de um assunto de outrem, no interesse desse a outrem e sem autorização dele.
Para além disso, é preciso que a condução desse assunto alheio seja feita também por conta do titular do interesse que está a ser gerido pelo sujeito que assume a condução dele.

84. Requisitos
Para que haja gestão de negócios são necessários os seguintes requisitos [27]:
a) Direcção de negócio alheio
A actuação do gestor tanto pode concretizar-se na realização de negócios jurídicos em sentido estrito, como na prática de actos jurídicos não negociais ou até de simples factos materiais. Os actos jurídicos serão em regra, actos de mera administração, mas nada obsta, em princípio, a que se estenda a actos de verdadeira disposição.
b) Que o gestor actue no interesse e por conta do negócio alheio
Que a sua intervenção decorra intencionalmente em proveito alheio e não em exclusivo proveito próprio.
Se o gestor agir no seu exclusivo interesse, falta um requisito essencial ao espírito do instituto, que é o de estimular a intervenção útil nos negócios alheios carenciados de direcção.
Não basta que a actividade do agente se destine a satisfazer um interesse alheio, preenchendo uma necessidade de outra pessoa; é preciso ainda que ele aja por conta de outrem, ou seja, na intenção de transferir para a esfera jurídica de outrem os proveitos e encargos da sua intervenção, imputando-lhe os meios de que se serviu ou, pelo menos, os resultados obtidos.
c) Falta de autorização
A inexistência de qualquer relação jurídica entre o dono e o agente, que confira a este o direito ou lhe imponha o dever legal de se intrometer nos negócios daquele. Supõe, portanto, a falta de mandato, bem como a falta de poderes voluntários ou legais de representação ou administração
Os elementos os pressupostos da gestão de negócios são:
1) Assunção ou condução dum negócio alheio por alguém, ou seja, alienidade do negócio, carácter alheio do negócio que é gerido, dirigido ou conduzido pelo sujeito;
2) Condução do negócio no interesse do dono do negócio;
3) Direcção do negócio por conta do dono do negócio:
- Dirigir um negócio no interesse de outrem, corresponde a conduzir a gestão daquele assunto correspondentemente ao interesse do titular do assunto;
- Fazê-lo por conta de outrem, significa fazê-lo com a intenção de afectar os efeitos da gestão, totalmente, ao dono do negócio, isto é, de transmitir para o dono do negócio todos os efeitos negativos e positivos da gestão levada a cabo;
4) Ausência de autorização.

85. Deveres do gestor
São as obrigações do gestor em face do dono do negócio (art. 465º CC):
a) Continuação da gestão
Uma vez iniciada, ao agente já não é inteiramente livre de interrompê-la, quer pelas compreensíveis expectativas que a sua actuação é capaz de ter criado, quer pelo obstáculo que ela pode ter constituído para a intervenção de outras pessoas, dispostas a levar a gestão a bom termo. A lei não impõe ao gestor, de modo directo, o dever de prosseguir a gestão iniciada, mas responsabiliza-o pelos danos que resultarem da injustificada interrupção dela (art. 466º/1 CC).
b) Dever de fidelidade ao interesse e à vontade (real ou presumível) do dono do negócio
O gestor responde ainda, pelos danos que causar, por culpa sua, no exercício da gestão, e a sua actuação considera-se culposa, sempre que agir em desconformidade com o interesses ou a sua vontade, real ou presumível, do dono do negócio (art. 466º CC). É a consagração prática, indirecta do principal dever que põe a cargo do gestor (art. 465º-a CC).
O dever de obediência simultânea ao interesse e à vontade do dono tanto vale para os termos em que a gestão deve ser iniciada ou tem cabimento legal, como para a forma por que deve ser exercida.
A actuação do gestor será regular (isenta de culpa), se ele pratica um acto contrário à vontade (real ou presumível) do dono do negócio, mas conforme ao interesse deste, desde que a conduta (omissão), desejada pelo dominus seja contrária à lei ou à ordem pública, ou ofensiva dos bons costumes.
A conduta do gestor será igualmente regular, se ele omitir o acto ilícito que o dono praticaria e optar pelo acto lícito que mais favorece os seus interesses.
O gestor deve abster-se de todos os actos que saiba ou presuma serem contrário à vontade real ou presumível do dono, por mais favorável que fundadamente os julgue às conveniências do interessado. Como deve igualmente renunciar aos actos que o dono não deixaria de praticar, se tiver razões para considerar lesivos dos interesses em causa.
c) Entrega dos valores detidos e prestação de contas (art. 465º-e CC)
As contas devem ser prestadas, logo que a gestão finda ou é interrompida, ou quando o dono as exigir, podendo a prestação ser feita coactiva ou espontaneamente.
d) Aviso e informação do dono do negócio
Ao gestor impõe-se o dever de avisar o dono do negócio logo que tenha possibilidade de fazê-lo, de que assumiu a gestão, para que ele possa prover como melhor entender; e ainda a obrigação de lhe prestar todas as informações relativas à gestão, para que o interessado possa acompanhar a evolução desta e tomar oportunamente as providências que o caso requeira.

86. Deveres do dono do negócio
Desde que a gestão seja regular, isto é, não tenha havido infracção das obrigações impedientes sobre o gestor designadamente da obrigação de actuação conforme ao interesse e à vontade do dominus. Neste caso de regularidade da gestão, o dono do negócio é obrigado (art. 468º/1 CC) a reembolsar o gestor de todas as despesas que ele, fundadamente, tenha considerado indispensáveis, com os juros legais, contratados do momento em que as despesas foram feitas e até ao momento em que o reembolso se verifica.
Ø Obrigação de reembolso de despesas: são todas e apenas aquelas despesas que ele tenha considerado indispensáveis com fundamento, desde que a situação objectivamente justificasse o juízo de indisponibilidade. A essas despesas acresce a obrigação de pagamento dos juros legais, correspondentes ao montante de tais despesas.
Ø A obrigação de indemnização: a obrigação de reembolso só existe quando houve despesas feitas pelo gestor só existe, se ele tiver sofrido prejuízos com a gestão: prejuízos que podem ser de natureza patrimonial ou de natureza não patrimonial.
Ø Obrigação de remuneração do gestor: esta depende de a actividade desenvolvida pelo gestor corresponder à sua actividade profissional.
Uma vez que o dono do negócio tenha conhecimento da actividade gestória ele pode, em relação a essa actividade, tomar uma de três atitudes:
1º Pode aprovar a gestão;
2º Pode nada dizer;
3º Pode desaprovar a gestão.

87. Aprovação
É uma declaração negocial dirigida pelo dominus ao gestor, declaração que não tem de ser expressa, pode ser tácita, cujo conteúdo é um juízo de concordância global com a actividade genérica.
Tem como efeitos jurídicos (art. 469º CC):
- A renúncia por parte do dominus a qualquer direito indemnizatório que ele tivesse, ou pudesse ter, contra o gestor, por incumprimento culposo e danoso das obrigações do gestor;
- Reconhecimento, por parte do dominus, ao gestor dos direitos de reembolso de despesas, juros legais e direito de indemnização pelos danos causados (art. 468º/1, 1ª parte CC).
Se a gestão não for regular, se houver incumprimento de alguma obrigação por parte do gestor, designadamente a obrigação de se pautar pelo interesse e pela vontade do dominus, então o gestor apenas tem direito a ser restituído daquilo com que tenha empobrecido, por parte do dominus, nos termos do enriquecimento sem causa (art. 468º/2 CC).
Diversamente da aprovação, pode o dominus ratificar os actos jurídicos praticados pelo gestor no exercício da gestão, se ele, gestor os praticou representativamente.
Se o gestor agiu em seu próprio nome, isto é, não comunicou ao terceiro com quem celebrou os negócios, que estes não eram dele, não eram para ele e tudo se passou como se ele fosse titular do interesse que o negócio visava satisfazer, então tem-se uma gestão não representativa, ele actuou em nome próprio.
Mas o gestor pode ter comunicado ao terceiro que estava a actuar em nome e por conta de outrem e aí tem-se uma gestão representativa.
A representação, é a situação em que alguém actua, realizando actos ou negócios jurídicos, em nome de outrem. O representante pode ter ou não ter poderes.
A ratificação, é um negócio jurídico unilateral, pelo qual o representado por outrem que não tinha poderes de representação, lhos atribui a posteriori com eficácia retroactiva.
Se a gestão se consubstanciou em actos jurídicos e foi exercida em seu próprio nome, então o regime aplicável às relações com terceiros é o regime de mandato [28] sem representação (art. 471º CC).

88. Responsabilidade do gestor (art. 466º CC)
A obrigação infringida que, por ter causado danos, obriga a indemnizar, é a de não interromper uma gestão que já foi iniciada, sem fundamento que o justifique, ou seja:
- O gestor pode interromper a gestão se houver um motivo de força maior, que o impeça de continuar a gestão;
- Pode naturalmente, interromper a gestão logo que o dominus surja e esteja em condições de assumir ele próprio a condução do assunto;
Fora estas situações ele não pode interromper a gestão, e se o fizer, pelo incumprimento da obrigação, responderá civilmente face ao dono do negócio pelos danos que lhe causar.
A responsabilidade dos danos existe (art. 466º/1 CC), não só quando, culposamente, se causar um prejuízo na execução da gestão mas quando iniciada esta, se causar, também por culpa do gestor, prejuízo em consequência da sua interpretação.

ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA

89. Requisitos
Para que haja enriquecimento sem causa (arts. 473º segs. CC) é preciso que haja uma deslocação patrimonial, isto é, que haja uma transferência patrimonial do património de alguém para o património de alguém para o património de outrem.
Para que se aplique o regime do enriquecimento sem causa, é preciso que a situação assim tipificada tenha ocorrido, mas é preciso mais: é preciso que não seja aplicável a essa situação um qualquer outro regime jurídico, ou que a lei não recuse a restituição do enriquecimento ao empobrecido.
O carácter subsidiário do instituto do enriquecimento sem causa, é condição de aplicabilidade nos termos referidos, existe quando a lei não atribui outros efeitos à deslocação patrimonial, quando não há outro regime aplicável, quando a lei não nega o direito à restituição daquilo que foi recebido pelo enriquecido.
A obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa ou locupletamento à custa alheia pressupõe a verificação cumulativa de três requisitos:
a) É necessário, que haja um enriquecimento;
b) O enriquecimento, contra o qual se reage, careça de causa justificativa;
c) A obrigação de restituir pressupõe, que o enriquecimento tenha sido obtido à custa de quem requerer a restituição.
Para que haja lugar à obrigação de restituir é necessário, ainda, que o enriquecimento tenha sido obtido imediatamente à custa daquele que se arroga o direito à restituição.
O enriquecimento sem causa, assim como dá lugar à obrigação de restituir no caso de a atribuição patrimonial se haver já consumado, também pode servir de fundamento a uma excepção contra o enriquecimento injusto, se a atribuição não tiver sido ainda realizada e for exigido o seu cumprimento

90. Requisitos [29]
a) É necessário que haja um enriquecimento
O enriquecimento consiste na obtenção de uma vantagem de carácter patrimonial, seja qual for a forma que essa vantagem revista, umas vezes a vantagem traduzir-se-á num aumento do activo patrimonial; outras, no uso ou consumo de coisa alheia ou no exercício de direito alheio, quando estes actos sejam susceptíveis de avaliação pecuniária, outras, ainda, na poupança de despesas.
b) A obrigação de restituir pressupõe, que o enriquecimento, contra o qual se reage, careça de causa justificativa – ou porque nunca a tenha tido ou porque, tendo-a inicialmente, entretanto a haja perdido.
A causa do enriquecimento varia consoante a natureza jurídica do acto que lhe serve de fonte.
Assim, sempre que o enriquecimento provenha de uma prestação, a sua causa é a relação jurídica que a prestação visa satisfazer.
Há, porém, muitos casos em que a situação de enriquecimento não provém de uma prestação do empobrecido ou de terceiro, nem de uma obrigação assumida por um outro, mas de um acto de intromissão do enriquecido em direitos ou bens jurídicos alheios ou de actos de outra natureza, porventura de actos puramente materiais.
c) A obrigação de restituir pressupõe, que o enriquecimento tenha sido obtido à custa de quem requerer a restituição
A correlação exigida por lei entre a situação dos dois sujeitos traduz-se, em regra, no facto de a vantagem patrimonial alcançada por um deles resultar do sacrifício económico correspondente suportado pelo outro. Ao enriquecimento injusto de uma pessoa corresponde o enriquecimento de outra.

91. Carácter subsidiário da obrigação de restituir
Num grande número de casos em que a deslocação patrimonial carece de causa justificativa, a lei faculta aos interessados meios específicos de reacção contra a dissolução.
Assim, quando a deslocação patrimonial assenta sobre um negócio jurídico e o negócio é nulo ou anulável, a própria declaração de nulidade ou anulação do acto devolve ao património de cada uma das partes os bens com que a outra se poderia enriquecer à sua custa (art. 289º/1 CC).
São diferentes, os efeitos das obrigações de restituir fundadas na invalidade do negócio e no enriquecimento sem causa (arts. 289º - 479º, 480º CC). À eficácia retroactiva da invalidade contrapõe-se o sentido não retroactivo, actualista, da correcção operada através do enriquecimento sem causa.

92. Consagração legal do princípio da subsidiariedade
Nos termos do art. 474º CC, a obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa, tem natureza subsidiária.
O carácter subsidiário da pretensão ao enriquecimento sem causa não significa, no entanto, que o respectivo regime só se aplique a casos omissos na lei, integradores da situação genericamente descrita no art. 473º CC. Há situações que a lei prevê e regula, remetendo expressamente para as normas do enriquecimento sem causa, por entender que a restituição nelas imposta se deve subordinar às regras próprias daquele instituto. Outras vezes, impondo a restituição, a lei não chega a dizer explicitamente em que termos se deve processar.

93. Repetição de indevido
Na fixação do regime do pagamento do indivíduo, a lei (art. 476º CC), distingue três hipóteses:
a) O cumprimento de obrigação inexistente (objectivamente indevido) – art. 476º CC;
b) O cumprimento de obrigação alheia, na convicção errónea de se tratar de dívida própria (subjectivamente indevido) – art. 477º CC;
c) O cumprimento de obrigação alheia, na convicção errónea de se estar vinculado, perante o devedor, ao cumprimento dela – art. 478º CC.
O art. 476º [30] CC, mostra que três requisitos são necessários, para que se possa exigir a repetição do indevido:
1) Que haja um acto de cumprimento, ou seja, uma prestação efectuada com a intenção de cumprir uma obrigação;
2) Que a obrigação não exista;
3) Que não haja sequer, por detrás do cumprimento um dever de ordem moral ou social, sancionada pela justiça que dê lugar a uma obrigação natural.

94. Objecto da obrigação de restituir (art. 479º CC)
O objecto é determinado em função de dois aspectos fundamentais:
1) Restituição medida pelo enriquecimento
O beneficiado não é obrigado a restituir todo o objecto da deslocação patrimonial operada. Deve restituir apenas aquilo com que efectivamente se acha enriquecido.
O locupletamento efectivo e actual que serve para determinar limite da obrigação de restituir (art. 479º/2, 480º CC), distingue-se da coisa ou valor obtido, num duplo aspecto.
Por um lado, no próprio momento da deslocação patrimonial, podem ser diferentes o valor objectivo da vantagem alcançada e o montante do efectivo enriquecimento que ela proporciona ao beneficiário.
Por outro lado, pode também haver diferença entre o enriquecimento do beneficiado à data da deslocação patrimonial e o enriquecimento actual referido no art. 480º CC.
2) …à custa do requerente
Além do limite baseado no enriquecimento (efectivo e actual) tem-se este limite fundado no empobrecimento do lesado
3) Agravamento da obrigação de restituir
O tratamento favorável do beneficiado, cessa logo, que o enriquecido seja citado para a restituição ou a partir do momento em que ele conheça a falta de causa do enriquecimento ou a falta do efeito que se pretendia obter com a prestação (art. 480º [31] CC).
O devedor passa então a responder pelo perecimento ou deterioração culposa da coisa, pelos frutos percipiendos que por sua culpa deixarem de ser produzidos e pelos juros legais das quantias a que o lesado tiver direito.

95. Prescrição do direito à restituição
O direito à restituição do que foi obtido sem justa causa está sujeito à prescrição de três anos, a contar da data em que lhe compete e da pessoa do responsável (art. 482º [32] CC).
O conhecimento do direito é sinónimo de conhecimento dos factos constitutivos do direito, com independência do conhecimento jurídico da existência do direito
O prazo de prescrição de três anos começa pois a contar quando o empobrecido sabe que se verificou a situação de que resultou o seu empobrecimento e o enriquecimento de outrem, conta a partir desse momento, se nesse momento ela já souber também quem é a pessoa do empobrecido.
Se ainda não souber, se não conhecer a identidade da pessoa que se enriqueceu, o prazo especial só começa a correr quando conhecer essa identidade.
Portanto, o início da contagem do prazo de três anos depende da verificação cumulativa destes dois conhecimentos:
- O conhecimento dos factos;
- O conhecimento da identidade da pessoa do enriquecido.
A partir daí inicia-se a contagem do prazo prescricional especial de três anos.
Mas, antes disso, começa a correr o prazo de vinte anos de prescrição ordinária. Esse prazo corre independentemente de pessoas do empobrecido. Esse prazo ordinário começa a correr a partir da deslocação patrimonial, não depende de conhecimento de nada por ninguém.

RESPONSABILIDADE CIVIL

96. Introdução
Trata-se da figura que, depois dos contratos, maior importância prática e teórica assume na criação dos vínculos obrigacionais, seja pela extraordinária frequência com que nos Tribunais são postas acções de responsabilidade, seja pela dificuldade especial de muitos dos problemas que o instituto tem suscitado na doutrina e na jurisprudência.
Na rubrica da responsabilidade civil, cabe tanto a responsabilidade proveniente da falta de cumprimento das obrigações emergentes dos contratos, de negócios unilaterais ou da lei (responsabilidade contratual), como a resultante da violação de direitos absolutos ou da prática de certos actos que, embora lícitos, causam prejuízo a outrem (responsabilidade extra-contratual).
Sob vários aspectos, responsabilidade contratual e responsabilidade extra-contratual funcionam como verdadeiros vasos comunicantes.
Por um lado, elas podem nascer do mesmo facto e transitar-se facilmente do domínio de uma delas para a esfera normativa própria da outra.
Por outro lado, é bem possível que o mesmo acto envolva para o agente (ou o omitente), simultaneamente, responsabilidade contratual [33], e responsabilidade extra-contratual [34], tal como é possível que a mesma ocorrência acarrete para o autor, quer responsabilidade civil, quer responsabilidade criminal, consoante o prisma sob o qual a sua conduta seja observada.

97. Regime jurídico da responsabilidade civil
A expressão responsabilidade civil é ambígua porque dentro dela há que distinguir dois grandes sectores:
a) A responsabilidade obrigacional ou contratual: é aquela que resulta do incumprimento de direitos subjectivos de crédito, do incumprimento de obrigações em sentido técnico-jurídico;
b) Responsabilidade extra-obrigacional: extra-contratual, delitual ou aquiliana, está prevista e regulada nos arts. 483º segs. CC.
Nesta definição do quadro da responsabilidade civil em sentido amplo, é preciso ainda ter em conta que, quer no campo da responsabilidade extra-obrigacional, quer no campo da responsabilidade obrigacional, ainda há dois sub-sectores:
- Responsabilidade subjectiva, quando ela depende da existência de culpa do agente, de culpa do autor da lesão;
- Responsabilidade objectiva, quando o agente se constitui na obrigação de indemnizar independentemente de culpa.

RESPONSABILIDADE POR FACTOS ILÍCITOS

98. Pressupostos
A simples leitura do art. 483º/1 [35] CC, mostra que vários pressupostos condicionam, no caso da responsabilidade por factos ilícitos, a obrigação de indemnizar o lesante:
a) Facto (controlável pela vontade do homem);
b) Ilicitude;
c) Imputação do facto ao lesante;
d) Dano;
e) Um nexo de casualidade entre o facto e o dano.

99. Facto voluntário do lesante (a)
O elemento básico da responsabilidade do agente – um facto dominável ou controlável pela vontade, um comportamento ou uma forma de conduta humana – pois só quanto a factos dessa índole têm cabimento a ideia de ilicitude, o requisito da culpa e a obrigação de reparar o dano nos termos em que a lei a impõe.
Este facto consiste, em regra, num acto, numa acção, ou seja, num facto positivo, que importa a violação de um dever geral de abstenção, do dever de não ingerência na esfera de acção do titular do direito absoluto. Mas pode traduzir-se também num facto negativo, numa abstenção ou numa omissão (art. 486º CC).
Quando se alude a facto voluntário do agente, não se pretende restringir os factos humanos relevantes em matéria de responsabilidade dos actos queridos, ou seja, àqueles casos em que o agente tenha prefigurado mentalmente os efeitos do acto e tenha agido em vista deles.
O que está geralmente em causa, no domínio da responsabilidade civil, são puras acções de facto, praticadas sem nenhum intuito declarativo.

100. Ilicitude (b)
O Código Civil procurou fixar em termos mais precisos o conceito de ilicitude, descrevendo duas variantes, através das quais se pode relevar o carácter anti-jurídico ou ilícito.
1) Violação de um direito de outrem (art. 483º CC): os direitos subjectivos aqui abrangidos, são, principalmente, os direitos absolutos, nomeadamente os direitos sobre as coisas ou direitos reais, os direitos de personalidade, os direitos familiares e a propriedade intelectual.
2) Violação da lei que protege interesses alheios: trata-se da infracção das leis que, embora protejam um direito subjectivo a essa tutela; e de leis que, tendo também ou até principalmente em vista a protecção dos interesses colectivos, não deixam de atender aos interesses particulares subjacentes.
Além disso, a previsão da lei abrange ainda a violação das normas que visam prevenir, não a produção do dano em concreto, mas o simples perigo de dano em abstracto.
Para que o lesado tenha direito à indemnização, três requisitos se mostram indispensáveis:
1) Que a lesão dos interesses do particular corresponda a violação de uma norma legal;
2) Que a tutela dos interesses dos particulares figure, de facto, entre os fins da norma violada;
3) Que o dano se tenha registado no círculo de interesses privados que a lei visa tutelar.

101. O abuso do direito
Não se trata da violação de um direito de outrem, ou da ofensa a uma norma tuteladora de um interesse alheio, mas do exercício anormal do direito próprio. O exercício do direito em termos reprovados pela lei, ou seja, respeitando a estrutura formal do direito, mas violando a sua afectação substancial, funcional ou teleológica, é considerado como legítimo. Isso quer dizer que, havendo dano, o titular do direito pode ser condenado a indemnizar o lesado.
Há abuso de direito (art. 334º CC), sempre que o titular o exerce com manifesto excesso dos limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes, ou pelo fim económico ou social desse direito.
Com base no abuso de direito, o lesado pode requerer o exercício moderado, equilibrado, lógico, racional do direito que a lei confere a outrem; o que não pode é, com base no instituto, requerer que o direito não seja reconhecido ao titular, que este seja inteiramente despojado dele.

102. Factos ilícitos especialmente previstos na lei
Além das duas grandes directrizes de ordem geral fixadas no art. 483º CC, sobre o conceito de ilicitude, como pressuposto da responsabilidade civil, o Código Civil trata de modo especial alguns casos de factos anti-jurídicos:
a) Factos ofensivos do crédito ou bom-nome das pessoas (art. 484º [36] CC);
b) Conselhos, recomendações ou informações geradoras de danos (art. 485º [37] CC).

103. Causas justificativas do facto ou causas de exclusão da ilicitude
A violação do direito subjectivo de outrem ou da norma destinada a proteger interesses alheios constitui, em regra, um facto ilícito; mas pode suceder que a violação ou ofensa seja, coberta por alguma causa justificativa do facto de afastar a sua aparente ilicitude.
O acto do exercício de um direito, ainda que cause danos a outrem, é um acto lícito desde que o direito seja exercido em conformidade com a boa fé, com os bons costumes, com o fim económico e social do direito e respeitando as regras de compatibilização de direitos do art. 335º CC. Isto é, em todos os casos em que o titular do direito exerce regularmente o seu direito, ainda que prejudique outrem, normalmente não comete um acto ilícito.
Constituem causas de justificação as formas de tutela privada de direitos:
- Acção directa (art. 336º CC);
- Legítima defesa (art. 337º CC);
- Estado de necessidade (art. 339º CC).
Têm em comum algumas características:
a) Natureza preventiva: a lei admite excepcionalmente a autotutela de direitos, mas tipicamente com carácter preventivo, para evitar a violação de direitos e não para reagir à violação de direitos, não com carácter repressivo.
b) Carácter subsidiário: só é lícito actuar em acção directa, em legítima defesa ou em estado de necessidade quando não seja possível em tempo útil recorrer aos meios normais.
c) Princípio da proporcionalidade: o acto só é lícito na medida em que cause danos inferiores, previsivelmente inferiores àqueles que resultariam do acto que se pretende evitar.

104. Acção directa
É o recurso à força para realizar ou assegurar o próprio direito. (art. 336º CC). Para que a ela haja lugar, torna-se necessário a verificação dos seguintes requisitos:
a) Fundamento real: é necessário que o agente seja titular dum direito que procura realizar ou assegurar;
b) Necessidade: o recurso à força terá de ser indispensável, pela impossibilidade de recorrer em tempo útil aos meios coercivo normais, para evitar a inutilização prática do direito do agente;
c) Adequação: o agente não pode exceder o estritamente necessário para evitar o prejuízo;
d) Valor dos interesses em jogo: através da acção directa, não pode o agente sacrificar interesses superiores aos que visa realizar ou assegurar.

105. Legítima defesa
Consiste na reacção destinada a afastar a agressão actual e ilícita da pessoa ou do património, seja do agente ou de terceiro (art. 337º CC).
Como requisitos:
a) Agressão: que haja uma ofensa da pessoa ou dos bens de alguém;
b) Actualidade e ilicitude da agressão: que a agressão (contra a qual se reage) seja actual e contrária à lei;
c) Necessidade da reacção: que não seja viável nem eficaz o recurso aos meios normais;
d) Adequação: que haja certa proporcionalidade entre o prejuízo que se causa e aquele que se pretende evitar, de modo que o meio usado não provoque um dano manifestamente superior ao que se pretende afastar.

106. Estado de necessidade
É igualmente lícito o acto daquele que, para remover o perigo actual de um dano manifestamente superior, quer do agente, quer de terceiro destrói ou danifica coisa alheia (art. 339º CC).
O estado de necessidade consiste na situação de constrangimento em que age quem sacrifica coisa alheia, com o fim de afastar o perigo actual de um prejuízo manifestamente superior.
Consentimento do lesado (art. 340º CC), consiste na equiestância do titular à prática do acto que, sem ela, constituiria uma violação desse direito ou uma ofensa de uma norma tuteladora do respectivo interesse.

107. Nexo de imputação, do facto ao lesante – culpa (c)
Para que o facto ilícito gere responsabilidade, é necessário que o autor tenha agido com culpa. Não basta reconhecer que ele procedeu objectivamente mal. É preciso, nos termos do art. 483º CC, que a violação ilícita atenha sido praticada com dolo ou mera culpa. Agir com culpa, significa actuar em termos de conduta do agente merecer a reprovação ou censura do direito. E a conduta do lesante é reprovável, quando, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, se concluir que ele podia e devia agir de outro modo.
Fala-se em nexo de imputação para significar que não basta que o agente tenha praticado um facto voluntário, não basta que esse facto, tendo sido praticado voluntariamente seja ilícito, é preciso que ele possa ser imputado ao agente; e só é imputado ao agente quando o agente actuou culposamente.
A culpa em sentido amplo abrange duas sub-modalidades:
1. Culpa em sentido estrito, também designada por mera culpa ou negligência;
2. Dolo.
Há casos em que as pessoas não têm os requisitos para actuar culposamente. Para que uma pessoa seja susceptível do juízo de culpabilidade, é preciso que ela seja imputável; para lhe serem imputados actos é preciso que ela seja susceptível de imputação, que seja imputável ou tenha imputabilidade.

108. Imputabilidade
Diz-se imputável a pessoa com capacidade natural para prever os efeitos e medir o valor dos actos que pratica e para se determinar de harmonia com o juízo que faça acerca deles (art. 488º CC).
Ele caracteriza-se:
• Pela capacidade de entendimento mínimo que permite ao sujeito prever as consequências dos seus actos;
• E pelo mínimo de liberdade, que lhe permitia determinar-se.
É imputável o sujeito que tem o mínimo de inteligência para perceber alcance do acto que pratica e que tem liberdade de determinação, isto é, que é livre de decidir ou não de praticar o acto, é sito que se chama imputabilidade.
Pode dizer-se que para haver responsabilidade da pessoa inimputável é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Que haja um facto ilícito;
b) Que esse facto tenha causado danos a alguém;
c) Que o facto tenha sido praticado em condições de ser considerado culposo, reprovável, se nas mesmas condições tivesse sido praticado por pessoa imputável;
d) Que haja entre o facto e o dano o necessário nexo de causalidade;
e) Que a reparação do dono não possa ser obtida dos vigilantes do inimputável;
f) Que a equidade justifique a responsabilidade total ou parcial do autor, em face das circunstâncias concretas do caso.

109. Culpa
A culpa (art. 487º CC) exprime um juízo de reprovabilidade pessoal da conduta do agente: o lesante, em face das circunstâncias específicas do caso, devia e podia ter agido de outro modo. É um juízo que assenta no nexo existente entre o facto e a vontade do autor, e pode revestir duas formas distintas: o dolo e a negligencia ou mera culpa.
• Há dolo, quando o agente actuou por forma a aceitar, a admitir, as consequências ilícitas da sua conduta. Diz-se dolosa a conduta quando o agente, não tendo previsto as consequências danosas e ilícitas que do seu acto iriam resultar, não fez nada para as afastar, porque as admitiu.
• Há mera culpa, quando o agente actuou levianamente, imponderadamente, negligentemente, sem cuidado ou sem atenção, quando o agente, numa palavra, não empregou a diligência que o bom pai de família [38], colocado naquela situação, teria empregado.

110. Modalidades de culpa
A distinção entre dolo e a negligência, como modalidades de culpa, aparece logo referida na disposição que constitui a trave-mestra de toda a construção legislativa da responsabilidade civil (art. 483º/1 CC). O dolo aparece como modalidade mais grave da culpa, aquela em que a conduta do agente, pela mais estreita identificação estabelecida entre a vontade deste e o facto, se torna mais fortemente censurável. As modalidades de dolo são:
- Dolo directo, quando o agente actuou para obter a consequência ilícita danosa e a obteve; o agente actuou intencionalmente para o resultado ilícito;
- Dolo necessário, quando o agente não tinha como objectivo do seu comportamento o resultado ilícito, mas sabia que o seu comportamento ia ter como resultado necessário, inevitável, o ilícito;
- Dolo eventual, quando o agente prefigura a consequência ilícita e danosa como uma consequência possível do seu comportamento e não faz nada para a evitar.
Além do nexo, entre facto ilícito e a vontade do lesante, nexo que constitui o elemento volitivo ou emocional do dolo, este compreende ainda um outro elemento, de natureza intelectual. Para que haja dolo essencial o conhecimento das circunstâncias de facto que integram a violação do direito ou da norma tuteladora de interesses alheios e a consciência da ilicitude do facto.

111. Mera culpa ou negligência
Consiste na omissão da diligência exigível do agente.
Há culpa consciente, quando o agente representou a possibilidade da consequência ilícita danosa e só actuou porque se convenceu de infundada e megalómanamente que conseguiria evitar a produção dessa consequência.
Há culpa inconsciente, o agente não previu o resultado, não pensou nisso e ele ocorreu.
A mera culpa (consciente ou inconsciente) exprime, uma ligação da pessoa com o facto menos incisiva do que o dolo, mas ainda assim reprovável ou censurável. O grau de reprovação ou de censura será tanto maior quanto mais ampla for a possibilidade de a pessoa ter agido de outro modo, e mais forte ou intenso o dever de o ter feito.

112. Causas de escusa, causas de exclusão da culpabilidade
Há circunstâncias que em concreto afastam a culpa do agente, isto é, fazem com que o agente não seja objecto do juízo de culpabilidade quando seria normalmente se essas circunstâncias não tivessem ocorrido.
A nossa lei faz referência a duas causas de escusa, de uma forma técnica nos arts. 337º/2 e 338º CC.
Faz-se referência a uma causa de exclusão de culpabilidade que é o medo, desde que revista certas características:
• Essencial: tenha sido ele a causa determinante do comportamento do agente ou, dito de outro modo, o agente só tenha actuado por causa do medo;
• Desculpável: isto é, seja um medo, uma situação psicológica de intimidação, em que o bom pai de família também teria incorrido se estivesses naquela situação.

113. Prova da culpa, presunção de culpa
Sendo a culpa do lesante um elemento constitutivo do direito à indemnização, incumbe ao lesado, como credor, fazer a prova dela, nos termos gerais da repartição legal do ónus probatório (art. 342º/1 [39] CC). Regra oposta vigora para o caso da responsabilidade contratual (art. 799º/1 [40] CC), onde o facto constitutivo do direito de indemnização é o não cumprimento da obrigação, funcionando a falta de culpa como uma excepção, em certos termos oponível pelo devedor.
Ao afirmar o princípio segundo o qual, na responsabilidade delitual, é ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão (art. 487º/1 [41] CC).
E há com efeito, vários casos em que a lei presume a culpa do responsável.

114. Dano (d)
Para haver obrigação de indemnizar, é condição essencial que haja dano, que o facto ilícito culposo tenha causado um prejuízo a alguém.
O dano é, o prejuízo que um sujeito jurídico sofre ou na sua pessoa, ou nos seus bens, ou na sua pessoa e nos seus bens.
Classificação de danos:
- Danos pessoais: aqueles que se repercutem nos direitos da pessoa;
- Danos materiais: aqueles que respeitam a coisas;
- Danos patrimoniais: são aqueles, materiais ou pessoais, que consubstanciam a lesão de interesses avaliáveis em dinheiro, dentro destes à que distinguir:
a) Danos emergentes: é a diminuição verificada no património de alguém em consequência de um acto ilícito e culposo de outrem, ou de um acto na ilícito e culposo mas constitutivo de responsabilidade civil para outrem;
b) Lucros cessantes: quando em consequência do acto gerador de responsabilidade civil, deixa de auferir qualquer coisa que normalmente teria obtido se não fosse o acto que constitui o agente em responsabilidade.
- Danos patrimoniais (ou morais): são os danos que se traduzem na lesão de direitos ou interesses insusceptíveis de avaliação pecuniária. O princípio da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais é limitado à responsabilidade civil extra-contratual. E não deve ser ampliado à responsabilidade contratual, por não haver analogia entre os dois tipos de situações.
- Dano é presente ou futuro, consoante já se verificou ou ainda não se verificou no momento da apreciação pelo Tribunal do direito à indemnização; isto é, futuros, são todos os danos que ainda não ocorreram no momento em que o Tribunal aprecia o pedido indemnizatório, mas cuja ocorrência é previsível e provável.
- Dano real: é o prejuízo efectivamente verificado; é o dano avaliado em si mesmo;
- Dano de cálculo: é a transposição pecuniária deste dano, é a avaliação deste dano em dinheiro.
A gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo, e não à luz de factores subjectivos. Por um lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado.
A reparação obedecerá a juízos de equidade tendo em conta as circunstâncias concretas de cada caso (art. 496º/3 CC – 494º CC).
A indemnização, tendo especialmente em conta a situação económica do agente e do lesado, é assim mais uma reparação do que uma compensação, mais uma satisfação do que uma indemnização.

115. Nexo de causalidade entre o facto e dano (e)
Para que o dano seja indemnizável é forçoso que ele seja consequência do facto, ilícito e culposo no domínio da responsabilidade subjectiva extra-obrigacional, facto não culposo no domínio da responsabilidade objectiva, onde o facto gerador do dano pode mesmo ser um facto lícito.
Em qualquer caso, e portanto em qualquer das modalidades da responsabilidade civil, tem sempre que haver uma ligação causal entre o facto e o dano para que o actor do facto seja obrigado a indemnizar o prejuízo causado.

116. Titularidade do direito à indemnização
Tem direito à indemnização o titular do direito violado ou do interesse imediatamente lesado, com a violação da disposição legal, não o terceiro que só reflexa ou indirectamente seja prejudicado.
Sem prejuízo do prazo correspondente à prescrição ordinária – 20 anos – (contado sobre a data do facto ilícito: arts. 498º - 309º CC), o direito à indemnização fundada na responsabilidade civil sujeito a um prazo curto de prescrição (três anos). A prova dos factos que interessam à definição da responsabilidade, em regra feita através de testemunhas, torna-se extremamente difícil e bastante precária a partir de certo período de tempo sobre a data dos acontecimentos.
Há dois prazos de prescrição:
- O prazo ordinário (vinte anos) conta a partir do facto danoso;
- O prazo de três anos, conta a partir do momento em que o lesado tem conhecimento do seu direito, isto é, conhecimento dos factos constitutivos do seu direito.

RESPONSABILIDADE EXTRA-OBRIGACIONAL PELO RISCO OU OBJECTIVA

117. Introdução
A responsabilidade pelo risco ou objectiva, caracteriza-se por não depender de culpa do agente. A obrigação de indemnizar nasce do risco próprio de certas actividades e integra-se nelas, independentemente de dolo ou culpa.
Por força da remissão feita no art. 499º CC, deve aplicar-se à responsabilidade pelo risco o disposto no art. 494º CC. O facto de a responsabilidade objectiva não depender de culpa do agente não impede que a indemnização seja fixada em montante inferior ao dano, quando a situação económica do responsável pelo risco e do lesado e as demais circunstâncias o justifiquem.

118. Carácter objectivo da responsabilidade
A lei civil vigente assinala de modo inequívoco o carácter objectivo da responsabilidade do comitente, afirmando (art. 500º/1 CC) que ele responde, independentemente da culpa e que (n.º 2) a sua responsabilidade não cessa pelo facto de o comissário haver agido contra as instruções recebidas.
Não se trata de uma simples presunção de culpa, que ao comitente incumba elidir para se eximir à obrigação de indemnizar, trata-se de a responsabilidade prescindir da existência de culpa, nada adiantando, por isso, a prova de que o comitente agiu sem culpa ou de que os danos se teriam igualmente registado, ainda que não houvesse actuação culposa da sua parte.

119. Requisitos
Para que exista responsabilidade prevista no art. 500º [42] CC, é preciso que se verifiquem cumulativamente vários requisitos:
Ø Que exista entre dois sujeitos jurídicos uma relação da comissão: é uma relação de comissão, é uma relação em que um dos sujeitos realiza um acto isolado, ou uma actividade duradoura, por conta de outrem e sob as instruções de outrem;
Ø O comissário tenha praticado um acto constitutivo para ele, comissário, de responsabilidade civil: para haver obrigação de indemnizar para o comitente, é indispensável que o acto do comissário constitua, para ele comissário, uma obrigação de indemnizar;
Ø Para que haja obrigação de indemnizar do comitente nos termos do art. 500º [43] CC: é o de que o comissário pratique o facto danoso e constitutivo de responsabilidade civil no exercício das suas funções.

120. Responsabilidade do Estado e demais pessoas colectivas
É aplicável ao Estado e às restantes pessoas colectivas públicas nos termos do art. 501º [44] CC, quanto aos danos causados pelos seus órgãos ou representantes do exercício de actividades de gestão privada, o regime fixado para o comitente.
O Estado e as demais pessoas colectivas públicas:
a) Respondem perante o terceiro lesado, independentemente de culpa, desde que os seus órgãos, agentes ou representantes tenham incorrido em responsabilidade;
b) Gozam seguidamente do direito de regresso contra os autores dos danos, para exigirem o reembolso de tudo quanto tiverem pago, excepto se também houver culpa da sua parte.
São actos de gestão pública os que, visando a satisfação de interesses colectivos, realizam fins específicos do Estado ou outro ente público e que muitas vezes assentam sobre o ius auctoritatis da entidade que os pratica.
Os actos de gestão privada são, de modo geral, aqueles que, embora praticados pelos órgãos, agentes ou representantes do Estado ou de outras pessoas colectivas públicas, estão sujeitos às mesmas regras que vigoraram para a hipótese de serem praticados por simples particulares. São actos em que o Estado ou a pessoa colectiva pública intervém como um simples particular, despedido do seu poder de soberania ou do seu ius auctoritatis.
Os órgãos da pessoa colectiva, são as entidades, abstractamente consideradas, de composição singular ou colegial, às quais incumbe, por força da lei, ou dos estatutos, exprimir o pensamento ou traduzir e executar a vontade dessa pessoa.
Os agentes são as pessoas que, por incumbência ou sob a direcção dos órgãos da pessoa colectiva, executam determinadas operações materiais. Dá-se o nome de representantes os mandatários desses órgãos, ou seja, as pessoas por ele incumbidas de realizar em nome da pessoa colectiva quaisquer actos jurídicos.

121. Responsabilidade por factos lícitos
O acto pode ser lícito e obrigar, todavia, o agente a reparar o prejuízo que a sua prática porventura cause a terceiro.
A licitude do acto não afasta necessariamente o dever de indemnizar o prejuízo que, num interesse de menor valor sofreu o dono da coisa usada, destruída ou danificada. E por isso se impõe nuns casos, e se admite noutros, a fixação da indemnização a cargo do agente ou daqueles tiraram proveito do acto ou contribuíram para o estado de necessidade (art. 339º/2 [45] CC).

CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES

122. Noção
É a realização voluntária da prestação debitória. É a actuação da relação obrigacional, no que respeita ao dever de prestar o princípio geral que governa o cumprimento está regulada no art. 762º [46] CC.
Dentro dos quadros sinópticos da relação jurídica, cumprimento é usualmente tratado como um dos modos de extinção das obrigações.
Antes, porém, de ser uma causa de extinção do vínculo obrigacional, o cumprimento é a actuação do meio juridicamente predisposto para a satisfação do interesse do credor. É o acto culminante da vida da relação creditória, como consumação do sacrifício imposto a um dos sujeitos para a realização do interesse do outro.

123. O princípio da boa fé
Da boa fé (art. 762º [47] CC), no exercício do direito de crédito e no cumprimento da obrigação resultam consequências para o conteúdo daquilo que é a prestação devida pelo obrigado.
Por um lado, da boa fé resultam para o devedor deveres secundários, que podem ser acessórios ou laterais da prestação devida, deveres instrumentais da realização pontual da prestação, ou deveres de lealdade, deveres de conduta que ele tem de observar.
Da vinculação à boa fé do credor no exercício do direito resulta, que o direito de crédito tem de ser exercido em conformidade com a boa fé, isto é, não pode ser exercido abusivamente sob pena de ineficácia ou até de responsabilidade do credor pelos danos causados ao devedor no exercício abusivo do direito.
O princípio da boa fé, embora proclamado apenas ao cumprimento dos direitos de crédito, deve considerar-se extensivo, através do art. 10º/3 [48] CC, a todos os outros domínios onde exista uma relação especial de vinculação entre duas ou mais pessoas.
A lei confere, ao princípio da boa fé, na área do exercício da relação obrigacional, a sua verdadeira dimensão. A necessidade juridicamente reconhecida e tutelada de agir com correcção e lisura não se circunscreve ao obrigado; incide de igual modo sobre o credor, no exercício do seu poder. E tal como sucede com o dever de prestar, também no lado activo da relação, o dever de boa fé se aplica a todos os credores, seja qual for a fonte do seu direito, embora isso não exclua a desigual intensidade do dever de cuidado e diligência que pode recair sobre as parte.
A fonte do dever de agir de boa fé, está assim na relação especial que vincula as pessoas – relação que é comum a todos os direitos de crédito, mas que pode também verificar-se nas obrigações reais, nas relações de família e nas relações entre titulares de direitos reais que tenham por objecto a mesma coisa. O cumprimento é governado por alguns princípios:
d) Princípio da pontualidade
e) Princípio da integridade do cumprimento.

124. Princípio da pontualidade
Regra que a lei enuncia a propósito dos contratos mas que pelo seu espírito tem de considerar-se extensiva a todas as obrigações ainda que de matriz na contratual.
A prestação, a obrigação, tem de ser cumprida nos termos exactos em que foi configurada, tem de ser cumprida ponto por ponto.
Consequência da pontualidade no cumprimento é por um lado a proibição do devedor prestar coisa diversa da devida, ainda que de montante superior à coisa devida, salvo se tiver acordo do credor (art. 837º CC).
Do conceito amplo de pontualidade vários corolários se podem deduzir quanto aos termos do cumprimento:
a) O primeiro é o que o obrigado se não pode desonerar sem consentimento do credor, mediante prestação diversa da que é devida, ainda que a prestação efectuada seja de valor equivalente ou até superior a esta. Sem acordo do credor, não poderá liberar-se, dando aliud pro alio (dação em cumprimento).
b) Beneficium competentiae, não pode exigir a redução da prestação estipulada, com fundamento na precária situação económica em que o cumprimento o deixaria. Nem sequer ao Tribunal é lícito facilitar as condições de cumprimento da prestação.
c) A prestação debitória deve ser realizada integralmente e não por partes, não podendo o credor ser forçada a aceitar o cumprimento parcial (art. 763º CC).

125. Princípio da integridade do cumprimento (art. 763º CC)
O devedor tem de realizar a prestação integralmente, salvo naturalmente nos casos em que as partes tenham convencionado um cumprimento fraccionado, ou nos casos em que a própria lei ou os usos o determinam.
A existência da realização integral dá como resultado que, pretendendo o devedor efectuar uma parte apenas da prestação e recusando-se o credor a recebê-la, não há mora do credor, mas do devedor, quanto a toda a prestação debitória e não apenas quanto à parte que o devedor se não propunha a realizar. Nada obsta, porém, a que o credor, em qualquer caso, receba apenas, se quiser, uma parte da prestação, como nenhuma razão impede que ele renunciando do benefício, exija só uma parte do crédito (art. 763º/2 CC). A aceitação do credor não evita, entretanto, que o devedor fique em mora quanto à parte restante da prestação, salvo se houver prorrogação do prazo relativamente ao cumprimento dessa parte.

126. Requisitos do cumprimento (art. 764º CC) [49]
A) Capacidade do devedor
Não se exige em princípio para a validade do cumprimento, que o devedor tenha capacidade de exercício no momento em que cumpre a obrigação.
Tal capacidade só exigida no caso do cumprimento constituir um acto dispositivo. Um acto de disposição é naturalmente um acto de alienação, mas também um acto de oneração de um direito do devedor.
Se a prestação for efectuada pelo devedor capaz ou pelo representante legal do incapaz, nenhumas dúvidas se levantam, nesse aspecto, sobre a validade do cumprimento.
Sendo efectuada por incapaz, a prestação continua a ser válida, a não ser que constitua um acto de disposição [50].
B) Capacidade do credor
Exige-se, que seja capaz (para receber a prestação) o credor perante quem a obrigação tenha sido cumprida (art. 764º/2 CC).
Se for incapaz e o cumprimento anulado a requerimento do representante legal ou do próprio incapaz, terá o devedor que efectuar nova prestação ao representante do credor.
Pode o devedor opor-se à anulação da prestação, alegando que ela chegou ao poder do representante legal do incapaz ou que enriqueceu o património deste, valendo a prestação como causa de desoneração do devedor na medida em que tenha sido efectivamente recebida pelo representante ou haja enriquecido o credor incapaz (art. 764º/2 CC).
C) Legitimidade do devedor para dispor do objecto da prestação
O cumprimento, para ser plenamente válido, se constituir num acto de disposição, necessita ainda de que o devedor possa dispor da coisa que prestou.
A falta do poder de disposição do devedor pode derivar de uma de três circunstâncias:
1. De ser alheia a coisa prestada;
2. De não ter o devedor capacidade para alienar a coisa;
3. De carecer apenas de legitimidade para o fazer.
O devedor, quer tenha agido de boa fé, ou de má fé, não pode impugnar o cumprimento, salvo se ao mesmo tempo oferecer nova prestação (art. 765º/2 CC).
Quando o cumprimento for declarado nulo, designadamente nos casos do art. 765º CC, ou for anulado, designadamente nos casos do art. 764º CC, por causa imputável ao credor não renascem as garantias prestadas por terceiro, salvo se o terceiro conhecia o vício na data em que soube do cumprimento da obrigação.

127. Quem pode cumprir ou quem tem legitimidade para o cumprimento
A regra geral é a de que tem legitimidade para o cumprimento tanto o devedor como qualquer terceiro, interessado ou não no cumprimento. Esta é a regra geral correspondente aos casos em que a obrigação é fungível.
Se a obrigação for infungível, natural ou convencional, só pode cumprir o devedor.
Portanto, nos casos em que, pela própria natureza da prestação, ou por convenção das partes, é o próprio devedor que tem de realizar o cumprimento, não pode um terceiro substitui-lo no cumprimento.
Em todos os casos, o terceiro “solvens” tem legitimidade para o cumprimento; em todos os casos, o credor não tem fundamento para recusar o cumprimento por terceiro (fundamento na infungibiliade da obrigação) trata-se sempre de hipóteses em que a prestação pode ser realizada pelo terceiro.
O terceiro pode ser interessado no cumprimento, por ser um garante da obrigação: por ser fiador; por ser proprietário de um bem hipotecado ou empenhorado.


128. Terceiro, que não é devedor e cumpre a obrigação
O terceiro que cumpre pode estar a cumprir a obrigação do devedor, cumprindo simultaneamente uma obrigação dele próprio para com o devedor, por ser mandatário do devedor. Pode ter celebrado um contrato de mandato com o devedor, nos termos do qual se obrigou a cumprir a obrigação, dele devedor.
Nestes casos, em que o terceiro é mandatário, ou em que o terceiro é promitente num falso contrato a favor de terceiro, ele cumpre a obrigação ao credor e isso tem duas consequências:
1º. A obrigação extingue-se face ao devedor, o devedor fica exonerado;
2º. Ele extingue a sua própria obrigação, ele libera-se, exonera-se da sua própria obrigação.
E portanto, ele paga, está tudo bem, não há mais consequência nenhuma.

129. Lugar do cumprimento (art. 772º CC) [51]
Nesta matéria, a regra é a de que a prestação deva ser realizada no lugar que as partes tiverem estipulado ou naquele em que a lei determinar que o cumprimento haja de ser feito.
- Se houver convenção das partes, é esse o lugar em que a prestação deve ser feita;
- Se houver disposição legal supletiva e não houver convenção diversa, é esse o lugar em que a prestação deve ser feita;
- Na falta de convenção ou disposição especial da lei, o princípio geral supletivo é o de que o cumprimento deve ser realizado no domicílio do devedor.

NÃO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES

130. Noção
Fala-se de não cumprimento da obrigação, para significar que a prestação debitória não foi realizada – nem pelo devedor, nem por terceiro –, e que, além disso, a obrigação não se extinguiu por nenhuma das outras causas de satisfação além do cumprimento, que o Código Civil prevê e regula nos arts. 837º segs. CC. O não cumprimento é, neste sentido, a situação objectiva de não realização da prestação debitória e da insatisfação do interesse do credor, independentemente da causa de onde a falta procede.
Na grande massa dos casos, o não cumprimento da obrigação assenta na falta da acção (prestação positiva) exigida do devedor. Mas pode também consistir na prática do acto que o obrigado deveria não realizar, nos casos menos vulgares em que a obrigação tem por objecto uma prestação negativa.
O não cumprimento, pode definir-se como a não realização da prestação debitória, sem que entre tanto se tenha verificado qualquer das causas extintivas típicas da relação obrigacional.
Em sentido muito amplo, há não cumprimento da obrigação desde que a prestação não seja realizada pontualmente. O que significa que não há não cumprimento tanto nos casos em que há não realização total da prestação, como naqueles em que a realização da prestação é apenas parcial; e tanto há não cumprimento nos casos em que a falta da prestação, total ou parcial é imputável, como naqueles em que não é imputável ao devedor.
Isto quer dizer que dentro do incumprimento tem-se que abrir várias subdivisões, porque elas têm regimes diferenciados.
Quando o incumprimento é total, isso significa que a vencida a obrigação não houve cumprimento de nada.
Se se tratar de cumprimento parcial, estamos perante uma situação em que o devedor cumpriu uma parte da prestação e omitiu o cumprimento da outra parte. Este pode ser quantitativamente parcial, ou qualitativamente parcial.
Qualquer destas modalidades de não cumprimento podem resultar, podem ser qualificadas ou não, por impossibilidade de cumprimento. Isto é, pode-se estar perante um total não cumprimento e esse não cumprimento total corresponder a uma impossibilidade de cumprir, o devedor não cumpre porque já não é possível cumprir.
Quando estamos perante um incumprimento não qualificado por impossibilidade, podemos estar perante uma de duas situações:
a) Um incumprimento temporário: ainda é possível cumprir e o devedor não cumpriu, caso em que se estará perante uma mora;
b) Pode-se estar perante um incumprimento definitivo: o cumprimento não está impossibilitado mas o credor, em consequência do não cumprimento pontual, perdeu o interesse no cumprimento.

131. Modalidades de não cumprimento quanto à causa [52]
Só nos casos de não cumprimento imputável ao obrigado se pode rigorosamente falar em falta de cumprimento.
Dentro do núcleo genérico de hipóteses de não cumprimento não imputável ao devedor interessa destacar ainda, pelo regime especial a que estão sujeitos, os casos em que a falta de cumprimento procede de causa imputável ao credor.
Por um lado, estão sujeitos a um regime próprio, consagrado nos arts. 813º segs. CC, os casos de mora do credor. Por outro, também no art. 795º/2 CC, se fixa um importante desvio estabelecido no art. 795º/1 CC, para o caso de a prestação se tornar impossível por causa imputável ao credor.

132. Modalidades do não cumprimento quanto ao efeito [53]
Há casos em que a prestação, não tendo sido efectuada, já não é realizável no contexto da obrigação, porque se tornou impossível ou o credor perdeu o direito à sua realização, ou porque, sendo ainda materialmente possível, perdeu o seu interesse para o credor, se tornou praticamente inútil para ele.
O não cumprimento definitivo da obrigação pode, com efeito, provir da impossibilidade da prestação ou da falta irreversível de cumprimento, em alguns casos equiparada por lei à impossibilidade (art. 808º/1 CC).
Ao lado destes casos, há situações de mero retardamento, dilação ou demora da prestação. A prestação não é executada no momento próprio, mas ainda é possível, por continuar a corresponder ao interesse do credor. Pode este ter sofrido prejuízo com o não cumprimento, em tempo oportuno; mas a prestação ainda mantém no essencial, a utilidade que tinha para ele.

133. Incumprimento imputável ao devedor
Genericamente, quando o não cumprimento é imputável ao devedor, este incorre em responsabilidade civil.
O art. 798º [54] CC, é uma disposição paralela à do art. 483º/1 CC, e contém o princípio geral da responsabilidade obrigacional, também designada vulgarmente por responsabilidade contratual.
A responsabilidade obrigacional, tem, tal como a responsabilidade extra-obrigacional ou delitual, vários pressupostos. Tem os mesmos pressupostos:
1. Facto voluntário do devedor;
2. Facto ilícito;
3. Culpa;
4. Tem de haver danos;
5. Tem de haver nexo causal entre o facto e o dano.

134. Principais diferenças de regime entre a responsabilidade extra-obrigacional
a) Quanto à ilicitude
Enquanto a ilicitude no domínio extra-obrigacional se traduz na violação de um direito subjectivo absoluto, ou de natureza familiar que em qualquer caso não é um direito de crédito.
Na responsabilidade obrigacional a ilicitude consubstancia-se justamente na violação do direito de crédito.
A ilicitude obrigacional, pode estar excluída pela verificação de uma circunstância que constitua uma causa de justificação do incumprimento.
As causas de justificação no domínio da responsabilidade obrigacional são:
a) Exercício de um direito;
b) Cumprimento de um dever;
c) Acção directa;
d) Legítima defesa;
e) Estado de necessidade;
f) Consentimento do lesado.
E ainda duas causas de exclusão ou de justificação do incumprimento privativas da responsabilidade obrigacional:
a) Excepção do não cumprimento
Se o contrato for sinalagmático e não houver prazos diversos para o cumprimento, um dos contraentes pode recusar licitamente o cumprimento da sua obrigação enquanto o outro não se dispuser a cumprir a dele.
b) Direito de retenção (art. 754º [55] CC)
É a faculdade que a lei concede ao devedor da entrega de uma coisa, de a reter, com fundamento no não cumprimento da obrigação que o credor da coisa resulte de despesas feitas pelo devedor com a coisa, ou de danos causados por ela.
b) Quanto à culpa
A principal diferença entre o regime da responsabilidade obrigacional e extra-obrigacional, resulta da presunção de culpa que está consagrada no art. 799º/1 [56] CC.
Ao invés do que se passa na responsabilidade extra-obrigacional, em que o ónus de prova da culpa cabe ao lesado em princípio (art. 487º/1 CC), na responsabilidade obrigacional, porque a lei presume a culpa do devedor, é ao devedor que incumbe provar que não teve culpa para afastar a sua responsabilidade.
Portanto, o credor para exercer o direito à indemnização não precisa de provar a culpa do devedor, uma vez que ela está presumida.
Quanto à forma de apreciação da culpa, o art. 799º/2 CC, remete para o art. 487º/2 CC, isto é, a culpa é apreciada na responsabilidade obrigacional, tal como na extra-obrigacional, em abstracto.
c) Quanto aos danos indemnizáveis
Não há diferença essencial, podendo contudo discutir-se se aos danos não patrimoniais são indemnizáveis com fundamento em responsabilidade obrigacional.
d) Quanto ao nexo de casualidade (entre o incumprimento e o dano)
Ele estabelece-se exactamente nos mesmos termos e pelo mesmo critério, que se define na responsabilidade extra-obrigacional. Aqui, inequivocamente a regra aplicável é a regra do art. 563º [57] CC, regra comum a qualquer forma de responsabilidade.
e) Prazo de prescrição
Enquanto que na responsabilidade delitual o prazo prescricional é o que resulta do art. 498º CC, prazo especial de três anos, embora articulado com o prazo da prescrição ordinária de vinte anos.
Na responsabilidade obrigacional a obrigação de indemnização prescreve no prazo ordinário, salvo se houvesse prazo especial de prescrição da obrigação incumprida.
Se a obrigação não cumprida tinha um prazo prescricional especial, é esse que se aplica à obrigação de indemnizar.

GARANTIA GERAL DAS OBRIGAÇÕES

135. Introdução
O cumprimento da obrigação é assegurado pelos bens que integram o património do devedor. O património do devedor constitui assim a garantia geral das obrigações. Garantia geral porque a cobertura tutelar dos bens penhoráveis do devedor abrange a generalidade das obrigações do respectivo titular.
Ao lado da garantia geral pode haver garantias especiais do crédito, quer sob bens de terceiros, quer sobre bens do próprio devedor, que asseguram de modo particular a satisfação do crédito do titular da garantia.
Embora a garantia geral, bem como as garantias especiais, só se destinem a ser executadas no caso do não cumprimento da obrigação, verdade é que a garantia geral acompanha a obrigação desde o nascimento desta, tal como as garantias especiais reforçam, desde a sua constituição, a consistência económico-jurídica do vínculo obrigacional.

136. Objecto da garantia geral (art. 601º CC)
Como regra, todos os bens do devedor, isto é, todos os que os que constituem o seu património, respondem pelo cumprimento da obrigação. é esta uma garantia geral, a qual se torna efectiva por meio da execução (art. 817º CC [58]). Apenas as obrigações naturais são inexequíveis (art. 404º CC).
Nem todos os bens do devedor integram a garantia da obrigação. só garantem o cumprimento da obrigação os bens (do devedor) que possam ser penhorados.
Há, bens que a lei processual, pelas mais variadas razões considera impenhoráveis, sacrificando o interesse do credor em obter a satisfação do crédito ou a reparação do direito violado ao interesse do devedor em manter a coisa na sua posse ou o direito na sua titularidade. A impenhorabilidade pode revestir uma dupla modalidade: os bens discriminados nas diversas alíneas do art. 822º CPC, são bens absoluta ou totalmente impenhoráveis; os bens mencionados nos arts. 823º e 824º CPC, são, por sua vez relativa ou parcialmente impenhoráveis.

137. Limitação da garantia (patrimonial)
No art. 601º CC, prevêem-se duas limitações à regra geral da exequibilidade de todo o património do devedor: a dos bens serem insusceptíveis de penhora e a da autonomia patrimonial resultante da separação de património.
A lei (art. 602º [59] CC) ressalva, desta limitação convencional do objecto da garantia patrimonial as obrigações cujo regime não caiba na disponibilidade das partes, como sucede com a generalidade das obrigações nascidas ex lege.
Dentro do campo das relações obrigacionais disponíveis, a limitação da responsabilidade, a uma parte do património no devedor há-de naturalmente, para ser válida, corresponder a um interesse sério e justificado das partes. Deve, por outro lado, especificar os bens sobre que recai a garantia, de acordo com o próprio texto da lei. E deve a limitação corresponder, por outro lado, a uma real necessidade ou conveniência do devedor, compatível com a coercibilidade do vínculo obrigacional, visto às partes não ser lícito criar obrigações naturais fora dos termos em que a lei prevê a sua existência e implantação.

138. O património do devedor como garantia dos credores
Diz-se com base no art. 601º [60] CC, que o património do devedor é a garantia geral das obrigações, para significar que é o património do devedor que assegura a realização coactiva da prestação ou da indemnização, no caso de a obrigação não ser voluntariamente cumprida. Mas, pode, acrescentar-se que, nos termos do disposto no art. 604º/1 CC, o património é também a garantia comum das obrigações.
Quer isto dizer que os credores, que não gozem de qualquer direito de preferência sobre os demais, são pagos em pé de plena igualdade uns dos outros.
O art. 604º CC, distingue, quanto à garantia do cumprimento, duas grandes categorias de créditos: os dotados de qualquer direito de preferência e os créditos comuns.
Se o devedor não cumprir voluntariamente no momento próprio, e dois ou mais credores recorrem ao direito de agressão do património do obrigado, de duas uma:
a) Ou dos bens do devedor chegam para integral satisfação dos seus débitos e nenhum problema de prioridades se levanta entre os credores;
b) Ou os bens do obrigado não bastam para pagar a todos e, nesse caso, o art. 604º/1 CC, manda dividir o preço dos bens do devedor por todos, proporcionalmente ao valor dos créditos, sem nenhuma distinção baseada, seja na proveniência ou natureza dos créditos, seja na data da sua constituição.